Discos para história: Last Splash, das Breeders (1993)

História do disco

A história das Breeders começa no Pixies. Sim, isso mesmo. Quando Black Francis estava cada vez mais tomando para si o papel de líder, cantor e principal compositor, a baixista Kim Deal não deixou barato e, durante a turnê de divulgação de 'Surfer Rosa", disco lançado em 1988, começou a escrever material próprio. A crise entre eles era tão grande, que Francis chegou a jogar uma guitarra em Deal durante um show na Alemanha. Rapidamente a ideia virou uma demo, que virou proposta para gravadora 4AD e virou as Breeders.

Ao lado da guitarrista Tanya Donelly, Deal contou com Josephine Wiggs, do Perfect Disaster, no baixo, e Britt Walford, do Slint, na bateria, com Steve Albini na produção de "Pod", o primeiro trabalho de estúdio, que não fez muito sucesso, mas gerou resenhas positivas por parte da crítica independente. Depois disso, cada um voltou para a respectiva banda e parecia que as Breeders foram um projeto divertido de uma folga de todos eles. O que ninguém sabia eram os planos de Francis para si próprio.

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Cada dia mais isolada da banda, Deal foi a única a não se mudar para Los Angeles e o contato com o Pixies era feito apenas durante as turnês, ensaios e gravações. E após o final da turnê de "Trompe le Monde", de 1992, Francis simplesmente disse em uma entrevista para BBC Radio 2 que o Pixies havia acabado. Só mais tarde, naquele dia, enviou um fax oficial demitindo todo mundo. Agora, todos estavam livres. E era hora de reativar as Breeders.

Na Inglaterra, onde acabaria gravando um EP com o nome do grupo, Deal descobriu que Walford e Donelly estavam com outros planos — a fundação da banda Belly — e não estavam disponíveis para a gravação do novo material que Deal vinha desenvolvendo nos últimos meses, durante os agonizantes momentos do Pixies. E agora? Bem, a primeira atitude foi convidar a irmã gêmea Kelly para assumir a guitarra — detalhe: ela não sabia tocar o instrumento. A segunda atitude foi correr atrás de um novo baterista e ela encontrou Jim MacPherson, futuro baterista do Guided By Voices por quase uma década.

Rapidamente, as Breeders começaram a trabalhar e viraram atração de abertura dos shows do Nirvana na Europa, transformando Kim Deal em líder de uma banda muito rapidamente. Essas apresentações ajudaram no amadurecimento e no entrosamento, fundamental para a gravação do próximo trabalho de estúdio. 

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Passado o período das festas de fim de ano de 1992, a banda formada pelas irmãs Deal, Wiggs e MacPherson foram para San Francisco, na Califórnia, no Coast Recorders, para iniciar as gravações do então novo álbum de estúdio em janeiro do ano seguinte. Em meio às nevascas, Kelley relembra o sufoco que foi dirigir de um lado para o outro nesse período.

"Dirigindo de Dayton a San Francisco para fazer o disco, era janeiro e houve uma terrível tempestade de neve. Pobre Jim, descendo uma montanha com Kim e eu em um grande caminhão que ele tinha que dirigir à noite. Ele estava enlouquecendo. Talvez seja porque gostamos de gravar no inverno para viajar no verão. Não sei se fizemos de propósito ou não, mas, se o fizemos, foi uma ideia brilhante", contou ela ao site 'Diffuser', durante as comemorações de 20 anos de "Last Splash".

Eles ficavam indo de um lado para o outro porque Kim não gostou do som da bateria no estúdio e pediu para transferir parte das gravações para o Mission District, também em San Francisco. E o que ela queria fazer era explorar ao máximo sons, letras, ambientes sonoros, tudo que Francis a havia impedido de fazer nos últimos anos. Assim, ela conseguia improvisar e ir atrás de pratos para quebrar e usar uma máquina de costura para conseguir determinados sons. E não importava se seria um sucesso ou não, o importante era experimentar até encontrar o próprio som.

Lançado em 30 de agosto de 1993, "Last Splash" recebeu algumas críticas negativas, mas, no geral, foi bem recebido por fãs e críticos que, embalados pelo sucesso inesperado do hit "Cannonball", deram às Breeders o reconhecimento que o Pixies ainda não havia conseguido. O trabalho estreou na quinta posição na parada do Reino Unido e na 33ª nos Estados Unidos. 

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"As Breeders saíram da zona de conforto do rock grunge, passando pela fórmula padrão de som suave e alto de seus contemporâneos, inventando um espectro pop grunge peculiar e particular", disse Kim, em entrevista ao site 'Tone Deaf'.

Se existia uma competição entre Kim Deal e Francis, a agora líder de banda havia vencido com folga com um trabalho sem qualquer pretensão de ser enorme. Ao romper a barreira do rock independente e atingir um incontável número de pessoas, gerou um considerável impacto na música, refletido até hoje, quando a banda celebra os 30 anos da obra-prima de Kim Deal.


Resenha de "Last Splash"

"Last Splash" começa com a curta "New Year", o grito de libertação de Kim Deal das cordas do Pixies. Definitivamente, agora ela era a líder de uma banda e começava o segundo trabalho de estúdio com o pé na porta. Logo na sequência, vem o hit "Cannonball", com a demo gravada logo após o recado sobre a demissão, de refrão explosivo, guitarras altas e um vocal distorcido de ar grunge ("In the shade/ In the shade/ Want you, cuckoo cannonball/ Want you, cuckoo cannonball").

O refrão grudento de "Invisible Man" é um enorme trunfo na discografia da banda, quando as guitarras são o grande destaque ("That's all that's left behind/ The skies and a sweet caress/ The skies, the sights/ And a sweet caress/ He's the invisible man/ Catch him if you can"). A guitarra havaíana aparece na melancólica "No Aloha", que explode na parte final com um grande momento do baterista Jim MacPherson.

Com pouca letra e uma longa parte instrumental, "Roi" entra no lado experimental do álbum, momento em que a banda pôde brincar no estúdio com instrumentos, formatos e vários elementos musicais até chegar no resultado esperado. E se a melancólica "Do You Love Me Now?" surge para mostrar os sentimentos de Deal, na letra escrita em parceria com a irmã, a instrumental "Flipside" chega para animar um pouco as coisas.

"I Just Wanna Get Along" soa muito uma "homenagem" a Francis em uma faixa de teor punk com menos de dois minutos. E "Mad Lucas" traz o retorno do vocal distorcido, do lado experimental, em uma canção lenta e cheia de nuances em todos os aspectos. O lado pop também volta para falar sobre as mentiras que os adultos contam para agradar na simples "Divine Hammer".

A banda soa entrosada e animada na pulsante "S.O.S." para retornar ao lado etéreo em "Hag". Para finalizar, "Saints" abre a parte final colocando outro hit para jogo em mais uma ótima letra de Deal, e "Drivin' on 9" (tem um violino nessa música!) e "Roi (Reprise)" fecham o álbum.

Quem melhor falou sobre as Breeders ao longo dos anos foi Kurt Cobain, líder de guitarrista do Nirvana, fã de primeira hora das letras de Kim Deal e dos arranjos das músicas da banda. "A razão pela qual gosto das Breeders é por suas músicas, pela maneira como as estruturam, totalmente única, muito atmosférica. Eu gostaria que Kim tivesse permissão para escrever mais músicas para os Pixies, porque 'Gigantic' é a melhor música dos Pixies, e Kim a escreveu", falou.

"Last Splash" só confirmas os elogios de Cobain ao grupo, que conseguiu fazer do trabalho um dos melhores e mais famosos do início dos anos 1990. Com uma banda para chamar de sua, Kim Deal mostrou que tinha talento para o sucesso. E conseguiu.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - "New Year" (1:56)
2 - "Cannonball" (3:33)
3 - "Invisible Man" (2:48)
4 - "No Aloha" (2:07)
5 - "Roi" (4:11)
6 - "Do You Love Me Now?" (Kim Deal/ Kelley Deal) (3:01)
7 - "Flipside" (1:59)
8 - "I Just Wanna Get Along" (Kim Deal/ Kelley Deal) (1:44)
9 - "Mad Lucas" (4:36)
10 - "Divine Hammer" (2:41)
11 - "S.O.S." (1:31)
12 - "Hag" (2:55)
13 - "Saints" (2:32)
14 - "Drivin' on 9" (Dom Leone/ Steve Hickoff) (3:22)
15 - "Roi (Reprise)" (0:43)

Todas as músicas foram escritas por Kim Deal, exceto as marcadas

Gravadora: 4AD/ Elektra Records
Produção: Kim Deal/ Mark Freegard
Duração: 39min38

Kim Deal: vocal principal, guitarra, sintetizador Moog e Casiotone
Kelley Deal: guitarra, máquina de costura Kenmor, guitarra havaíana, bandolin e vocal de apoio; vocal principal em "I Just Wanna Get Along"
Jim MacPherson: bateria; baixo em "Roi"
Josephine Wiggs: baixo, baixo duplo, vocal de apoio e violoncelo; bateria em "Roi"

Carrie Bradley: violino e vocais adicionais

Mark Freegard: engenheiro de som
Sean Leonard e Andy Taub: engenheiro de som assistente
Daniel Presley: engenheiro de som em "Divine Hammer"

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