Discos para história: Let England Shake, de PJ Harvey (2011)


História do disco

"Esse álbum foi algo que eu tive que fazer muita pesquisa através de leitura, internet e referências históricas. E também tentando encontrar o máximo possível de relatos atuais e em entrevistas. Eu estava apenas ouvindo as pessoas, lendo o que estava acontecendo nas notícias, olhando tanto quanto podia", explicou PJ Harvey à 'Exclaim' ao falar do processo criativo de "Let England Shake".

A história do oitavo álbum de estúdio começa alguns anos antes, quando a cantora se fechou no próprio mundo e decidiu criar as próprias histórias ao misturar o real com coisas inventadas. E era impossível saber o que era o que. Ela não falava com a imprensa e evitava responder diretamente sobre qualquer letra ou assunto. Era uma esfinge.

Mais discos dos anos 2010:
Discos para história: Metá Metá, do Metá Metá (2011)
Discos para história: 21, de Adele (2011)
Discos para história: Samba 808, de Wado (2011)
Discos para história: Wasting light, do Foo Fighters (2011)
Discos para história: This Is Happening, do LCD Soundsystem (2010)
Discos para história: High Violet, do The National (2010)

"Tudo aconteceu muito rápido quando eu era muito jovem. Tive que aprender muito rápido a lidar com as entrevistas, coisas como me tornar uma pessoa pública, estar mais no palco, ser reconhecida. É muito difícil lidar com isso jovem, especialmente vindo de uma criação muito protegida", disse ela à 'Uncut', em 2012, quando o trabalho já era consagrado como um dos melhores de 2011 ao vencer prêmios e fazer partes de prestigiosas listas.

Polly Jean Harvey queria, há tempos, fazer um álbum político. Mas duas coisas a impediam: 1) não fazer justiça ao que as pessoas passaram; 2) falta de confiança no próprio material. Por isso, os anos anteriores foram intensos em não só ficar ligada no noticiário sobre a Primavera Árabe, entender a primeira década dos atentados em 11 de setembro de 2001 e as consequências do conflito no Iraque e no Afeganistão, e entender melhor história dos países, geopolítica e identidade cultural.

Estou no Twitter e no Instagram. Ouça o podcast, compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!

"Sabia que teria que fazer muito bem ou não faria tudo. É uma corda bamba perigosa de se andar. Eu realmente não queria escrever músicas ruins sobre assuntos tão importantes. E muitas vezes seu coração pode estar no lugar certo, mas isso não significa que você fará um bom trabalho. Então, estava muito cautelosa com isso", falou.

Mais PJ Harvey:
Discos para história: Stories from the City, Stories from the Sea, de PJ Harvey (2000)
Resenha: PJ Harvey – The Hope Six Demolition Project

Para isso, ela não só buscou referências no cotidiano, como também no passado. Ouviu histórias de veteranos da Segunda Guerra Mundial, leu livros de autores famosos, materiais especiais, ouviu músicas sobre a Guerra do Vietnã e assistiu a filmes e documentários sobre guerras. Tudo para entender como as pessoas lidam com histórias de angústias, vitórias, derrotas e tudo que um conflito implica antes, durante e depois na sociedade.

"Foi um processo longo e demorado, dois ou três anos de preparação. Tenho um grande apetite por aprender, então, sempre que sinto que estou aprendendo, é muito agradável para mim. À medida que envelheço, a história me interessa ainda mais, porque percebo o quão relevante é o que está acontecendo agora. Torna-se mais importante para obter essas informações porque posso entender que as coisas são como são", contou.

Veja também:
Discos para história: Love and Theft, de Bob Dylan (2001)
Discos para história: Blue Lines, do Massive Attack (1991)
Discos para história: Juju, de Siouxsie and the Banshees (1981)
Discos para história: Songs of Love and Hate, de Leonard Cohen (1971)
Discos para história: Chá Dançante, de Donato e Seu Conjunto (1956)
Discos para história: O Sucesso É Samba, de Walter Wanderley (1961)

O processo foi acompanhado pelo amadurecimento dela como escritora de maneira geral. Ela está pronta para colocar no papel as frustrações com o mundo a partir da própria visão, algo difícil de colocar em palavras quando não se tem experiência e prática suficientes para fazê-lo da melhor maneira possível. E, para Harvey, o fato de sempre seguir adiante ajudou muito na composição do novo álbum. Não era necessário a continuação de uma fórmula de sucesso. Era necessário apenas juntar as ideias desse longo processo criativo de pesquisa e de saber o que escrever.

Lançado em 14 de fevereiro de 2011, "Let England Shake" é considerado um dos melhores trabalhos da carreira da cantora por colocar todo esse potencial musical para fora em letras que falam sobre as angústias de coisas que parecem não ter fim. E saber que PJ Harvey não querre, e não precisar, fazer outro disco parecido é o que o torna ainda mais especial.


Resenha de "Let England Shake"

O faz de "Let England Shake" um clássico da última década é como PJ Harvey conseguiu acertar o tom das faixas usando instrumentos auto-harpa e saxofone por parte dela, e mellotron, xilofone e piano com os outros músicos de estúdio. A faixa-título abre o disco e dá o tom para as outras 11 canções.

A partir disso, ela começa a fazer reflexões sobre a Inglaterra e as guerras ("The Last Living Rose") e como isso afetou o desenvolvimento econômico do país e o psicológico de várias gerações de pessoas ao longo dos anos ("The Glorious Land"). Harvey não passa pano e é bem crítica com relação às decisões trágicas de governantes nos últimos anos.

A cantora mostra como o trabalho de pesquisa foi importante na composição das músicas em "The Words That Maketh Murder", quando consegue falar de várias guerras e momentos da história sem citá-los diretamente — ainda fala por cima de "Summertime Blues", de Eddie Cochran, um dos covers mais famosos do The Who.

Como uma boa artista obcecada por um assunto, ela ficou fascinada com a Guerra Civil Espanhola e as tentativas de tomada de Constantinopla. Uma delas, realizada em 1915 e conhecida como Campanha de Galípoli, virou a sequência formada por "All and Everyone" e "On Battleship Hill", momento em que Harvey conta com viradas que transformam as canções e as deixam melancólicas e reflexivas.

Mas Harvey ama a Inglaterra e demonstra isso em "England", quando conta com o sample de "Said El Kurdi" para mostrar todo esse amor, apesar de voltar a criticar o país ("In the Dark Places") e relembrar os mortos nas guerras ("Bitter Branches") e como a Inglaterra lidou com o encontro de seus mortos ("Hanging in the Wire").

O disco encerra falando sobre os horrores dos confrontos em "Written on the Forehead" e "The Colour of the Earth", duas canções muito emocionantes e pinceladas com interpretações bonitas de PJ Harvey e da banda em estúdio.

PJ Harvey já era uma artista consagrada antes do lançamento de "Let England Shake", mas provou que poderia ir além nas composições do disco. Em pouco mais de 40 minutos, ela consegue mostrar ao mundo como as guerras afetam as pessoas até hoje em uma obra-prima.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Let England Shake" (3:09)
2 - "The Last Living Rose" (2:21)
3 - "The Glorious Land" (3:34)
4 - "The Words That Maketh Murder" (3:45)
5 - "All and Everyone" (5:39)
6 - "On Battleship Hill" (4:07)
7 - "England" (3:11)
8 - "In the Dark Places" (2:59)
9 - "Bitter Branches" (2:29)
10 - "Hanging in the Wire" (2:42)
11 - "Written on the Forehead" (3:39)
12 - "The Colour of the Earth" (2:33)

Todas as músicas foram escritas por PJ Harvey

Gravadora: Island / Vagrant
Produção: Flood, Mick Harvey, John Parish e PJ Harvey
Duração: 40min15

PJ Harvey: vocal, guitarra nas faixas 2, 3, 5, 7, 8, 11 e 12; auto-harpa nas faixas 1, 4, 5 e 12; saxofone nas faixas 1, 2, 4, 5 e 8; cítara na faixa 6; violino na faixa 7

John Parish: guitarra nas faixas 2, 3, 4, 6, 9, 10 e 12; bateria nas faixas 1, 2, 5, 7, 8 9 e 12; percussão 3, 4, 6 e 11; trombone nas faixas 1, 2, 4, 5 e 8; piano Rhodes nas faixas 1, 8 e 11; mellotron nas faixas 1, 7 e 12;  xilofone nas faixas 1; vocal de apoio nas faixas 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 11 e 12

Mick Harvey: vocal nas faixas 12; guitarra nas faixas 8, 9 e 11; baixo nas faixa 4; bateria nas faixas 2, 4 e 11; percussão nas faixas 4, 6 e 11; gaita nas faixas 1, 4, 5, 8 e 9; piano nas faixas 1, 6 e 10; órgão nas faixas 2, 5, 7 e 8; piano Rhodes nas faixas 3 e 6; xilofone na faixa 9; vocal de apoio nas faixas 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10 11 e 12

Jean-Marc Butty: bateria nas faixas 3, 6, 8, 10 e 12; vocal de apoio nas faixas 3, 5, 6 e 8

Continue no blog:

Comentários