Discos para história: Rumours, do Fleetwood Mac (1977)


Clássico completou 40 anos no último mês de fevereiro

História do disco

O Fleetwood Mac passou por maus bocados entre o fim dos anos 1960 e início dos anos 1970. Crise criativa, saída de membros da formação original, briga judicial pelo uso do nome... A vida de Mick Fleetwood, Bob Welch e de Christine e John McVie só ganhou um pouco de força quando eles, negligenciados pela gravadora Warner Bros, acabaram deixando o Reino Unido e mudaram-se para Los Angeles. A coisa não melhoraria muito, porque Welch, cansado das disputas judiciais, deixou a banda no final de 1974.

Pela primeira vez em anos, eles estavam sem um guitarrista. Fleetwood foi dar uma sondada no Sound City, famoso estúdio de gravação da região e que, geralmente, era usado pela maioria das bandas famosas por ter uma mesa de gravação das melhores – essa história foi contada no documentário de mesmo nome dirigido por Dave Grohl, vocalista e guitarrista do Foo Fighters, que acabou comprando a mesa e montando um estúdio particular em casa, local de gravação do disco Wasting Light (2011).

Em um desses momentos mágicos da vida, Keith Olsen, engenheiro de som, estava tocando a fita do disco Buckingham Nicks (1973). Fleetwood gostou e pediu para conhecer o guitarrista daquela gravação. Foi nesse dia que ele conheceu Lindsey Buckingham, que estava no estúdio trabalhando em mais material para um futuro disco. Empolgado com aquele cara, logo rolou o convite para substituir Welch na banda. Buckingham não pensou duas vezes: ele topava, mas só se sua companheira de duo, Stevie Nicks, também fosse convidada. Fleetwood não se opôs e os dois entraram no Fleetwood Mac a poucos dias de começar 1975.

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Nesse mesmo ano, eles lançaram um bom trabalho, que levou o nome da banda e os recolocaram na vista dos olhos do público. Os singles "Rhiannon", "Over My Head" e "Say You Love Me" fizeram muito sucesso e ajudaram o registro a ficar 37 semanas no top-10 e impressionantes 50 meses no top-40 da lista dos mais vendidos. Isso deu a eles seis meses sem parar na estrada, emendando um show atrás do outro sem descanso. Isso acabou desgastando a relação entre Christine e John, que se divorciaram seis anos depois do casamento; Buckingham e Nicks tinham relação de idas e vindas, mas terminaram em definitivo quando começaram a trabalhar no disco; Fleetwood descobriu que sua mulher teve um caso com seu melhor amigo. Foram muitos os momentos tristes e frustrantes nas vidas pessoais deles junto no ano de renascimento da banda.

"A música era maravilhosa, mas também foi autêntica porque eram dois casais rompendo e escrevendo uns com os outros. Também era atraente porque estávamos nos preparando para seguir nossas vidas. Então, você tinha que viver em negação, tinha que aprender a compartilhar suas emoções para fazer o disco. Todo mundo virou um pouco observador do outro", disse Buckingham, em entrevista à revista 'Rolling Stone', em 2013.

"A maioria das pessoas, quando se separam, não vê um ao outro por um tempo. Você não espera encontrar essa pessoa. Em nossa situação, as separações estavam acontecendo, e tivemos que trabalhar no dia seguinte. Foi muito difícil. Você tinha que entrar com a cabeça erguida e o coração aberto. Nós tínhamos que estar muito concentrados, e sabíamos disso porque, não importa o quão difícil era para nós - e era horrível - nós ainda queríamos fazer um grande disco. Ninguém iria dizer, OK, vou desistir", contou Nicks, na mesma entrevista. "Você sabia que ia ao estúdio às 2h da tarde, que estaria lá até as 3h ou 4h da manhã e não poderia ficar olhando seu ex-marido. Você tinha que ser um adulto. Embora houvesse milhares de pessoas ao nosso redor dizendo para fazer isso ou aquilo, ainda tínhamos que nos reunir como um grupo e dizer: 'Nós não vamos deixar isso nos bater'", completou.

Em fevereiro de 1976, a banda se juntou no Record Plant Studio, na Califórnia, para iniciar os trabalhos do novo álbum. Mas, como a situação toda envolvendo o grupo previa, não foi uma gravação fácil. Não havia socialização no estúdio ou qualquer momento de brincadeira. Era apenas trabalho, fileiras de cocaína, noites sem dormir e muito tempo ocioso – como o dinheiro era vasto nas gravadoras naquela época, e o Fleetwood Mac veio de um sucesso enorme, não se importaram muito em abrir as torneiras a cada nova pedida de dinheiro.

Uma hora a coisa iria apertar. E apertou mesmo, porque eles tinham muito pouco para mostrar. O que acabou salvando o trabalho foi a ideia de eles precisarem de união, se não o trabalho não seria concluído nunca. Então, melhor do que cada um fazer o seu, era melhor todos se unirem pelo mesmo objetivo – por mais doloroso que fosse. Buckingham e Nicks foram os primeiros a trilhar esse caminho, com o guitarrista conseguindo musicar com sucesso algumas das letras da vocalista. A coisa começou a andar, ainda que John McVie e Mick discutissem aqui e ali sobre as composições.

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Quando todo material estava pronto, eles fizeram uma apresentação para testar as novas faixas ao vivo. Aprovadas pelo público, elas estavam para entrar na fase final de mixagem quando um problema apareceu nas fitas. Ken Caillat, Richard Dashut, Buckingham, Fleetwood e John McVie trabalharam duro no overdubbing por conta do uso em excesso da mesma fita, o que danificou parte do material. Um especialista precisou ser contratado para tentar salvar o disco. No fim, deu tudo certo. Quando eles ouviram o material pronto, a sensação era de ter algo grande nas mãos.

Uma campanha de marketing agressiva aliada ao lançamento "Go Your Own Way" como primeiro single colocaram o Fleetwood Mac em uma posição inédita na história da gravadora: foram 800 mil pedidos antecipados pelo disco, então o recorde da Warner. Lançado em 4 de fevereiro de 1977, o disco demorou um pouco para andar na mão do público, mas ganhou força no lançamento de "Dreams" como segundo single. Acabou chegando ao topo das paradas, aclamado pela crítica e considerado o melhor registro da história do grupo.



Resenha de Rumours

O disco começa com a ótima "Second Hand News". Feita para dançar, apesar de dar a deixa da temática do álbum: a separação dos casais ao longo do processo de composição. A faixa foi composta de um jeito mais lento, mas Lindsey Buckingham queria, segundo ele mesmo, dar um estilo mais disco music. E, aos poucos, ele foi conseguindo fazer isso no estúdio longe dos outros – Buckingham chegou a gravar o baixo, coisa que John McVie não levou muito bem e acabou regravando do seu jeito sem descaracterizar a ideia do compositor.

Depois de virar segundo plano para o amor perdido, "Dreams" surge como uma das duas poderosas faixas do álbum. Composta por Steve Nicks, ela tem exatamente as características melódicas e um tipo bem específico de vocal que a fizeram ser uma cantora de respeito e sucesso no meio. A letra nasceu depois de mais um dia de tédio no estúdio, então Nicks perguntou se tinha um lugar com piano para tentar fazer alguma coisa. Dias depois, ela chamou Ken Caillat para ouvir e dar uma opinião sobre a faixa. Encantado, o engenheiro de som praticamente arrastou o equipamento de gravação até a sala e pediu a repetição, só que ela nunca mais conseguiu o mesmo tom emocional da primeira vez.



Mais uma de Buckingham inspirada na música folk, "Never Going Back Again" tem uma melodia difícil acompanhada de uma letra bem simples sobre o fim de um relacionamento. A seguinte, "Don't Stop", também toca no mesmo assunto, mas tem a mensagem de seguir em frente e não parar no passado – o refrão (Don’t stop thinking about tomorrow/ Don’t stop, it’ll soon be here/ It’ll be better than before/ Yesterday’s gone, yesterday’s gone) deixa isso mais evidente.

Outro petardo de Buckingham sobre o fim do namoro com Nicks é "Go Your Own Way", em que ele está naquela fase de não querer ver a ex-amada nem pintada de ouro e pede a ela para seguir seu próprio caminho. Nicks diz que é uma canção muito dolorida para cantar, mas, como os fãs gostam, ela não pediu para tirá-la do repertório. A lindíssima "Songbird" fala sobre os sacríficios feitos pelo amor e é um ótimo encerramento para o lado A do disco.

E o lado B abre com a paulada "The Chain", única faixa com a composição dos cinco membros da banda. Ela fala sobre as correntes (o grupo) que mantêm todos ali mesmo passando por momentos terríveis em suas vidas pessoais, e o verso And if you don't love me now/ You will never love me again/ I can still hear you saying you would never break the chain (Never break the chain)/ And if you don't love me now/ You will never love me again/ I can still hear you saying you would never break the chain (Never break the chain) resume bem a clima de trabalho naqueles dias.



O clima alivia um pouco em "You Make Loving Fun", a mais otimista de todo LP ao tratar do recomeço em novo relacionamento, já a balada country "I Don't Want to Know" também ajuda a dar uma animada em um disco tão pesado emocionalmente. A melancolica bate à porta em "Oh Daddy", uma dolorida faixa sobre não ter força suficiente para abandonar um relacionamento, mesmo com imensa vontade de fazê-lo. E a última, "Gold Dust Woman", de Steve Nicks, é um resumo da situação da banda na gravação: um amontoado de traumas e cocaína, e como fazer o disco era difícil. A vontade era de pegar os pedaços e ir para casa, porque não havia nada além de uma mulher pálida e sem rumo na vida.

É um disco muito profundo e cheio de lições sobre a vida. Imaginem só o clima para gravá-lo? O fim de uma paixão rende bons álbuns, mas aqui era algo completamente novo, porque quatro dos cinco membros tiveram que gravar com seu ex-marido ou ex-mulher. Deve ter sido muito duro, mas saiu um dos melhores registros dos anos 1970.



Ficha técnica

Tracklist:

Lado A

1 - "Second Hand News" (Lindsey Buckingham) (2:56)
2 - "Dreams" (Stevie Nicks) (4:14)
3 - "Never Going Back Again" (Buckingham) (2:14)
4 - "Don't Stop" (Christine McVie) (3:13)
5 - "Go Your Own Way" (Buckingham) (3:38)
6 - "Songbird" (C. McVie) (3:20)

Lado B

7 - "The Chain" (Buckingham, Mick Fleetwood, C. McVie, John McVie, Nicks) (4:30)
8 - "You Make Loving Fun" (C. McVie) (3:31)
9 - "I Don't Want to Know" (Stevie Nicks) (3:15)
10 - "Oh Daddy" (C. McVie) (3:56)
11 - "Gold Dust Woman" (Nicks) (4:56)

Gravadora: Warner Bros.
Produção: Fleetwood Mac, Ken Caillat e Richard Dashut
Duração: 39min43s

Lindsey Buckingham: guitarra, violão, dobro, percussão e vocais
Stevie Nicks: vocais
Christine McVie: teclado, piano e vocais
John McVie: baixo
Mick Fleetwood: bateria, percussão e cravo



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