Discos para história: Violent Femmes, do Violent Femmes (1983)

História do disco

"Quando alguém é adolescente, não pensa: 'Ah, sou um adolescente, e isso é uma fase pela qual estou passando'. Eles pensam: 'Cresci e este é quem sou, e é assim que as coisas são'. O que acho que é parte de como o álbum se conectou fortemente com muitas pessoas na adolescência. Há algo autêntico nisso", disse o vocalista Gordon Gano, para o 'Los Angeles Daily News', em entrevista sobre os 40 anos do álbum de estreia do Violent Femmes.

Se Gano tem ideia disso agora, não fazia a menor ideia quando começou a escrever as letras para o álbum ainda na adolescência. Filho de um padre da Igreja Batista Americana e integrante ativo dos sermões, o futuro vocalista foi incentivado a participar de várias atividades até se interessar pelo teatro. Em casa, adorava ouvir a coleção de discos country do pai, mas teve o destino mudado quando foi a um show dos Heartbreakers, liderados Johnny Thunders, com o irmão, em Nova York. Na cidade, teve contato com Ramones e Velvet Underground pela primeira vez e começou a escrever a base das letras do futuro álbum.

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Enquanto isso, o baixista Brian Ritchie e o percussionista Victor DeLorenzo estavam formando uma banda de rock chamada Violent Femmes, que nasceu a partir de uma piada de um nome falso para fugir dos questionamentos sobre estar ou não em um grupo. Ambos tocavam juntos há algum tempo e tinham alguma experiência, mas nada muito além do próprio bairro. Foi nessa época que DeLorenzo desenvolveu o estilo peculiar de bateria minimalista, admirado por todos até hoje.

Quando a dupla de amigos ouviu Gano tocar uma das letras compostas por ele, viram algo mágico. E o futuro vocalista também enxergou neles algo diferente. Era o impulso necessário para o nascimento de um trio que seria lembrado por todos pelos próximos anos. Eles começaram do nível mais baixo possível: tocando em calçadas para quem passava e queria contribuir com qualquer quantia. Para muitos, isso exige uma tremenda coragem. Para eles, era a chance de refinar ao máximo a sonoridade, sem dizer a ninguém que nenhum bar queria contratá-los. 

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Um dia, como uma dessas coisas do destino, o trio estava tocando na calçada do Oriental Theatre, em Milwaukee, quando Chrissie Hynde, do Pretenders, viu, gostou e os convidou na hora para ser a atração de abertura. Esses amigos estavam recebendo uma oportunidade raríssima na indústria da música, vinda de alguém que trabalhou muito pelo reconhecimento como líder e guitarrista de uma banda de rock. Eles agarraram a chance. Era a oportunidade da vida deles.

Em um ano, tudo mudou. De iniciantes, eles fecharam contrato com a gravadora Slash e, com um empréstimo do pai de DeLorenzo, gravaram o primeiro álbum da carreira. Eles colocaram toda força que tinham, selecionaram as melhores letras e deram tudo de si... Para o disco de estreia ser um total e completo fracasso nas paradas dos Estados Unidos.

Lançado em 13 de abril de 1983, "Violent Femmes" quase não atingiu a lista dos 200 discos mais vendidos na semana de estreia e nenhuma faixa atingiu o top 100. Mas se o mainstream não os enxergou, as rádios universitárias fizeram o serviço ao colocá-los no mesmo patamar de R.E.M., The Smiths, Talking Heads e outras bandas que ganhariam importância no mesmo período. E os críticos adoraram o trabalho, tanto na época quando em revisões posteriores de relançamentos comemorativos. 

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"Assim que começamos o set com 'Blister in the Sun', foi como se um enxame de insetos estivesse vindo na nossa direção. Todos começaram a correr dos outros palcos. Quando você consegue esse tipo de reação, acho que seria como se os Rolling Stones começassem a tocar 'Satisfaction', realmente nunca envelhece", disse o baixista Brian Ritchie para o 'Village Voice', em 2013.

Muitas vezes, principalmente na música, a história nem sempre é contada pelos vencedores do momento. Mais de quatro décadas após o lançamento, a estreia do Violent Femmes ainda segue fresca e atraindo uma nova leva de fãs todos os anos, mostrando que a eternidade é sempre o melhor julgador ao se tratar de uma obra musical.

Crítica de "Violent Femmes"

O álbum de estreia da banda abre com o principal hit da carreira até hoje. "Blister in the Sun" começa falando sobre rejeição e vício em drogas, um clássico das letras do Violent Femmes pelos anos seguintes ("Let me go on/ Like I blister in the sun/ Let me go on/ Big hands, I know you're the one"). O andamento e letra simples são a base desse grande sucesso e do resto do álbum. Depois da rejeição, a frustração consigo mesmo e com o mundo também rendem boas letras, caso de "Kiss Off".

A decepção amorosa faz de "Please Do Not Go" um desses hinos que merece ser cantado no volume mais alto possível, já em "Add It Up" é possível ouvir com clareza a referência do punk em uma faixa mais acelerada com traços de twist — aliás, uma característica do trio é quase sempre apresentar faixas dançantes na discografia — para falar da frustração em não conseguir perder a virgindade em uma letra brutalmente honesta. O lado A do disco termina com "Confessions", um longo desabafo sobre solidão.

A animada "Prove My Love", com o refrão grudento ("Oh, me diga agora [o que eu tenho que fazer?]/ Oh, me diga agora [o que eu tenho que fazer?]/ Oh, me diga agora [o que eu tenho que fazer?]/ "Oh, eu provo meu amor por você", abre a segunda parte do disco, que tem "Promise" outro momento para lamentar que o afeto pela garota jamais será retribuído.

A cabeça quente pode gerar palavras fortes após um término, caso da letra "To the Kill", com uma parte instrumental muito boa. Para encerrar, o tratado sobre uma menina adolescente, "Gone Daddy Gone", é outro hit que reverbera até hoje e encerra com "Good Feeling", uma faixa tão Velvet Underground que o próprio Velvet seria incapaz de fazer algo assim.

De Lou Reed ao punk passando pelo rock do início dos anos 1960, as referências são muitas no álbum de estreia do Violent Femmes. Talvez seja por isso que o álbum nunca tenha ficado datado ou esquecido ao longo de várias gerações de novos e agora velhos fãs, e ainda seja um disco tão fundamental na vida das pessoas.

Ficha técnica

Tracklist:

Lado A
1 - "Blister in the Sun" (2:25)
2 - "Kiss Off" (2:56)
3 - "Please Do Not Go" (4:15)
4 - "Add It Up" (4:44)
5 - "Confessions" (5:32)

Lado B

6 - "Prove My Love" (2:39)
7 - "Promise" (2:49)
8 - "To the Kill" (4:01)
9 - "Gone Daddy Gone" (Gano/ Willie Dixon) (3:06)
10 - "Good Feeling" (3:52)

Todas as músicas foram escritas por Gordon Gano, exceto a marcada

 Gravadora: Slash
Produção: Mark Van Hecke
Duração: 36min15

Victor DeLorenzo: caixa, tranceaphone, bateria, bumbo e vocal de apoio
Gordon Gano: violão, guitarra e vocal
Brian Ritchie: baixo, baixo acústico, Xilofone e vocal de apoio 

Mark Van Hecke: piano em "Good Feeling"

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