Discos para história: Violator, do Depeche Mode (1990)


História do disco

"Durante esse período de nossa carreira, éramos bastante experimentais em nossas escolhas de locais de gravação, e adoramos a ideia de fazer de cada álbum uma aventura", disse o guitarrista e compositor Martin Gore ao site da revista 'Rolling Stone' durante as celebrações dos 25 anos de "Violator", em 2015.

O Depeche Mode já era uma banda em uma crescente considerável, mesmo com uma discografia um tanto irregular no início, o que dividia críticos e fãs. Mas o disco "Music for the Masses" (1987) e o álbum e documentário ao vivo "101" (1988) colocaram a banda em outro patamar. Sem saber, eles estavam preparando o terreno para um dos álbuns mais vendidos e lembrados dos anos 1990, um marco e tanto antes de a geração do grunge chegar e bagunçar tudo.

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Durante toda década de 1980, a banda foi indo do gótico para o uso de sintetizadores aos poucos. Assim foram conquistando fãs sem fazer muito alarde nas paradas, tanto é que o show no estádio Rose Bowl, em Pasadena, Los Angeles, em 1988, teve todos os 60 mil ingressos vendidos. Um número bastante espantoso para um álbum nada comercial como o lançado no ano anterior.

Enquanto isso, o interesse pelo sintetizador só aumentava e motivava Gore a misturar mais os instrumentos e a fazer linhas de guitarra fora do habitual. E o processo de composição do que viria a ser "Violator" começou em Londres e terminou na Dinamarca, mas a maior parte acabou sendo feita na Itália. "Gravamos a maioria de 'Violator' em Milão, o que foi muito divertido. Não sei como fazíamos alguma coisa porque estávamos saindo na maioria das noites", falou Gore na mesma entrevista à Rolling Stone.


Ele também contou que o excesso de farra acabou por colocá-los em um estúdio em Gjerlev, uma cidade no interior da Dinamarca, com o coprodutor Flood. "Quando estávamos na Dinamarca, estávamos no meio do nada. A cidade mais próxima ficava a 20 minutos de carro e era uma cidade muito pequena. Terminamos e mixamos o disco lá", contou.

Apesar de ir bem no Reino Unido e esgotando um show nos Estados Unidos, as posições na parada americana não refletiam essa ascensão. Eles precisavam de um single forte que ajudasse a catapultá-los para o sucesso. Foi aí que veio "Personal Jesus", o arrasa-quarteirão necessário para explodir de tanto sucesso e ainda ser o ponto de virada na mudança sonora definitiva.

Não havia completado seis meses do show para 60 mil pessoas nos Estados Unidos quando o primeiro single do futuro novo trabalho começou a tocar nas rádios. Lançado em 29 de agosto de 1989, chegou na 28ª posição na parada americana. Era o primeiro top-40 do Depeche Mode desde "People Are People" cinco anos antes. Depois veio outra marca história com o lançamento de "Enjoy the Silence", em fevereiro de 1990: pela primeira vez, dois singles entraram no top-100, com a nova faixa chegando ao oitavo lugar. Tudo isso acontecia pouco mais de um mês antes do lançamento do LP.

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"A demo original de 'Enjoy the Silence' era muito lenta e minimalista, apenas eu e um harmônio, então Alan (Wilder, instrumentista, arranjador e membro da banda de 1982 até 1995) teve a ideia de colocar uma batida nela. Adicionamos o coral e o produtor (Flood) e Alan disseram: 'Por que você não toca guitarra por cima?' Foi quando eu criei o riff. Talvez tenha sido a única vez na nossa história em que todos nos entreolhamos e dissemos: 'Acho que isso pode ser um sucesso'. A música eletrônica parecia estar fazendo todas as coisas empolgantes do punk de uma maneira futurística", disse Gore à revista 'Mojo' em 2012.

Em 19 de março de 1990, "Violator" faria história ao chegar ao sétimo lugar na parada americana pela primeira vez e no segundo lugar no Reino Unido, algo inimaginável anos antes. Com isso, o Depeche Mode conseguiu cravar que o então sucesso dos últimos trabalhos não era apenas algo passageiro. Sem saber, eles influenciaram toda uma geração de músicos com um dos álbuns mais importantes daquela década.


Resenha de "Violator"

O engraçado (talvez não seja a melhor palavra, mas vai essa mesmo) é ouvir o início de "Violator" e constatar que começa de maneira positiva com "World in My Eyes", em que o amor, sexo e prazer são coisas positivas na vida de um ser humano e sem problema algum em saber disso. É teor bem pop dançante, ainda um reflexo dos anos 1980. Mas o clima começa a virar em "Sweetest Perfection", em que Martin Gore aborda uma espécie de dependência autodestrutiva de alguém. Os arranjos trazem o sintetizador, mas misturado em outros instrumentos.

Muita gente pode não saber, mas "Personal Jesus" nasceu após Gore ler que Priscila Presley chamava o marido, Elvis, de "seu próprio Jesus pessoal". A canção usa disso para falar sobre idolatria e ter alguém para desabafar, ainda que de maneira não convencional. Provavelmente, é a canção mais conhecida do Depeche Mode até hoje e ainda encanta mais de três décadas após o lançamento.



Após o início, vem o sentimento de culpa cristão instalado em boa parte da sociedade. "Halo" usa um tom quase industrial (o subgênero musical, não a fábrica da Ford) para falar sobre isso, e desse sentimento de injustiça por esse sentimento nos dominar muitas vezes e impedir algo de acontecer. Já a mistura de desesperança com esperança aparece na frágil "Waiting For The Night", em que a mudança sonora da banda se acentua com uma faixa bastante experimental e cheia de nuances.

Mas o grande sucesso do álbum mesmo foi "Enjoy the Silence". No embalo de "Personal Jesus", ainda é a melhor colocação de uma música nos Estados Unidos e ajudou nas vendas. Era para ser uma balada muito mais melancólica, mas a magia aconteceu no estúdio e a transformou em um fenômeno nas rádios universitárias em todo país. E ainda há discussões até hoje sobre se a letra fala sobre um romance ou drogas -- escolha sua versão, tem para todo mundo.



"Policy of Truth" surge com a banda dizendo que é difícil se recuperar de um erro depois de cometê-lo (Depeche Mode adivinhou o cancelamento nas redes sociais???). A sétima de "Violator" retornou com o espírito dos anos 1980 e ainda conseguiu uma marca histórica: foi o único single do trabalho melhor nos Estados Unidos do que no Reino Unido (15º x 16º).

Típica canção reflexo de uma época, "Blue Dress" pode ser bonita e muito assustadora ao mesmo tempo, já que o autor fala sobre como ver "uma garota se vestindo faz o mundo girar". O arranjo cria um clima bem melancólico e ajuda nessa impressão -- bom lembrar mais uma vez que era 1980 e muita coisa era tolerada. E "Clean" encerra o álbum com uma 'vibe' Pink Floyd para falar sobre uma limpeza -- de novo, pode ser sobre drogas ou outra coisa qualquer, o debate é infinito.

"Violator" se encaixa do álbum que poderia ter sido muito maior se não fosse as bandas denominadas grunge pela crítica e fãs. O sétimo álbum do Depeche Mode reúne todas características para ser um representante da geração perdida dos anos 1980 ao conter ao mesmo tempo certa empolgação, melancolia de não saber sobre o futuro e o desânimo de uma mudança que nunca vem. Se ainda é lembrado até hoje como melhor trabalho desses britânicos, é sinal que nem a última grande novidade no mundo da música foi capaz de derrubá-los. Mas que dava para ser imenso, isso dava.



Ficha técnica

Tracklist:

1 - "World in My Eyes" (4:26)
2 - "Sweetest Perfection" (4:43)
3 - "Personal Jesus" (4:56)
4 - "Halo" (4:30)
5 - "Waiting for the Night" (6:07)
6 - "Enjoy the Silence" (6:12)
7 - "Policy of Truth" (4:55)
8 - "Blue Dress" (5:41)
9 - "Clean" (5:32)

Todas as músicas foram escritas por Martin L. Gore.

Gravadora: Mute
Produção: Depeche Mode / Flood
Duração: 47min02s

Depeche Mode (Alan Wilder, David Gahan, Andrew Fletcher e Martin Gore): instrumentos diversos, vocal e vocal de apoio

Convidados:

Flood: produtor e mixagem de "Enjoy the Silence"
François Kevorkian: mixagem de todas as faixas, exceto "Enjoy the Silence"
Daniel Miller: mixagem de "Enjoy the Silence"



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