Crítica: Soccer Mommy - Evergreen

O crescimento pessoal e profissional é, muitas vezes, um enorme processo doloroso e cheio de marcas cravadas para eternidade. Muitos artistas que passam pela perda, usam a música para desabafar e, de uma forma ou outra, acabam eternizando esse momento para sempre nas próprias discografias. Vinda de um momento ruim, a guitarrista Sophie Allison fez de “Evergreen”, quarto álbum de estúdio do projeto musical Soccer Mommy, um desabafo sobre toda essa situação.

Quando “M” foi escolhida como primeiro single do trabalho pela gravadora, a própria cantora se surpreendeu, mas foi certeira ao apresentar o álbum apropriadamente ao público logo de cara (“And I don't mind spending time on a lie/ But it's taking all I have to give/ And in my dreams, I'm still not free/ I feel those hands around my neck/ Like the truth is killing me”). A produção intimista acaba sendo ideal para captar toda essa angústia, presente na reflexiva abertura chamada “Lost”, de arranjos e vocais extremamente delicados.

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Perto das outras, “Driver” soa mais solar ao falar do amor presente, apesar dos defeitos da outra pessoa. Lançada como segundo single, equilibra as coisas em um ponto de vista interessante entre a melancolia causada pelos problemas e ter alguém ao lado para amparar. E a busca pela leveza em meio ao caos segue em“Some Sunny Day”, de vocal preguiçoso e instrumentos desleixados — não é nada ruim e traz certo charme à faixa. Mas o apego ao passado e o medo da mudança surgem em “Changes”, escrita ainda no trabalho de composição do álbum anterior, “Sometimes, Forever”, de 2022, e trabalhada para ser acompanhada no violão e cheia de efeitos.

Como uma pessoa que cresceu com computadores à disposição, Allison gosta de jogos. Precisamente Stardew Valley, um jogo em que você precisa cuidar de uma fazenda. E uma das personagens que dá para casar é Abigail, nome da sexta faixa do álbum. Nascida em uma brincadeira com o nome e as situações do jogo, a canção acabou ganhando corpo ao falar sobre alguém que você ama e sabe tudo sobre ela (“I know all of your favorite things/ Chocolate cake and shooter games/ And making music in the rain/ When no one is around”).

A balada “Thinking of You” pode fazer chorar qualquer pessoa mais sensível ao falar de lembranças repentinas que voltam do nada. E se “Salt in Wound” foi escrita para falar de sensações sufocantes quando ela estava de cama com COVID em um retorno às origens das letras simples e mais diretas com teor adolescente, “Salt in Wound” tem um ar retrô, meio anos 1990, e também apela ao lado mais simplório da discografia.

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“Anchor” tem um quê de PJ Harvey, uma coisa meio rock, meio experimento musical, misturada com outras coisas esquisitas em um clima meio estranho. Enfim, é ótima. A nota final vem com a faixa-título, de sentimento agridoce e com Allison no violão e acompanhada por um conjunto de cordas, ajudando a colocar a harmonia em perspectiva em uma letra melancólica sobre um sentimento que não sai e pode ser qualquer um (“And in the light of day, I only see what's gone/ Although the sun remains, not evergreen”).

Mais perto dos 30 anos do que dos 20, Sophie Allison refina o próprio trabalho em composições melancólicas, de tom muito pessoal e cheias de recursos musicais para incrementar harmonias e melodias, cada vez mais complexas e com várias novidades. Das grandes novidades da música nos últimos cinco anos, ela vira certeza com um desses álbuns para mudar de patamar. E, tomara, de vida.

Ficha técnica

Tracklist:

1 - “Lost”
2 - “M”
3 - “Driver”
4 - “Some Sunny Day”
5 - “Changes”
6 - “Abigail”
7 - “Thinking of You”
8 - “Dreaming of Falling”
9 - “Salt in Wound”
10 - “Anchor”
11 - “Evergreen”

Gravadora: Loma Vista
Produção: Ben H. Allen
Duração: 41min25

Avaliação: ótimo

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