Discos para história: Goo, do Sonic Youth (1990)

História do disco

Se o sucesso nos termos conhecidos pelo mundo hoje era algo distante há uma década, imagine em 1990? O início da década não passou de uma grande ressaca dos anos 1980, cheios de sintetizadores, roupas escandalosas, a ascensão da nova geração do metal (farofa ou não) e alguns dos sucessos mais duradouros da música pop em todos os tempos. Mas também havia o alternativo, lado que o Sonic Youth estava com louvor há quase uma década.

Formado por Thruston Moore, Kim Gordon, Lee Ranaldo e Steve Shelley, a banda nunca abriu mão do lado experimental em toda trajetória de existência. Nem mesmo no início, quando mudar para se adequar e conseguir novos objetivos não parece ser algo absurdo. Era um grupo fadado a ter os mesmos fãs e tocar para as mesmas pessoas pelo resto da vida, mas a coisa começou a mudar de figura em 1988 com o lançamento de "Daydream Nation" que, mesmo mal distribuído pela gravadora Enigma, foi eleito um dos melhores álbuns daquele ano.

A insatisfação com uma gravadora não era novidade. Os problemas começaram quando eles ainda estavam na SST, selo que abrigou os primeiros trabalhos. Falta de pagamento e péssima administração fizeram o Sonic Youth mudar, mas não resolveu o problema. Moore chamou a gravadora de "equipamento para mafiosos de segunda linha". Lá estava a banda atrás de gravadora novamente. A quem recorrer em um momento como esse? A resposta? David Geffen.

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Dono da gravadora de mesmo nome, ele acabara de inaugurar a DGC, uma subsidiária da Geffen com distribuição pela Warner. Mas o Sonic Youth estava bastante cético em assinar com um grande selo após anos no cenário independente. Em entrevista à 'Spin', Moore agradece a Mark Kates, hoje dono da gravadora Fenway e responsável pela parte dos artistas na Geffen à época, que insistiu em contratá-los.

"Acredito que validamos o selo DGC para vários artistas, como Beck e Nirvana. Se não estivéssemos nele, teria sido uma cena diferente. A única razão pela qual trabalhamos com a Geffen foi o fato de Mark Kates estar trabalhando lá e ter saído do circuito universitário. Ninguém tocaria nossos discos, mas eles tocaram. E muitos deles trabalharam em grandes gravadoras depois", falou o guitarrista, exaltando o fato de o circuito universitário de rádios ter ajudado a revelar muitas bandas de sucesso nos anos 1980.

"Mark foi um exemplo clássico de alguém saindo de uma rádio universitária, que sempre tocou bandas como nós. De repente, ele estava trabalhando em uma grande gravadora e queria as bandas que gostava nela. E essa foi a única razão pela qual assinamos. Se o cara responsável pelo Guns N' Roses viesse nos ver, provavelmente não teríamos assinado", completou.

Por mais que a aceitação no cenário alternativo fosse das melhores, o Sonic Youth chegou em uma grande gravadora como peixe pequeno. Gordon disse que era o fim da "era da gravação no porão", enquanto aceitavam de bom grado trabalhar em um estúdio menor para liberar o maior ao Public Enemy. Mas o que poderia gerar alguma inimizade acabou servindo para aproximar os grupos -- Chuck D foi tanto que acabou colaborando em uma canção; Flavor Flav também frequentou muito o segundo estúdio, assim como o pessoal do Bomb Squad.

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Diferentemente de outras bandas muito maiores, o Sonic Youth estava pouco acostumado com o trabalho em estúdio. Até por isso, as demos do que viria ser "Goo" foram bem aceitas entre os quatro de bom grado, mas como transformá-las em algo bom o suficiente para um álbum gravado em um estúdio com o melhor equipamento tecnológico disponível? O trabalho com Nick Sansano, produtor de "Daydream Nation", começou e não terminou, já que havia pontos de discórdia entre eles, principalmente pela desconfiança em conseguir fazer um álbum bom o suficiente para tocar no rádio. A gravadora entrou em ação e Ron Saint Germain foi contratado para ajudar a finalizar o trabalho, que gerou o rompimento da amizade de Sansano com a banda.

"Estávamos desesperados para tentar terminar esse álbum, então a gravadora trouxe Ron St. Germain e nós meio que nos referimos a ele como um caubói da sala de controle. Ele realmente gostava de todas as coisas de tecnologia. E ele fez um ótimo trabalho de mixagem, embora, provavelmente, não tenha sido mixado exatamente como faríamos por conta própria", contou Ranaldo também à 'Spin'.

Os custos do orçamento foram exorbitantes em comparação com os trabalhos anteriores, tudo para concluir uma difícil missão: entrar nas rádios e agradar aos antigos fãs. Lançado em 26 de junho de 1990, "Goo" é, até hoje, o álbum mais popular do Sonic Youth. Com 200 mil cópias vendidas na primeira semana, foi o primeiro trabalho do grupo a entrar no top-200 da Billboard. Além de contar com uma das capas mais famosas da cultura pop, "Goo" tornou-se um dos discos mais influentes de todos os tempos ao abrir caminho para a geração de bandas que viria a invadir o mainstream um ano depois.

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Resenha de "Goo"

Para quem já ouviu alguns programas de rádio ou podcasts, vai identificar logo de cara os primeiros acordes de "Dirty Boots", uma das melhores introduções possíveis para qualquer programa audiovisual. De tão popular durante os meses seguintes ao lançamento, acabou virando o terceiro single informal de "Goo". Essa é uma das canções mais perceptíveis no movimento de tentar tocar no rádio -- ao melhor estilo Sonic Youth, é claro.

A seguinte é uma das mais tristes da banda: "Tunic (Song for Karen)" é uma homenagem direta a Karen Carpenter, a segunda metade dos Carpenters, morta quase uma década depois do lançamento do disco da banda. Cantada brilhantemente por Kim Gordon, a faixa explora o lado mais artístico da baixista ao fazê-la declamar alguns dos versos biográficos sobre a cantora e baterista. Depois Thruston Moore e Gordon dividem o vocal na animadinha "Mary-Christ", sobre uma menina que o guitarrista costumava namorar que também é cheia de referências à Igreja Católica.

Já "Kool Thing" foi inspirada em uma entrevista de Gordon com o rapper LL Cool J, papel de Chuck D na gravação, no qual a dupla precisou se esforçar muito para conseguir um resultado satisfatória tamanha era a diferença entre eles -- a letra é uma das melhores escritas por Gordon até hoje. Mas a tentativa de ser um pouco mais pop dura pouco e o verdadeiro Sonic Youth retorna com "Mote", inspirada no poema "Eye-Mote", de Sylvia Plath, essa um caos sonoro cantado por Lee Ranaldo ao melhor estilo deles.

O então casal retorna ao vocal em "My Friend Goo", que dá nome ao álbum e fala sobre o que era a nova geração de adolescentes mais relaxada daquela época. Por conta dela, "Blowjob?" quase foi o nome do trabalho, mas acabou sendo descartado -- o personagem foi retirado de "Sir Drone" (1989), de Raymond Pettibon, responsável pelo desenho da capa de "Goo". A banda retorna para algo mais melódico em "Disappearer" e parte para o experimental em "Mildred Pierce" e em "Cinderella's Big Score".

Personagens de "Sir Drone" retornam em "Scooter + Jinx", quando Moore faz uma faixa bem experimental ao usar apenas o som do amplificador até o limite. Ao melhor estilo Sonic Youth, disco termina com "Titanium Exposé", uma faixa "romântica" com mais de seis minutos de duração. E assim o Sonic Youth conquistaria um público diferente sem abrir mão do que sabia fazer de melhor.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Dirty Boots" (5:28)
2 - "Tunic (Song for Karen)" (6:22)
3 - "Mary-Christ" (3:11)
4 - "Kool Thing" (feat. Chuck D) (4:06)
5 - "Mote" (7:37)
6 - "My Friend Goo" (2:19)
7 - "Disappearer" (5:08)
8 - "Mildred Pierce" (2:13)
9 - "Cinderella's Big Score" (5:54)
10 - "Scooter + Jinx" (1:06)
11 - "Titanium Exposé" (6:27)

Todas as faixas foram compostas pelo Sonic Youth

Gravadora: DGC
Produção: Nick Sansano, Ron Saint Germain e Sonic Youth
Duração: 49min23s

Thurston Moore: vocal e guitarra; baixo na faixa 6
Lee Ranaldo: guitarra e vocal
Kim Gordon: vocal e baixo
Steve Shelley: bateria e percussão

Convidados:
J Mascis: vocal de apoio nas faixas 2, 5 e 6 e coprodução
Don Fleming: vocal de apoio nas faixas 1 e 7, coprodução e percussão
Chuck D: vocal na faixa 4

Produção:

Nick Sansano: produção, gravação, engenheiro de som e percussão
Ron Saint Germain: produção, engenheiro de som e mixagem
Dan Wood, John Herman e Judy Kirschner: assistente em estúdio
Howie Weinberg: masterização
Jim Waters: gravação adicional na faixa 8

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