Discos para história: Dirty, do Sonic Youth (1992)


Depois de uma semana sem a seção – culpa inteira do editor do blog –, ela retorna com um dos clássicos dos anos 1990: Dirty, do ótimo Sonic Youth. Para ninguém perder a conta, esta é a 95ª edição do Discos para história. Aliás, no final do post, tem uma pergunta para vocês.

História do disco

Para uma banda independente, chegar a uma gravadora grande é um sonho. Só de ter mais recursos técnicos, mais dinheiro para gravar e ter chance de experimentar mais são ótimos motivos para deixar a independência e partir para algo maior. No caso do Sonic Youth, entrar na Geffen seria um passo e tanto. O problema é que a banda não leu as famigeradas letras miúdas do contrato.

Goo, lançado em 1990, foi o primeiro disco pela nova gravadora. Só que não foi bem pela Geffen, mas pela DGC, subsidiária da principal. O desapontamento foi grande, mas o contrato foi cumprido, ainda mais com a boa recepção da crítica e do público. Para o próximo álbum, a banda escolheu Butch Vig para produzir e Andy Wallace para mixar, dupla que havia trabalhado meses antes em Nevermind, do Nirvana. Thurston Moore, Kim Gordon, Lee Ranaldo e Steve Shelley chegaram em um acordo com relação ao que Dirty deveria ser e ter: melodias bem estruturadas e guitarras altas.

Entre o final de 1991 e início de 1992, Vig recebeu algumas fitas da banda com possíveis canções. O primeiro lote não agradou nenhum pouco, pois ele não conseguia identificar e estruturar o som de maneira adequada para ter uma opinião formada. O segundo já veio melhor porque a banda trabalhou e moldou o som, indicando o caminho que desejavam seguir dali em diante. O trabalho começou quando Vig se mudou para Nova York, e eles iniciaram o processo de gravação no estúdio The Magic Shop (mostrado no último episódio de Sonic Highways).


Como diria o sábio, foi pau na máquina o tempo inteiro. Foram três meses intensos de gravações, repetições, ensaios, ideias, começa, apaga, recomeça, bom, ruim.. As sessões foram tão boas, que Ian MacKaye, do Minor Threat e do Fugazi, apareceu para dar uma olhada e acabou participando da gravação de "Youth Against Fascism". Mas claro que teria uma pequena discórdia ao final dos trabalhos.

Gordon, Moore e o assessor do grupo conversaram e combinaram de retirar a canção "Genetic", de Ranaldo, da mixagem final do disco. O guitarrista, de cabeça cheia por problemas pessoais, não gostou nada de saber da decisão, estourou com todos e cogitou seriamente em sair do Sonic Youth. O assunto só seria resolvido semanas depois. Ânimos mais calmos, os quatro conversaram novamente e tudo foi acertado – a faixa está no relançamento deluxe do disco, de 2003.

Colocado no mercado em 21 de julho de 1992, Dirty chegou à sexta posição no Reino Unido e a 83ª nos Estados Unidos. O álbum foi muito bem recebido pela crítica e foi considerado um dos grandes lançamentos daquele ano. Era o auge de um trabalho que havia começado ainda no início dos anos 1980.



Resenha de Dirty

Ao ouvir "100%", é possível imaginar o motivo de ela não ter alcançado uma melhor colocação nas paradas. Com distorções para dar e vender, a canção é o Sonic Youth puro, de raiz, moleque, sem rodeios, para cima, aquele que Kurt Cobain era fã. Ela é uma homenagem a Joe Cole, roadie do Black Flag, morto em um assalto em dezembro de 1991 (Can you forgive the boy who shot you in the head/Or should you get a gun and go and get revenge/A hundred percent of my love up to you, true star/It's hard to believe you took off/I always thought you'd go far/I've been around the world a million times/And all you men are slime/Gun to my head, goodbye I am dead/Wastewood rockers it's time for crime, hey!)

Kim Gordon desfila toda sua graça como guitarrista e cantora na ótima "Swimsuit Issue". A canção é tão rápida, que soa como um punk, mas ganha peso na segunda metade e soa quase um heavy metal, de tão arrastada que fica. Apesar de manter o ritmo lento, "Theresa's Sound-World" praticamente emenda com as duas anteriores, formando quase uma única música. Aqui, Moore apresenta o que ele gosta: uma melodia lenta que cresce e ganha camadas e mais camadas de guitarras distorcidas e cheias de efeitos. É quase um prog – seja pelo tempo de duração ou pelo estilo melódico mais cheio de detalhes.



Uma das melhores do repertório do grupo, "Drunken Butterfly" tem uma Gordon inspirada, guitarras altas e bateria pesada. Basicamente, podemos resumir o Sonic Youth nesta música. Descrevê-la é muito difícil porque é inexplicável essa maravilha. Entendo perfeitamente quem não gosta da banda, já que é difícil de entrar mundo musical deles. Mas quando você entra, é possível aproveitar bem clássicos do calibre de "Shoot" – de andamento leve, porém uma guitarra tão pesada que chega a sufocar.

A primeira e única participação de Lee Ranaldo no vocal é na simples e competente "Wish Fulfillment", música que mescla bem o artifício elétrico e acústico dos instrumentos de corda. Pode não parece de início, mas a ótima "Sugar Kane", outro clássico, é sobre Marilyn Monroe, e versos como I'm back again in love, I'm back again a dove/where'd you get your light, your smilin' sugar life/another lovers day, another cracked up night/every night I say, the light is coming mostram a estética bonita de composição usada por Moore em suas letras. O fascinante dessa canção em especial é ter a sensação de término, bem perto dos quatro minutos. Mas ela volta para mais um minuto. E que minuto.



O estilo feroz de cantar de Gordon aparece na ótima para pular e cantar nos shows "Orange Rolls, Angel's Spit", enquanto Moore descasca sem dó todos que gostam da extrema direita em "Youth Against Fascism". Por ser curta, e isso é até uma surpresa, o recado é claro e direto – Ian MacKaye toca guitarra e faz uma participação muito boa. E o cover de Untouchables, chamado "Nic Fit", é tão cru que soa como se tivesse sido gravado em uma sessão única de ensaio.

Com mais de cinco minutos e meio, "On the Strip" é aquele que só um fã muito fã do Sonic Youth consegue acompanhar e curti-la sem perder nenhum detalhe. Parece loucura, mas só é possível gostar se conseguir acompanhar todos os detalhes e nuances da melodia. Pesada, "Chapel Hill" homenageia Bob Sheldon, funcionário da Internationalist Books, assassinado em frente ao local de trabalho. a parte instrumental do meio da canção chama bastante a atenção, assim como a letra densa – o caso está aberto até hoje, pois não encontraram os assassinos de Sheldon.



"JC", outra em homenagem a Joe Cole, é declamada do início ao fim por Gordon de maneira muito triste e amarga, e acaba focando na distorção das guitarras na parte final e fica assim até o fim – uma bonita homenagem, diga-se. A longa parte sem voz de "Purr" é um dos grandes momentos do Sonic Youth no disco, assim como a improvisação de "Crème Brûlèe", flagrada por Lee Ranaldo durante um dos ensaios do grupo no processo de gravação deste álbum, sem dúvida alguma, um dos grandes já feitos nos anos 1990.



Ficha técnica:

Tracklist:

1 - "100%"
2 - "Swimsuit Issue"
3 - "Theresa's Sound-World"
4 - "Drunken Butterfly"
5 - "Shoot"
6 - "Wish Fulfillment"
7 - "Sugar Kane"
8 - "Orange Rolls, Angel's Spit"
9 - "Youth Against Fascism"
10 - "Nic Fit" (Untouchables cover) (Alec MacKaye)
11 - "On the Strip"
12 - "Chapel Hill"
13 - "JC"
14 - "Purr"
15 - "Crème Brûlèe"

Todas as canções foram escritas pelo Sonic Youth, exceto a marcada.

Gravadora: DGC
Produção: Butch Vig e Sonic Youth
Duração: 58min45s

Thurston Moore: vocais e guitarra
Kim Gordon: baixo, vocais e guitarra
Lee Ranaldo: guitarra e vocais
Steve Shelley: bateria

Convidado:

Ian MacKaye: guitarra em "Youth Against Fascism"


Veja também:
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