Discos para história: Madman Across the Water, de Elton John (1971)


História do disco

Em 1973, Elton John estava muito bem, obrigado. Com três discos lançados em quase dois anos -- "Honky Château" (1972), "Don't Shoot Me I'm Only the Piano Player" (1973) e "Goodbye Yellow Brick Road" (1973) --, ele estava colhendo dos frutos do sucesso. Mas, em entrevista para a revista 'Rolling Stone', o músico mostrava incômodo quando falavam em queda e ascensão da carreira. Ele não enxergava as coisas por esse ponto de vista.

"Todo mundo tem esse mito sobre a queda. A queda é provavelmente por 'Madman Across the Water'. Não chegou ao top 10 ou top 20 na Inglaterra, mas ainda vendeu 65 mil cópias, o que não é ruim. Eu acho que, porque não tínhamos um single lançado em um ano e meio, as pessoas pensaram que estávamos mortos, mas o álbum ainda foi muito bem em todos os outros lugares do mundo. Então essa foi a 'queda', por assim dizer, falou.

O ritmo de trabalho de Elton John e Bernie Taupin era alucinante, para falar o mínimo. Mas os discos em estúdio não condiziam com as vibrantes apresentações ao vivo, o grande diferencial dele com relação aos concorrentes. Enquanto os novos trabalhos, a trilha sonora do filme "Amigos e Amantes" (1971) e o disco ao vivo "17-11-70" estavam na praça, a dupla entrou em estúdio novamente para gravar o próximo disco da carreira, o primeiro trabalho de inéditas em bastante tempo. E era hora de mudanças drásticas.

Mais discos dos anos 1970:
Discos para história: Roberto Carlos, de Roberto Carlos (1971)
Discos para história: Hunky Dory, de David Bowie (1971)
Discos para história: Paranoid, do Black Sabbath (1970)
Discos para história: A Máquina Voadora, de Ronnie Von (1970)
Discos para história: Close to You, dos Carpenters (1970)
Discos para história: Let It Be, dos Beatles (1970)

Mas Elton John enfrentava todo problema de um músico novato: não tinha quase nenhum controle sobre a contratação de músicos para gravar com ele, algo que o frustrava muito. Ele queria a banda dos shows também no estúdio, mas era voto vencido, principalmente pela desconfiança do produtor Gus Dudgeon sobre eles. No fim, o baixista Dee Murray e do baterista Nigel Olsson, os músicos de confiança, participariam apenas da gravação da faixa-título, uma segunda gravação de "Madman Across the Water", composta em 1970 e que tinha o guitarrista Mick Ronson -- da banda de David Bowie -- como um dos astros da primeira versão.

No fim, a frustração por não contar com eles acabou se transformando em algo positivo. Por sugestão de Dudgeon, o músico desconhecido Davey Johnstone foi contratado, participou da gravação de várias músicas do futuro LP e acabou entrando no time dos músicos de confiança de Elton John até hoje, assim como o então desconhecido Ray Cooper, considerado hoje um dos melhores percussionistas do mundo. Tudo isso era início de 1971 e ele estava determinado a ditar os rumos da própria carreira, ainda que levasse algum tempo.

Aos trancos e barrancos, em cinco sessões de gravações feitas em fevereiro e nos dias 9, 11 e 14 de agosto de 1971, "Madman Across the Water" foi gravado basicamente com material antigo, já que o ritmo de trabalho impediu a finalização de qualquer composição nova.

"Tínhamos escrito cerca de oito músicas naquele ano, trabalhando nelas separadamente, e chegou ao ponto em que não havia nada em que recorrer sem odiarmos uma das faixas. Normalmente escrevemos cerca de 25 músicas por ano, então posso dizer o tipo de estado em que estávamos. Então 'Madman...' encerrou aquele ciclo da nossa composição. Foi o último álbum desse tipo que fizemos", explicou ele à 'Sounds' no início de 1972.

Lançado em 5 de novembro de 1971, "Madman Across the Water" é recheado de músicos de estúdio, mas isso não ajudou no sucesso na terra natal do cantor. O álbum chegou apenas na 41ª posição na parada britânica, caiu para 48ª pouco tempo depois e simplesmente sumiu, o completo oposto nos Estados Unidos. Estreando na oitava posição, mostrava bem como Elton John foi melhor aceito do outro lado do Atlântico -- algo fundamental para a carreira dele ao longo de toda década.

Veja também:
Discos para história: Convite para Ouvir Maysa, de Maysa (1956)
Discos para história: Seu Piano e seu Órgão Espetacular, de Ed Lincoln (1961)
Discos para história: Samba 808, de Wado (2011)
Discos para história: Acústico MTV, de Cássia Eller (2001)
Discos para história: V, da Legião Urbana (1991)
Discos para história: Roupa Nova, do Roupa Nova (1981)

Com tudo isso, é claro que era muito difícil gostar do resultado ainda naquela época, principalmente quando comparado com os três discos seguintes, sucessos absolutos.

"Eu diria que me livrei de três anos de merda. Isso pode soar forte, mas são três anos de canções antigas das quais finalmente chegamos ao fim. Eu queria fazer isso sem muitas coisas [instrumentos e pessoas] quando gravamos 'Madman...', mas foi abortado porque tínhamos que fazer um álbum e foi muito doloroso. Foi feito sob pressão e realmente nos torturou. Acho notável que tenha saído tão bem [na parada americana]", disse.

"Madman Across the Water" pode não ser o melhor ou mais famoso disco de Elton John, mas acabou sendo fundamental por fazer o músico brigar para ter o que queria e fazer a música que tanto desejava. O resultado dessa mudança viria ao longo dos anos 1970, década que o consagrou como um dos artistas mais famosos do mundo.

Gostou do post? Compartilhe nas redes sociais e indique o blog aos amigos!

Estou no Twitter e assine o canal no YouTube. Compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!


Resenha de "Madman Across the Water"

Começar um disco com "Tiny Dancer" não é mesmo para qualquer um. Elton John fez da primeira canção de "Madman Across the Water" um sucesso estrondoso ao longo dos anos graças a interpretação tocante de uma letra em que Bernie Taupin fala da primeira mulher, quando ela era apenas um sonho para ele durante os tempos de solteiro na Los Angeles do início dos anos 1970. A faixa virou um sucesso para uma nova geração de fãs graças ao filme "Quase Famosos" (2000), dirigido por Cameron Crowe.

Mas não só de declarações românticas vive Elton John. Outra canção de bonito arranjo, "Levon" é uma carta sobre as expectativas com relação aos filhos nascidos logo após a Segunda Guerra Mundial e como uma parte considerável deles não cumpriu as expectativas da família com relação a ter uma vida "normal" e um trabalho "normal. Depois surge "Razor Face", um modelo de canção que Elton John seguiria ao longo dos anos, e a sombria faixa-título, sobre uma pessoa internada em um asilo que reclama do dia de visitas -- muitas pessoas pensaram que Taupin havia falado sobre Richard Nixon, então presidente dos Estados Unidos, mas o autor negou.

Para abrir o lado B, a triste "Indian Sunset" fala da migração dos nativos-americanos ao longo dos anos nos Estados Unidos, uma questão muito importante e debatida nos anos 1970. O verso" And now you ask that I should watch/ The red man's race be slowly crushed?/ What kind of words are these to hear/ From Yellow Dog, whom white man fears?" é muito, muito pesado, e ver Elton John falando sobre isso naquela época é muito importante.

O álbum também serviu para explorar novas abordagens musicais, caso do toque medieval em "Holiday Inn", uma faixa que soa autobiográfica em que o refrão fácil ganha o ouvinte, e do estilo country em "Rotten Peaches". São duas canções esquecidas do repertório, mas muito competentes, se lembramos que são sobras de estúdio e apenas aproveitadas para a gravação urgente do disco, que fecha com "All the Nasties", quando Elton John fala sobre disfarçadamente sobre a própria sexualidade, só revelada publicamente quase duas décadas depois, e "Goodbye", um desabafo dos rumos da carreira.

Para a 'Rolling Stone' em 2013, o músico resumiu o sentimento sobre o trabalho, lançado 42 anos antes até então.

"O foi o fim de uma era, o último disco que fiz com músicos de estúdio [contratados]. Não era comercial de forma alguma. Eu sempre acho que perdemos dinheiro na minha carreira [naquela época]. Nós nos arriscamos em todos os álbuns. Estávamos fazendo e escrevendo canções sérias do caralho. 'Levon' e 'Tiny Dancer' foram os singles do álbum e não se saíram muito bem", contou.

"'Tiny Dancer' é uma música complexa, não é fácil de cantar, mas o álbum era brilhante. Foi o fim da era de três músicos na banda, porque tínhamos chegado o mais longe que podíamos ir e decidi colocar um guitarrista, [quando] Davey Johnstone trouxe uma nova essência", completou.

E assim, com um disco feito com sobras de estúdio e na maior correria, Elton John conseguiu experimentar e até mesmo ousar ao ir de temas simples até o country e passar por arranjos grandiosos. Assim, ele testou estilos e provou em estúdio que conseguiria gravar qualquer coisa. Isso seria refletido ao longo do sucesso ao longo toda carreira.

Ficha técnica

Tracklist:

Lado A

1 - "Tiny Dancer" (6:17)
2 - "Levon" (5:22)
3 - "Razor Face" (4:42)
4 - "Madman Across the Water" (5:57)

Lado B

5 - "Indian Sunset" (6:47)
6 - "Holiday Inn" (4:17)
7 - "Rotten Peaches" (4:58)
8 - "All the Nasties" (5:09)
9 - "Goodbye" (1:49)

Todas as letras e músicas foram compostas por Elton John e Bernie Taupin

Gravadora: Uni / DJM
Produção: Gus Dudgeon
Duração: 45min17

Elton John: piano e vocal
Brian Dee: harmônio na faixa 2
Rick Wakeman: órgão Hammond nas faixas 3, 4 e 7
Jack Emblow: acordeão na faixa 3
Diana Lewis: sintetizador ARP nas faixas 4 e 7
Caleb Quaye: guitarra nas faixas 1, 2 e 3 e violão na faixa 6
B. J. Cole: guitarra steel na faixa 1
Davey Johnstone: violão nas faixas 1, 4 e 7, mandolim na faixa 6 e cítara na faixa 6
Chris Spedding: guitarra na faixa 4 e guitarra slide na faixa 7
David Glover: baixo nas faixas 1, 3 e 6
Brian Odgers: baixo na faixa 2
Herbie Flowers: baixo nas faixas 4, 5 e 7
Chris Laurence: baixo duplo na faixa 5
Dee Murray: vocal de apoio nas faixas 1, 6 e 7 e baixo na faixa 8
Roger Pope: bateria nas faixas 1, 3 e 6
Barry Morgan: bateria na faixa 2
Terry Cox: bateria nas faixas 4, 5 e 7
Nigel Olsson: vocal de apoio nas faixas 1, 6 e 7 e bateria na faixa (8)
Ray Cooper: percussão na faixa 4 e tambourine nas faixas 7 e 8
Paul Buckmaster: arranjo e condutor da orquestra nas faixas 1, 2, 4, 5, 6, 8 e 9
David Katz: responsável pela orquestra nas faixas 1, 2, 4, 5, 6, 8 e 9
Tony Burrows, Roger Cook, Lesley Duncan, Barry St. John, Terry Steele, Liza Strike e Sue and Sunny: vocal de apoio nas faixas 1, 6 e 7
Cantores in Ecclesia Choir: vocal de apoio nas faixas 5 e 8
Robert Kirby: diretor do coro nas faixas 5 e 8

Robin Geoffrey Cable: engenheiro de som
Tony Cousins: masterização
Gus Skinas: edição
Ricky Graham: conversão
Greg Penny: som
Crispin Murray: assistente

Continue no blog:

Comentários