Discos para história: Nação Zumbi, da Nação Zumbi (2002)

História do disco

Existiram poucas pessoas na música brasileira recente com o impacto que Chico Science teve. Primeiro, em Pernambuco, depois foi o Brasil inteiro que teve acesso ao manguebeat e a influência desse movimento musical em meados dos anos 1990. Era original, era fresco, era brasileiro, era todo potencial do talento misturando a regionalidade com o gosto musical dos integrantes.

Com a morte de Science em 1997, em um acidente de carro, continuar era difícil. Mas eles seguiram com Jorge du Peixe assumindo os vocais da Nação Zumbi. Um ano depois, o grupo lançou o álbum duplo "CSNZ" (1998), uma homenagem ao amigo e companheiro de várias horas. Quando o impacto passou, eles precisaram lidar com o fim do contrato com a Sony e a busca por uma nova gravadora. Acabou sendo a YB Music, uma produtora que então trabalhava com publicidade, a lançar "Rádio S.Amb.A.: Serviço Ambulante de Afrociberdelia", em 2000, o primeiro trabalho gravado inteiramente por Du Peixe nos vocais.

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Hoje um disco colecionável e reconhecidamente um trabalho acima da média, o quarto disco da banda foi recusado por diversas gravadoras, um sinal claro e triste que a "moda" havia passado para alguns. Não restava outra opção a não ser continuar e foi o que eles fizeram. Com shows cada vez melhores, um repertório com cheio de boas músicas e sucesso no exterior, onde o disco vendeu mais do que no Brasil, eles estavam prontos para o próximo trabalho.

No final dos anos 1990 e início dos anos 2000, havia uma gravadora independente chamada Trama, a primeira a apostar no sucesso da internet na distribuição de música no formato digital. Foi com a empresa que o grupo assinou contrato para gravar o novo disco, que simplesmente levaria Nação Zumbi no nome.

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"Vai ser um disco muito forte, talvez tanto quanto o "Afrociberdelia'. O Jorge [du Peixe] fez umas letras muito bacanas. Ele escreve de um jeito bem diferente do Chico, o que é interessante. Chico era quase panfletário, e o Jorge usa muitas metáforas", disse o guitarrista Lúcio Maia, em entrevista para Claudia Assef, para a 'Folha de S. Paulo, em fevereiro de 2002.

Bem, ele tinha razão.

Para o site "Waves", em 2004, durante o Hang Loose Pro Contest, Du Peixe deixou bem claro que a banda jamais iria permanecer a igual. Mesmo com um passado em que as pessoas insistiam em lembrar, a solução deles foi olhar para frente, pessoal e musicalmente falando.

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"As pessoas acham somos uma banda regional, mas não somos. Fomos muito influenciados pelo maracatu, pois não podemos fugir da nossa cultura e da realidade em que vivemos. Mas, o que importa é preservar a identidade. Para nós a mudança é muito importante. É uma coisa natural. Você vai aprendendo, ouvindo e absorvendo novas influências. Nunca vamos fazer um disco parecido com o que já fizemos, é natural. A diferença e a variação são importantes para nós", explicou.

Lançado em 7 outubro de 2002, um dia após o primeiro turno da eleição presidencial, a Nação Zumbi também trazia renovação e vislumbrava o futuro ao mostrar para público e crítica que não dependia apenas da influência regional para fazer a própria música. É sempre complicado recomeçar com um vocalista novo, mas a Nação Zumbi conseguiu firmar âncora ao lançar um dos melhores trabalhos da carreira.

Resenha de "Nação Zumbi"

Existem certas músicas que não fazem o menor sentido estarem em outras partes do disco que não o começo. É o caso de "Blunt Of Judah", feita sob medida para abrir o então novo trabalho da Nação Zumbi. Usando a percussão com maestria, a canção viraria um dos grandes momentos dos shows desde então.

A guitarra de Scotty Hard e Lúcio Maia fazem de "Mormaço" uma boa escolha para manter o ritmo e, seguida por "Propaganda" — faixa sobre os tempos sombrios que já estavam por aí—, conseguem manter a atenção do ouvinte numa mistura que fez da Nação Zumbi um sucesso.

Os elementos eletrônicos entram em ação em "Amnesia Express", canção em inglês que, olhando hoje, não faz muito sentido na discografia e soa fora de lugar. Esse experimento seria fundamental no trabalho seguinte, "Futura", em 2005, quando a banda usa ainda mais o artifício e deixa a percussão um pouco de lado em alguns momentos.

Depois da faixa de abertura, o segundo grande momento do álbum é "Meu Maracatu Pesa Uma Tonelada", uma das melhores músicas da história do grupo — sim, também incluindo a encarnação anterior. Misturando a força das guitarras com a percussão e o vocal de Du Peixe melhor do que nunca, é uma dessas canções transformadoras. Escrever um hit desse nível é para poucos.

"Faz Tempo" surge em uma mistura de rap, rock, ritmos do oriente médio e eletrônico. É outra que funciona bem, assim como a balada "Prato de Flores" ("Eu vou lhe dar um prato de flores/ E no seu ventre vou fazer o meu jardim/ Que vai florir, Que vai florir"). Já "Know Now", segunda canção em inglês, também foge do repertório e acaba não se destacando por não ser boa como as outras.

As religiões afro-brasileiras aparecem em "Ogan Di Belê", uma bonita canção de teor experimental que funciona como uma oração, enquanto "Caldo de Cana", com participação da incrível Dona Cila do Coco, traz a tradição misturada com a modernidade — algo que a Nação Zumbi conseguiu fazer muito bem ao longo dos anos.

Outras participações no álbum são de Nina Miranda (vocal) e Fernando Catatau (teclados) em "O Fogo Anda Comigo", de letra inspirada no filme "Twin Peaks: Os Últimos Dias de Laura Palmer", de 1992. Para finalizar, a pancada "Tempo Amarelo" encerra o trabalho com chave de ouro.

Ser comparado o tempo inteiro com alguém e ver o público e crítica criando expectativas não devia ser nada fácil para eles, ainda mais pela escolha de seguir trabalhando no que sabiam fazer: música. Definitivamente, "Nação Zumbi" é o disco da consolidação deles, enquanto grupo musical independente e com ideias próprias, uma espécie de libertação visando o futuro sem esquecer o passado.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Blunt Of Judah" (Jorge Du Peixe) (4:13)
2 - "Mormaço" (feat. Scotty Hard) (Jorge Du Peixe) (4:46)
3 - "Propaganda" (Gilmar Bolla Oito, Jorge Du Peixe, Rodrigo Brandão) (4:15)
4 - "Amnesia Express" (Jorge Du Peixe) (3:46)
5 - "Meu Maracatu Pesa Uma Tonelada" (Jorge Du Peixe) (2:34)
6 - "Faz Tempo" (Jorge Du Peixe) (4:05)
7 - "Prato de Flores" (Jorge Du Peixe) (3:15)
8 - "Know Now" (feat. Scotty Hard) (Jorge Du Peixe) (4:03)
9 - "Ogan Di Belê" (Gilmar Bolla Oito, Jorge Du Peixe, Marcos Matias, Toca Ogan) (5:15)
10 - "Caldo de Cana" (feat. Dona Cila) (Dona Cila, Jorge Du Peixe) (3:25)
11 - "O Fogo Anda Comigo" (Jorge Du Peixe, Roger Man) (3:04)
12 - "Tempo Amarelo" (Gilmar Bolla Oito, Jorge Du Peixe) (2:00)

Gravadora: Trama
Produção: Nação Zumbi, Arto Lindsay e Instituto
Duração: 44min24

Dengue: baixo
Gilmar Bolla Oito: vocal de apoio e alfaia
Pupillo: bateria e percussão
Marcos Matias: alfaia nas faixas: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10 e 12
Daniel Ganjaman: teclado nas faixas: 4, 7, 8, 12
Fernando Catatau: teclado nas faixas: 1, 4, 11
John Medeski: piano na faixa 8
DJ Marcelinho: scratches na faixa 6
Nina Miranda: vocal na faixa 10
Rodrigo Brandão: vocal na faixa 3
Lúcio Maia: guitarra
Toca Ogan: vocal de apoio e percussão
Gustavo da Lua: alfaia
Jorge Du Peixe: vocal, percussão, scratches e gaita
Dona Cila: vocal na faixa 11
Scotty Hard: guitarra e mixagem
Gravação: Marcos Ferrari
Assistente em estúdio: Alex Theoret

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