Discos para história: American Idiot, do Green Day (2004)


A 123ª edição da seção fala do segundo grande sucesso da carreira do Green Day. No auge da Guerra no Iraque, a banda conseguiu traduzir bem os Estados Unidos naquele momento

História do disco

Até a gravação de American Idiot, muita coisa aconteceu com o Green Day. Por exemplo, as masters do trabalho que chegou a ter nome – Cigarettes and Valentines – foram roubadas do estúdio já praticamente finalizadas. Isso frustrou muito a banda por algum tempo. Rumores sobre um novo álbum e até uma pausa nas atividades foram divulgados, mas nenhum foi efetivamente confirmado até eles pedirem três meses para refazer tudo.

Certas coisas acontecem em nossas vidas para mostrar o caminho certo. No caso do Green Day, um trio veterano e consagrado com algumas músicas e com o álbum Dookie, a perda das masters acabou sendo algo positivo. Em uma brincadeira entre Billie Joe Armstrong, Mike Dirnt e Tré Cool, nasceu "Homecoming" – devidamente guardada para não perdê-la. Depois veio "Jesus of Suburbia". E foi quando eles perceberam, em duas canções com mais de nove minutos, que estavam fazendo uma espécie de ópera-punk. Havia uma história, mas qual?

Eles definiram o tema do trabalho quando Armstrong apareceu no estúdio com a letra pronta de “American Idiot”. O disco seria um épico sobre como o jovem atual e raivoso via a Guerra do Iraque, com muitos deixando juventude e amigos para combater. O produtor Rob Cavallo gostou da ideia e encorajou o trio a fazer canções longas e amarrassem tudo dentro de uma grande história de início, meio e fim ao melhor estilo The Who.


Antes de ir ao estúdio em definitivo, Armstrong pediu alguns dias de folga, transformados em longas caminhadas por Nova York. Foi nesse período que nasceram algumas canções e a ideia da dualidade entre os momentos felizes e os de raiva. Ele também teve a ideia de mudar o ritmo de gravação da banda: primeiro, seriam as guitarras, depois do resto; segundo, nenhuma música seria iniciada até completar o trabalho da anterior. Por ser um trabalho difícil e feito pela primeira vez no Green Day, foco era fundamental.

No total, entre o trabalho aproveitado e jogado no lixo, eles levaram dez meses para lançar o disco e gastaram mais de US$ 650 mil. Em entrevista ao site Jade in Chicago, Tré Cool fez um resumo. “O álbum é como uma espécie de linha do tempo da sua vida. Dependendo de onde você esteja, você provavelmente se encaixa em algum lugar. "Holiday" é a fase da pré-partida, "Give Me Novacaine" é a fase das drogas e "Extraordinary Girl" é a fase do romance. Todos esses diferentes estágios da vida mostram que os caminhos que você escolhe irão levá-lo em algum lugar. Não é necessariamente o final mais feliz do mundo, mas é bastante realista”, contou.

Lançado em 20 de setembro de 2004, American Idiot é considerado o melhor disco do Green Day, pelas letras sofisticadas e por não abandonar o passado – eles acrescentarem influências ao já conhecido punk. Também bem recebido pelo público, é o álbum mais vendido da banda até o momento. Apesar de recente se comparado aos grandes clássicos, muitos consideram fundamental para entender a primeira década dos anos 2000.


Resenha de American Idiot

Declaradamente sobre a Guerra no Iraque e como a mídia tratou o assunto, "American Idiot" virou uma das faixas mais populares do Green Day nos últimos anos – no patamar dos clássicos. Ao melhor estilo desenvolvido pela banda – dá para ouvir a participação do trio em todos os momentos –, é um ótimo começo para álbum por não deixar o fã mais antigo na mão. E ela fica ainda melhor ao vivo.



Ao abrir o álbum com o pano de fundo da história, eles deixaram "Jesus of Suburbia" para contar a história do protagonista. O anti-herói Jimmy tem sua vida contada no épico de mais de nove minutos. A canção varia muito o tom ao ir da raiva a felicidade – um claro exemplo de que pessoas foram a inspiração das músicas do trabalho. Mais raivosa pouco antes da segunda metade, ganha o grito libertador – quase um dia de fúria. Até o fim, tudo muda muito rápido no desenvolvimento, uma aula de como se fazer uma ópera-rock.



"Holiday" dialoga e critica diretamente o Partido Republicano, e Billie Joe Armstrong o acusa de manipular as massas para concordarem com certas medidas que seriam impopulares em qualquer outro governo e/ou momento. Além de tratá-lo como racista e homofóbico. Já "Boulevard of Broken Dreams" trata do drama e reflexão do personagem principal, que caminha sozinho na estrada dos sonhos despedaçados desejando ser encontrado por alguém enquanto reflete sobre sua vida.

A delicada "Are We the Waiting" é sobre a tensão de ser ou não chamado para guerra. E os demônios internos atacam, fazendo o protagonista gritar por dentro por saber o destino solitário que o espera. Ele gritou tanto, se rebelou e se rebatizou: agora é "St. Jimmy", o filho de uma prostituta com Edgar Allen Poe que vive de maconha, miojo e cigarros. Aqui, o Green Day mostra outro lado do protagonista em uma faixa muito forte – outra de extremo sucesso ao vivo.



Em uma viagem muito própria pelo uso intenso de drogas, Jimmy está se drogando com sua amada na ótima "Give Me Novacaine", e ela deseja muito ficar com ele a qualquer custo – inclusive em um estado total alienação com o mundo. A namorada, chamada de Whatsername, também tem seu momento rebelde na narrativa ("She's a Rebel"), além de ser tudo que ele sempre sonhou ("Extraordinary Girl"). Canções diferentes, mas com total sentido da forma como elas foram ordenadas.

"Letterbomb" é o momento em que Jimmy se dá conta de que vivia em um mundo de ilusões. Ele ficou tão dentro de uma bola que não percebeu seus amigos partindo. O verso You're not the Jesus of Suburbia/The St. Jimmy is a figment of/Your father's rage and your mother's love/Made me the idiot America é muito certeiro ao desmontar tudo em que o ouvinte acreditava na história até aqui. Única completamente fora da história, a balada "Wake Me Up When September Ends" é sobre a morte do pai de Billie Joe Armstrong em 1982 em decorrência de um câncer. Na divulgação do disco, o clipe acabou unindo a canção ao resto do álbum.

O protagonista perde o amor de sua vida em "Homecoming", sendo a única em que Mike Dirnt e Tré Cool participam como vocalistas principais – justamente nas letras que eles escreveram. O fim ("Whatsername") fala de como as coisas caminharam e de como é importante aceitar a vida como ela é, com arrependimentos e graças, um grande final para um dos melhores discos dos anos 2000.



Ficha técnica:

Tracklist:

1 - "American Idiot" (2:54)
2 - "Jesus of Suburbia" (9:08)
I. "Jesus of Suburbia" (1:51)
II. "City of the Damned" (1:51)
III. "I Don't Care" (1:43)
IV. "Dearly Beloved" (1:05)
V. "Tales of Another Broken Home" (2:38)
3 - "Holiday" (3:52)
4 - "Boulevard of Broken Dreams" (4:20)
5 - "Are We the Waiting" (2:42)
6 - "St. Jimmy" (2:56)
7 - "Give Me Novacaine" (3:25)
8 - "She's a Rebel" (2:00)
9 - "Extraordinary Girl" (3:33)
10 - "Letterbomb" (4:05)
11 - "Wake Me Up When September Ends" (4:45)
12 - "Homecoming" (9:18)
I. "The Death of St. Jimmy" (2:24)
II. "East 12th St." (1:38)
III. "Nobody Likes You" (Mike Dirnt) (1:21)
IV. "Rock and Roll Girlfriend" (Tré Cool) (0:44)
V. "We're Coming Home Again" (3:11)
13 - "Whatsername" (4:14)

Gravadora: Reprise
Produção: Rob Cavallo
Duração: 57:12

Billie Joe Armstrong: vocal e guitarra
Mike Dirnt: baixo, vocal de apoio e vocal principal em "Nobody Likes You"
Tré Cool: bateria, percussão, vocal de apoio e vocal principal em "Rock and Roll Girlfriend"

Convidados:

Rob Cavallo: piano
Jason Freese: saxofone
Kathleen Hanna: vocal de apoio em "Letterbomb"



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