Discos para história: Gal Costa, de Gal Costa (1969)


Trabalho foi a primeira gravação solo da cantora

História do disco

Maria da Graça Costa Penna Burgos, nascida em 26 de setembro de 1945, tornou-se uma das grandes cantoras da história da música popular brasileira. Com o "spoiler" no título do texto, nem preciso fazer qualquer mistério sobre de quem estou falando. Gal Costa foi um dos nomes mais importantes do Tropicalismo, mas só teve seu primeiro disco solo lançado em 1969.

A história de Gal com a música começa ainda na barriga da mãe. Segundo contam, ela ficou uma grande parte da gravidez ouvindo música clássica para fazer com que a criança se interessasse por música. Bom, funcionou. Aos 14 anos, ela foi trabalhar na loja de discos mais famosa de Salvador para ficar mais perto dos ídolos -- quando ela ouviu a canção "Chega de Saudade", de João Gilberto, pela primeira vez, apaixonou-se pelo cantor.

Mais discos dos anos 1960:
Discos para história: Bookends, de Simon & Garfunkel (1968)
Discos para história: Avanço, do Tamba Trio (1963)
Discos para história: Night Life, de Ray Price (1963)
Discos para história: O Inimitável, de Roberto Carlos (1968)
Discos para história: A Girl Called Dusty, de Dusty Springfield (1964)
Discos para história: Magical Mystery Tour, dos Beatles (1967)

Amiga de infância de Sandra e Andréia Gadelha, acabou apresentada ao então jovem Caetano Veloso por Andréia, a namorada do aspirante a cantor e compositor. Isso era 1963. No ano seguinte, em 22 de agosto, ela estreou profissionalmente nos palcos ao lado de Caetano, Gilberto Gil, Maria Bethânia e Tom Zé, entre outros, na inauguração do Teatro de Vila Velha. Ainda demoraria alguns meses, mas o caminho para ser cantora estava traçado -- ao menos na cabeça.

O que ajudou foi o sucesso da apresentação de Bethânia com o show Opinião, ao lado de Zé Kéti e João do Vale. Ela substituiu Nara Leão no show nascido para funcionar como resistência à ditadura militar, que colocou o Centro Popular de Cultura da UNE (CPC) na ilegalidade logo após o golpe. A primeira gravação aconteceu em 1965, um compacto com as músicas “Sim, Foi Você”, de Caetano e “Eu Vim da Bahia” de Gil. No ano seguinte, participou do 1º Festival Internacional de Música, da TV Rio, apresentando "Minha Senhora", escrita por Gil e Torquato Neto, mas não ficou entre as melhores.


O primeiro disco lançado pela cantora foi em parceria com Caetano. Chamado "Domingo" (1967), produzido por Dori Caymmi, em que lado bossa nova da dupla era o grande destaque. Mas isso mudou quando as influências de fora começaram a ganhar força no grupo tropicalista, principalmente em Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Influenciada pelos amigos tropicalista, Gal Costa absorveu muito de alguns dos artistas de sucesso na Inglaterra e nos Estados Unidos. O que era visto como uma maneira de controlar os jovens por alguns que eram contra, vide Marcha contra a Guitarra Elétrica, para esse grupo era fundamental saber o que estava acontecendo lá fora. A cantora foi muito influenciada por Janis Joplin e Jimi Hendrix, dois dos grandes nomes da cena psicodélica surgida no fim dos anos 1960.

Em 1968, ela foi uma dos vários participantes do hoje clássico "Tropicália ou Panis et Circenses". Nesse disco ela gravou quatro músicas, com destaque para "Baby", de Caetano, um clássico da carreira de Gal. Em novembro, participou do 4º Festival de Música da Rede Record, interpretando "Divino Maravilhoso", de Gil e Caetano. A música também se tornou um hit nacional e um clássico instantâneo.

Veja também:
Discos para história: Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira, de Moraes Moreira (1979)
Discos para história: Amor de Gente Moça, de Sylvia Telles (1959)
Discos para história: Out of Time, do R.E.M. (1991)
Discos para história: Hot Fuss, do Killers (2004)
Discos para história: Raising Hell, do Run-D.M.C. (1986)
Discos para história: Yellow Submarine, dos Beatles (1969)

Nesse mesmo ano, Caetano e Gil foram presos pela ditadura militar, e acabou sendo Gal a carregar a bandeira do tropicalismo até o fim do movimento, no início da década seguinte. O clima estava tão tenso e estranho, que o primeiro disco solo da cantora acabou sendo adiado para 1969.

Bem recebido pela crítica da época, o primeiro disco solo de Gal Costa é considerado um dos melhores trabalhos daquela década e não só reafirmou a força do Tropicalismo, mas também deu as asas necessárias para a cantora voar sozinha na carreira solo como uma das mais brilhantes interpretes da música brasileira.


Resenha de "Gal Costa"

O álbum abre com "Não Identificado" que, dentro de uma proposta psicodélica com raiz no Brasil, mistura um pouco da influência de lá e cá. Esse, quase literalmente, é o encontro de Caetano Veloso com os Mutantes. Cheia de referências a vida deles naquele momento, é uma abertura bem melancólica com uma ótima interpretação vocal. A segunda faixa do LP é "Sebastiana", um forró escrito pelo pernambucano Rosil Cavalcanti, um dos grandes compositores nordestinos de todos os tempos. Aqui, a canção ganhou um tratamento mais experimental e se adequou aos tropicalistas.

"Lost in the Paradise" nasceu de um Caetano que mal falava inglês, mas sentia-se um pouco oprimido pelos termos de língua estrangeira que estavam tomando conta das conversas das pessoas. Longe de ser a melhor faixa do disco, logo dá para esquecê-la quando surge "Namorinho de Portão". Típica peça de Tom Zé, é simples e bem fácil de cantar junto.


Homenagem para o movimento bossa nova, "Saudosismo" poderia ter feito parte do disco de Gal com Caetano dois anos antes. A premissa é a mesma, apesar de a onda do gênero que mostrou o Brasil ao mundo estar cada vez mais em baixa desde o meio dos anos 1960. Para fechar o lado A, "Se Você Pensa", clássico composto por Erasmo e Roberto Carlos, ganha uma versão poderosa na voz de Gal e mantém a influência do R&B norte-americano.

Se o lado A termina com Roberto e Erasmo, o lado B começa com a dupla. "Vou Recomeçar" e sua inegável pegada da Jovem Guarda, morou? Depois aparece o clássico "Divino, Maravilhoso", faixa de ar experimental que mostra toda inventividade dos tropicalistas em querer mexer no já estabelecido. É uma letra muito poderosa ao protestar contra a ditadura só usando elementos do cotidiano. É uma das canções mais brilhantes já feitas no Brasil -- e a interpretação de Gal é única.



"Que Pena (Ele Já Não Gosta Mais de Mim)" é outro clássico neste trabalho. Composta por Jorge Ben antes do Jor, a gravação tem na parceria com Caetano Veloso um bom opositor para a voz da cantora. E, claro, funciona muito bem. A parceria segue em "Baby", uma letra muito simples e muito bonita, mas aqui é possível destacar a escolha dos arranjos e dos instrumentos usados. Existe toda uma introdução instrumental de pouco menos de um minuto até a entrada do vocal. Isso faz toda diferença.

O arranjo feliz de "A Coisa Mais Linda Que Existe" mostra que, antes de tudo, o jovem é um romântico. É uma bonita balada que antecede o fim do disco, finalizado com "Deus é o Amor", uma faixa de tom gospel composta por Jorge Ben ao seu melhor estilo.

Todo mundo que gosta dessa nova fase de Gal Costa precisa ouvir o disco. Basicamente, tudo começou aqui. Ao chegar no primeiro trabalho solo com a experiência de ter gravado dois discos antes, ela chegou com tudo e não estava para prosa. Colocou todo potencial para fora em um dos melhores álbuns da carreira.



Ficha técnica

Tracklist:

Lado A

1 - "Não Identificado" (Caetano Veloso) (3:13)
2 - "Sebastiana" (Rosil Cavalcanti) (2:26)
3 - "Lost in the Paradise" (Caetano Veloso) (2:51)
4 - "Namorinho de Portão" (Tom Zé) (2:32)
5 - "Saudosismo" (Caetano Veloso) (3:11)
6 - "Se Você Pensa" (Roberto Carlos, Erasmo Carlos) (3:16)

Lado B

1 - "Vou Recomeçar" (Roberto Carlos, Erasmo Carlos) (3:26
2 - "Divino, Maravilhoso" (Caetano Veloso, Gilberto Gil) (4:23)
3 - "Que Pena (Ele Já Não Gosta Mais de Mim)" (Jorge Ben) (3:42)
4 - "Baby" (Caetano Veloso) (3:30)
5 - "A Coisa Mais Linda Que Existe" (Gilberto Gil, Torquato Neto) (4:01)
6 - "Deus é o Amor" (Jorge Ben) (2:52)

Gravadora: Philips
Duração: 38min28s
Produção: Manoel Barenbein

Gal Costa: voz

Convidados:

Lanny Gordin: arranjos e direção musical
Rogério Duprat: arranjos nas faixas 1, 3, 5, 9, 10, 11 e direção musical
Jards Anet da Silva: violão
Rodolpho Grani Júnior: baixo
Diogenes Burani Filho e Eduardo Portes de Souza: bateria
Alexander Gordin: guitarra e baixo
Caetano Veloso: violão e voz em "Que Pena" e "Baby"
Gilberto Gil: voz e violão em "Sebastiana" e "Namorinho do Portão"; arranjos e direção musical



Siga o blog no Twitter e no Facebook e assine o canal no YouTube. Compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!

Saiba como ajudar o blog a continuar existindo

Gostou do post? Compartilhe nas redes sociais e indique o blog aos amigos!

Continue no blog: