Discos para história: Na Calada da Noite, do Barão Vermelho (1990)


História do disco

Um dos grandes fenômenos do rock brasileiro dos anos 1980, o Barão Vermelho passou por uma crise criativa assim que Cazuza deixou a banda em 1985. O filme "Cazuza – O Tempo não Para" (2004) dá a entender que o vocalista saiu para ter mais liberdade criativa dentro de uma carreira solo que poderia explorar diversos elementos musicais, diferente do que queria um intransigente Roberto Frejaj, guitarrista e principal parceiro nas composições.

Ao longo dos anos, porém, os depoimentos de integrantes e do empresário e produtor Ezequiel Neves falam abertamente que foi em comum acordo. O fato é que o grupo decidiu continuar com Frejaj como vocalista principal. Em 1986, saiu o primeiro disco sem Cazuza. Chamado "Declare Guerra", não vendeu muito bem por conta da qualidade e de uma péssima prensagem. Muitos alegam que a Som Livre havia abandonado o Barão Vermelho para apoiar a carreira solo de Cazuza – e essa alegação só piorava quando lembravam que o João Araújo, presidente da gravadora, era pai do cantor.

Mais discos dos anos 1990:
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Acabou sendo o último disco em parceira com a Som Livre. No ano seguinte, "Rock'n Geral" (1987) foi o primeiro com a WEA. Com influência da música afro-americana, como o blues, baladas e funks, o LP foi outro fracasso monumental, vendendo apenas 15 mil cópias. Parecia o fim do grupo, mas 1988 acabou sendo um ano de retomada. O tecladista Maurício Barros saiu, porém o guitarrista Fernando Magalhães e o percussionista Peninha entraram e reforçaram um time que não jogaria a toalha por ter perdido duas batalhas. A guerra era longa e eles iriam até o fim.

O lançamento de "Carnaval" (1988) e o sucesso do single "Pense e Dance", sucesso na trilha sonora da novela "Vale Tudo" (1988), deu fôlego ao grupo e gerou o convite para abrir os shows de Rod Stewart no Brasil. O grande pulo do grupo com a nova formação viria dois anos depois, fazendo do final da década de 1980 o início de uma retomada consagrada no início da década seguinte.

A retomada gerou o disco ao vivo chamado "Barão ao Vivo" (1989) no mesmo lugar onde haviam começado um ano antes: em um show realizado na casa noturna paulistana DamaXoc. Apesar de profissionalmente as coisas começaram a ganhar um rumo, o baixista Dé estava cada vez mais insatisfeito e as constantes brigas acabaram fazendo com que ele deixasse o grupo. Em seu lugar, entrou Dadi, ex-Novos Baianos e A Cor do Som.

Veja também:
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Entre críticos e membros da banda na época, todos concordam que "Na Calada da Noite" é o álbum que libertou o grupo definitivamente de Cazuza. Mais aberto musicalmente com o uso de vários instrumentos e arranjos, até mesmo as letras ganharam um tom mais adulto, político e poético. Aliás, o ex-vocalista foi um grande incentivador dessa mudança e, nos últimos meses de vida, frequentava o estúdio de gravação quase todos os dias.

Depois de tropeçar e tatear bastante durante quase meia década, o Barão Vermelho se encontrou em um trabalho com muita liberdade musical entre os integrantes. E esse álbum mostrou, sim, que havia vida após a saída de Cazuza e que o grupo ainda tinha muita lenha para queimar nos anos seguintes.


Resenha "Na Calada da Noite"

O então novo trabalho da banda, enfim, servia para tirar as amarras musicais. Não existia mais o compromisso em fazer rock, como era na cabeça dos então garotos que fundaram o Barão Vermelho com o sonho de fazer música. Com o sucesso de "Pense e Dance", havia mais espaço para ousar. O uso do violão mais melódico na ótima "Política Voz" dá o tom do que seria o trabalho: mais adulto tanto do ponto de vista das letras quanto das melodias.

A faixa-título mostra mais opções musicais nos arranjos ao misturar um arranjo de cordas com um andamento bem leve, quase dançante. Muito diferente de qualquer coisa que a banda tenha feito em qualquer época da curta existência, como na balada "Sonhos pra Voar" de versos do tipo "O homem precisa de grandeza/ Dentro dele está sua maior riqueza/ O homem precisa de grandeza/ Tirar da vida o que vale a pena" ou ainda na curta e bem profunda "Seco".



Claro que o rock não ficaria de fora, afinal ainda era o Barão Vermelho. Canções como "O Invisível", "Beijos de Arame Farpado" e Invejo os Bichos" ainda mostravam que a velha banda ainda estava lá, assim como a energia em querer fazer esse tipo de música. A diferença era que, mais experientes, era possível explorar mais musicalmente sem abandonar o estilo que mais gostavam. Parece que, como diziam na época, que a ficha havia caído.

A grande música do trabalho é a última. Composta por Frejat e a cantora e compositora Dulce Quental, "O Poeta Está Vivo" é uma homenagem a Cazuza que só foi lançada após a morte do cantor, aos 32 anos, em 1990. A profundidade da letra ganhou muito com o arranjo e a voz de Frejat conseguiu captar bem a melancolia da letra, uma das mais tocadas da história da banda e uma das melhores canções dos anos 1990.

"Na Calada da Noite" apontava um bom caminho para o Barão Vermelho ao abraçar novos estilos musicais em um disco que marcou a recuperação depois de fracassos e a troca de gravadora. Tanto é que é um dos poucos discos brasileiros lançados em 1990 lembrados em listas de melhores daquela década.



Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Política Voz" (Jorge Salomão e Roberto Frejat) (2:43)
2 - "O Invisível" (Dé, Guto Goffi, Jorge Salomão e Roberto Frejat) (3:07)
3 - "Na Calada da Noite" (Roberto Frejat e Luiz Melodia) (4:11)
4 - "Beijos de Arame Farpado" (Dé, Ezequiel Neves e Sérgio Serra) (4:46)
5 - "Sonhos pra Voar" (Roberto Frejat e Guto Goffi) (1:56)
6 - "Seco" (Jorge Salomão e Roberto Frejat) (0:49)
7 - "Tão Longe de Tudo" (Guto Goffi) (3:42)
8 - "A Voz da Chuva" (Ezequiel Neves, Roberto Frejat e Sérgio Serra) (3:39)
9 - "Tua Canção" (Roberto Frejat e Sérgio Serra) (2:06)
10 - "Invejo os Bichos" (Fernando Magalhães, Paulo Humberto Pizziali e Roberto Frejat) (3:08)
11 - "O Poeta Está Vivo" (Roberto Frejat e Dulce Quental) (4:19)

Gravadora: WEA
Produção: Ezequiel Neves
Duração: 34 minutos

Roberto Frejat: guitarra, violão e vocal
Fernando Magalhães: guitarra e violão
Dadi Carvalho: baixo
Guto Goffi: bateria
Peninha: percussão

Convidados:

Maurício Barros e Nico Rezende: órgão
Renato Neto: piano
Rick Ferreira: steel guitar em "Tua Canção"
Ronaldo Barcelos, Mariza, Nina, Jurema e Gérson: coro
Gaetano "Kay" Galifi: violão flamenco em "O Invisível"
Paulo Junqueiro e Guilhermão: percussão



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