Discos para história: Random Access Memories, do Daft Punk (2013)

História do disco

O Daft Punk entrou nos anos 2010 como uma das duplas mais importantes da história da música eletrônica. Usando os capacetes e únicos a manter o mistério da própria identidade, Thomas Bangalter e Guy-Manuel de Homem-Christo fizeram das pistas pelo mundo lugares melhores com suas canções grudentas e cheias de ritmo. E a década anterior terminou com um convite para fazer a trilha sonora do filme "Tron: O Legado", de 2010.

Eles vinham da longa turnê do álbum "Human After All", lançado em 2005, chamada "Alive", nome do futuro disco ao vivo lançado em 2007. O que era para ser uns oito ou nove shows acabou se transformando em dois anos na estrada. Eles estavam há mais de uma década sem tocar ao vivo, então o público sempre pedia por mais. E eles atenderam o quanto puderam.

Estou no Twitter e no Instagram. Ouça o podcast, compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!

A tortura para chegar ao resultado da trilha sonora de "Tron 2" esgotou o Daft Punk ao ponto de eles, ao iniciar o projeto de um novo álbum de estúdio, ficaram completamente insatisfeitos com todos os resultados. Os samplers, o modo de trabalho igual aos discos anteriores... Nada os satisfazia. Durante a turnê, eles usaram um mixer analógico Midas Heritage para ter a melhor qualidade possível no som. De acordo com o engenheiro de som Peter Franco, o uso da mesa fez a dupla pensar em fazer o trabalho mais ousado da carreira: um disco de música eletrônica sem samplers e usando músicos em estúdio.

"Naquela época, não havia nada perto de um mixer analógico [no mundo digital] no que diz respeito a um bom som. Era muito diferente. Fizemos uma turnê com um console clássico, [...] o começo do conceito analógico que se estendeu a 'Random Access Memories'", disse ele ao site 'Music Tech'.

Mais discos dos anos 2010:
Discos para história: Avante, de Siba (2012)
Discos para história: Lonerism, do Tame Impala (2012)
Discos para história: Let England Shake, de PJ Harvey (2011)
Discos para história: Metá Metá, do Metá Metá (2011)
Discos para história: 21, de Adele (2011)
Discos para história: Samba 808, de Wado (2011)

Quando os primeiros testes em estúdio foram feitos usando sintetizadores analógicos, a dupla entendeu como seria gravar um álbum em fita, a metodologia a ser usada e como seria fundamental ter a experiência de engenheiros e músicos de estúdio altamente qualificados para o trabalho em conjunto, algo que o Daft Punk nunca tinha feito nessa proporção. E para deixar tudo ainda mais empolgante para todos, as gravações foram feitas em segredo em três cidades diferentes: Califórnia, Nova York e Paris.

"Fazer tudo de maneira analógica criou uma perspectiva completamente diferente de como você faz um álbum. Eles estavam acostumados a configurações de menor escala, então ir para um grande estúdio com esses grandes consoles antigos foi uma abordagem totalmente diferente para eles", contou Franco.

Claro que, quanto mais gente envolvida no processo de gravação de um disco analógico, mais trabalho para os envolvidos. A começar pelo fato de todo mundo, não importa quem seja, precisa chegar bem ensaiado e com o repertório na ponta da língua (ou dos dedos em alguns casos) para não haver erros. Cada erro é um desperdício de fita. E cada fita gasta, é mais dinheiro investido. Cada instrumento precisa ser mixado separadamente, então é necessário empenho dobrado dos produtores e engenheiros de som para achar o melhor momento de cada músico em cada sessão. Ainda que o Pro Tools tenha sido usado para ter uma versão digital de cada faixa, 90% do projeto foi feito como qualquer músico dos anos 1970 teria feito.

Veja também:
Discos para história: Room on Fire, dos Strokes (2003)
Discos para história: Everybody Else Is Doing It, So Why Can't We?, do Cranberries (1993)
Discos para história: Power, Corruption & Lies, do New Order (1983)
Discos para história: Greetings from Asbury Park, N.J., de Bruce Springsteen (1973)
Discos para história: Os Sambas que Gostamos de Cantar, do Trio Irakitan (1957)
Discos para história: Os Anjos Cantam, de Nilo Amaro e Seus Cantores de Ébano (1962)

O trabalho foi dividido da seguinte forma: os vocais foram gravados na França, terra natal da dupla, enquanto o resto foi feito nos Estados Unidos em quatro estúdios diferentes. Muitas vezes, o material ia e vinha entre os estúdios - e chegou a ser levado para Paris - para buscar a melhor solução possível para cada faixa. Claro, não ficou nada barato, mas o Daft Punk estava colocando dinheiro do próprio bolso na gravação. Eles não queriam a intromissão da gravadora, principalmente se o projeto não desse certo. O custo estimado ultrapassou a casa de US$ 1 milhão ao longo de quatro anos. Mas valeu a pena.

Lançado em 17 de maio de 2013, "Random Access Memories" foi a consagração definitiva da carreira do Daft Punk ao estrear na primeira posição das paradas do Reino Unido e dos Estados Unidos. E os críticos não pouparam elogios ao disco, chamando de "o melhor álbum" de toda carreira. Pouco tempo depois, já estava em várias listas de melhores discos de todos os tempos de uma das duplas mais importantes da história da música eletrônica.


Resenha de "Random Access Memories"

Como escrevi na newsletter (clique aqui se você ainda não é assinante), "Random Access Memories" é o primeiro álbum do "Discos para história" a ter resenha no blog. Não é um texto incrível como de alguns colegas e foi feito logo que o trabalho foi disponibilizado em algum lugar (sinceramente, não lembro onde eu ouvi).

Algumas impressões mudaram muito quase uma década após o lançamento. Por exemplo, ainda mantenho minhas restrições a discos muito longos sem propósito, mas isso não se aplica aqui. Definitivamente não. "Random Access Memories" tem o tamanho exato para a proposta do Daft Punk em resgatar a música dos anos 1970 e 1980 em estilo e no jeito de gravar.

Também escrevi que as colaborações são o ponto alto. Não poderia ter me enganado mais. As colaborações são a alma do disco. A guitarra cheia de suingue de Nile Rodgers, o vocal preciso e bem gravado de Pharrell Williams, a homenagem a Giorgio Moroder - o "inventor" da disco music como conhecemos - e os trabalhos dos vocalistas Julian Casablancas, dos Strokes, e Paul Williams, de quem eles são fãs e puderam ter a chance de tê-lo em uma gravação.

Enfim, enquanto o álbum não envelhceu nada na estética e continua sendo o melhor trabalho da carreira do Daft Punk por ter furado a bolha ao mostrar as possibildades da música eletrônica ao mundo, eu amadureci um pouco e entendo muito melhor algumas escolhas. O Fagner de uma década atrás adorou o "Random Access Memories". O do presente crava: é um dos melhores do século 21 com sobras.

Clique aqui para ler a resenha publicada em 2013.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Give Life Back to Music" (Thomas Bangalter/Guy-Manuel de Homem-Christo/Paul Jackson, Jr./Nile Rodgers) (4:34)
2 - "The Game of Love" (Bangalter/Homem-Christo) (5:22)
3 - "Giorgio by Moroder" (Bangalter/Homem-Christo/Giovanni "Giorgio" Moroder) (9:04)
4 - "Within" (Bangalter/Jason "Chilly Gonzales" Beck/ Homem-Christo) (3:48)
5 - "Instant Crush" (feat. Julian Casablancas) (Bangalter/Julian Casablancas/Homem-Christo) (5:37)
6 - "Lose Yourself to Dance" (featuring Pharrell Williams) (Bangalter/Homem-Christo/Rodgers/Pharrell Williams) (5:53)
7 - "Touch" (featuring Paul Williams) (Bangalter/Christopher Paul Caswell/Homem-Christo/Paul Williams Jr.) (8:19)
8 - "Get Lucky" (feat. Pharrell Williams) (Bangalter/ Homem-Christo/Rodgers/Williams) (6:09)
9 - "Beyond" (Bangalter/Caswell/Homem-Christo/Williams Jr.) (4:50)
10 - "Motherboard" (Bangalter/Homem-Christo) (5:41)
11 - "Fragments of Time" (feat. Todd Edwards) (Bangalter/Homem-Christo/Todd Imperatrice) (4:39)
12 - "Doin' It Right" (feat. Panda Bear) (Bangalter/Homem-Christo/Noah Lennox) (4:11)
13 - "Contact" (Bangalter/Homem-Christo/Stéphane Quême/Garth Porter/Tony Mitchell/Daryl Braithwaite) (6:21)

Gravadora: Columbia
Produção: Thomas Bangalter e Guy-Manuel de Homem-Christo
Duração: 74min28s

Daft Punk: vocal nas faixas 1, 2, 4, 6–9 e 12); sintetizadores modulares nas faixas 1, 3, 7, 10, 12 e 13; sintetizadores nas faixas 2, 5, 8, 9, 14; teclados nas faixas 3, 4, 5 e 11; guitarra na faixa 5
Panda Bear: vocal na faixa 12
Julian Casablancas: vocal e guitarra na faixa 5
Todd Edwards: vocal na faixa 11
DJ Falcon: sintetizador modular na faixa 13
Chilly Gonzales: teclado na faixa 1 e piano na faixa 4 Giorgio Moroder: voz na faixa 3
Nile Rodgers: guitarra nas faixas 1, 6 e 8
Paul Williams: vocal na faixa 7
Pharrell Williams: vocal nas faixas 6 e 8

Greg Leisz: pedal steel nas faixas 1–3, 9, 10 e 14; guitarra havaiana nas faixas 7 e 9
Chris Caswell: teclado nas faixas 1–4, 7–11 e 14; arranjo da orquestra; arranjos
Paul Jackson, Jr.: guitarra nas faixas 1–3, 7–11 e 14
Nathan East: baixao nas faixas 1–6, 8, 11 e 14
James Genus: baixo nas faixas 3, 7, 9–11 e 13
John "J.R." Robinson: bateria nas faixas 1,2, 4–6 e 14
Omar Hakim: bateria nas faixas 3, 7–9, 11 e 13; percussão na faixa 10
Quinn: percussão nas faixas 1, 3–5, 7, 10 e 11; bateria na faixa 7
Thomas Bloch: ondas musicais nas faixa 7; órgão de cristal na faixa 10
Assa Dori, Johana Krejci, Rita Weber, Kevin Connolly, Joel Pargman, Song Lee, Irina Voloshina, Margaret Wooten, Mary K. Sloan, Nina Evtuhov, Miwako Watanabe, Samuel Fischer, Lisa Dondinger, Rafael Rishik, Cynthia Moussas, Sara Perkins, Neel Hammond, Olivia Tsui, Calabria McChesney, Carrie Kennedy, Lisa Sutton e Audrey Solomon: violino nas faixas 3, 7, 9 e 10
Andrew Picken, Alma Fernandez, Rodney Wirtz, Carolyn Riley, Harry Shirinan, Jody Rubin, Roland Kato e Ray Tischer: viola nas faixas 3, 7, 9 e 10
Christina Soulw, Paula Hochalter, Vanessa F. Smith, Timothy Loo, Armen Ksajikian: violoncelo nas faixas 3, 7, 9 e 10
Charles Berghofer, Don Ferrone e Drew Dembowski: baixo duplo 3, 7, 9 e 10
Greg Huckins, Steve Kajala e Sara Andon: flauta nas faixas 3, 7, 9 e 10
Earl Dumler: oboé nas faixas 3, 7, 9 e 10
Marty Krystall: clarinete nas faixas 3, 7, 9 e 10
Gene Cipriano: clarinete e clarinete baixo nas faixas 3, 7, 9 e 10
Judith Farmer: fagote nas faixas 3, 7, 9 e 10
Davis Kosoff: trompa nas faixas 3, 7, 9 e 10
Nathan Campbell, James Atkinson, Justin Hageman, Stephanie O’Keefe e Danielle Ondarza: trompa nas faixas 3, 7, 9 e 10
Gary Grant, Warren Luening, Charles Findley e Larry McGuire: trompete nas faixas 3, 7, 9 e 10
Andrew Martin, Charles Morillas, Charles Looper e Bob McChesny: trombone nas faixas 3, 7, 9, 10
Craig Gosnell: trombone baixo nas faixas 3, 7, 9 e 10
Brian Kilmore e Mark Converse: percussão nas faixas 3, 7, 9 e 10
Shirley Koesnadi, Alissa M. Cremshaw, Elaina S. Crenshaw, Alexandra Gunn, Jeffery Gunn, Emma S. Gunn, Victor Pineshi, Mariah A. Britt, Joshua Britt, Alycia Grant, Chelsea T. DiBlasi e Jessica Rotter: coral na faixa 7

Bob Ludwig e Chab (Antoine Chabert): masterização
Mick Guzauski: gravação e engenheiro de mixagem
Peter Franco e Florian Lagatta: engenheiro de som
Daniel Lerner: engenheiro de som digital

Comentários