Resenha: Eric Clapton – I Still Do


Guitarrista vem diminuindo o ritmo das turnês a cada ano

Diminuindo cada vez mais o ritmo das turnês nos últimos cinco anos, Eric Clapton tem usado o tempo para trabalhar em estúdio. Entre 2013 e 2015, foram dois discos bons lançados (Old Sock e The Breeze: An Appreciation of J.J Cale). Para este ano, o bluesman disponibilizou I Still Do, uma coletânea de canções de amigos e ídolos com duas faixas inéditas incluídas.

A primeira canção é o cover de "Alabama Woman Blues", lançada pelo pianista Leroy Carr (1908 – 1935) em sua curta carreira, é aquele tipo de blues feito no auge do gênero, entre os anos 1930 e 1950. E como boa parte do repertório do blues, a letra vem lá do fundo da alma para falar sobre a vida. Do amigo J.J. Cale (1938 - 2013) vem a cheia de ritmo e até então inédita "Can't Let You Do It", em que o personagem principal reflete sobre atitudes de sua vida e da amada.

"I Will Be There" ganhou um clima melancólico e cheio de nuances, pronta para emocionar quem a escute – o solo no violão no final é muito bonito. A primeira de duas inéditas é "Spiral", que é uma auto-homenagem e um recado: estou parando, mas o blues não sai de mim 'penso nele de manhã, ao longo do dia e a tarde'. Ele precisa do blues, e o blues estará com ele até o fim.

Simples em sua estrutura, "Catch the Blues" não foge do estilo desenvolvido por Clapton ao longo de sua carreira e consegue ficar bem dentro do álbum, e "Cypress Grove", cover de uma das lendas do Delta Blues Skip James, traz um blues gospel que o guitarrista conseguiu colocar seu estilo sem tirar a autenticidade da letra.

Lançada pela primeira vez há mais de 80 anos, "Little Man, You've Had a Busy Day" é outro clássico, e isso coloca imensa responsabilidade para quem canta, certo? Clapton pegou uma faixa completamente vocal e a transformou em um blues de alto nível feito a partir de uma letra muito simples e direta. Como fã e até dono do legado de Robert Johnson (1911 – 1938), ele tinha que colocar uma canção do ídolo neste novo álbum. A escolhida foi "Stones in My Passway", que ele já havia gravado em um projeto só com músicas de um dos maiores do blues em todos os tempos.

E até uma composição de Bob Dylan aparece no trabalho, com "I Dreamed I Saw St. Augustine". Essa balada folk virou uma canção toda baseada no piano, algo muito próximo do gospel. A guitarra aparece depois e chama atenção na segunda metade, quando ajuda a amarrar tudo. Mas, entre todos os covers, o mais bonito é o de "I'll Be Alright". Sério, não tem como não chorar ao ouvi-la. Ela toca sua alma sem o menor esforço.

Mais uma de Cale, "Somebody's Knockin'" é outro blues de bom nível e antecede a maravilhosa "I'll Be Seeing You", um encerramento que soa como Clapton vislumbra passar seus dias quando se aposentar de vez da música. Aliás, esse disco parece uma junção de canções que, por acaso, tem teor pessoal em várias partes – uma autobiografia cantada.

O recado é claro: Eric Clapton está diminuindo o ritmo de suas atividades e tem o desejo de relaxar em algum momento no médio prazo. Talvez não pare de lançar discos, mas esse soa uma preparação de terreno ao adeus definitivo.

Tracklist:

1 - "Alabama Woman Blues" (Leroy Carr)
2 - "Can't Let You Do It" (J.J. Cale)
3 - "I Will Be There" (featuring Angelo Mysterioso) (Paul Brady, John O'Kane)
4 - "Spiral" (Eric Clapton, Andy Fairweather Low, Simon Climie)
5 - "Catch the Blues"
6 - "Cypress Grove" (Skip James)
7 - "Little Man, You've Had a Busy Day" (Maurice Sigler, Mabel Wayne, Al Hoffman)
8 - "Stones in My Passway" (Robert Johnson)
9 - "I Dreamed I Saw St. Augustine" (Bob Dylan)
10 - "I'll Be Alright" (Traditional)
11 - "Somebody's Knockin'" (J.J. Cale)
12 - "I'll Be Seeing You" (Irving Kahal, Sammy Fain)

Nota: 4/5



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