Crítica: Hallelujah - Leonard Cohen, Uma Jornada, Uma Canção, de Daniel Geller e Dayna Goldfine

“Hallelujah” foi composta por Leonard Cohen ao longo de sete anos. Entre os mais de 150 versos espalhados em vários cadernos, o músico canadense dedicou-se ao máximo para refinar a letra até chegar ao resultado desejado em 1984, para gravação do álbum “Various Positions”, mas nenhum conseguiu o sucesso esperado naquele momento. Quase duas décadas depois, a canção virou um grande fenômeno cultural. É essa jornada que os diretores Daniel Geller e Dayna Goldfine contam em “Hallelujah - Leonard Cohen, Uma Jornada, Uma Canção”, disponível no Prime Video.

Dá para dividir o longa em três partes. A primeira abrange a carreira de Cohen, os sucessos e o método de composição por meio de longas entrevistas feitas pelo jornalista e escritor Larry Sloman para ‘Rolling Stone’ durante vários anos. São várias horas de fitas com afirmações importantes ao ponto de Dominique Issermann, namorada do cantor nos anos 1980, em determinado ponto, falar “ele sabe disso muito mais do que eu”.

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Cohen começou tarde na música, com mais de 30 anos, após uma carreira bem-sucedida na literatura canadense ao ponto de conseguir os prêmios mais importantes do país ainda muito jovem. Ao entrar na música, sofreu preconceito de donos de gravadoras pela idade, mas conseguiu o apoio da cantora Judy Collins e partiu para uma longa carreira de sucesso com 14 álbuns de estúdio e apresentações épicas na parte final, quando, perto dos 80 anos, cantava mais de três horas por noite.

O longa segue contando ótimas histórias, como da desastrosa parceria com Phil Spector, como ele ficou sem falar com um antigo produtor por oito anos e ligou como se nada tivesse acontecido e quando largou tudo para passar sete anos em um monastério budista — sempre com bons depoimentos de quem foi testemunha dos acontecimentos, como o injustiçado produtor John Lissauer. Foi justamente quando o disco “Various Positions” não fez sucesso, que ele começou a se questionar sobre o próprio talento e intensificou a busca pela espiritualidade, algo sempre presente nas músicas e na vida pessoal.

Na segunda parte, começa a peregrinação de “Hallelujah” rumo ao sucesso. Para começar, Cohen modificou a letra e passou a cantá-la de outro jeito, a dividindo em Velho (versão do disco) e Novo Testamento (versão dos shows). Quem primeiro mostrou o potencial da canção foi Bob Dylan, o primeiro a fazer um cover em duas apresentações em 1988 e depois foi John Cale, com uma versão completamente diferente das três anteriores, em uma compilação em homenagem ao poeta já no início dos anos 1990. Mas foi Jeff Buckley, a partir do cover de Cale, que colocou a música no imaginário das pessoas no álbum “Grace”, de 1994. 

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A partir do início dos anos 2000, o mundo viu uma espécie de Hallelujah-mania. Artistas de diversos gêneros, participantes de reality shows, músicos de rua e cantores amadores começaram a tratar a canção como algo divino, uma dádiva dos céus. Enquanto isso, Cohen descobria estar sendo roubado pela empresária e, uma década após deixar os palcos, precisava voltar à ativa para conseguir juntar dinheiro novamente para ter uma boa aposentadoria. Pode parecer estranho, porém ele estava melhor do que nunca com mais de 70 anos.

A última parte amarra todas as pontas em uma grande homenagem ao momento mais criativo da carreira dele, com uma série de ótimos discos de estúdios, apresentações lotadas em vários lugares do mundo, capas de revistas e uma devoção de gerações diferentes que poucos artistas tiveram ao longo da carreira.

Como ele mesmo disse, era difícil ensinar truques novos a um cachorro velho. E também era difícil prever que uma música, lançada em um álbum que quase ninguém ouviu na época, seria tão importante e tão significativa nas últimas décadas nas mais diferentes versões. Para o bem e para o mal, “Hallelujah” acaba sendo o legado de Leonard Cohen para as próximas gerações e tem a história contada tão bem nesse documentário. É incrível ver como acesso a material de qualidade, gente com vontade de falar e uma boa edição conseguem entregar. O Brasil tem muito para aprender com documentários assim.

Avaliação: ótimo

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