Crítica: Under The Volcano, de Gracie Otto

George Martin foi um desses magos da produção em que, com talento, paciência e experiência, ajudou a traduzir os pensamentos musicais de um certo quarteto de Liverpool chamado Beatles. Quando a banda encerrou as atividades, o produtor também resolveu partir para carreira solo ao abrir estúdios de gravação em Londres... e na ilha de Montserrat.

Localizada a sudeste de Porto Rico e a sudoeste da ilha de Antígua, a pequena ilha de 16 km de comprimento e 11 km de largura foi o paraíso encontrado por Martin, inspirado pelo uso de estúdios na Jamaica por artistas famosos nos anos 1970, para levar um equipamento de produção de alto nível e tirar os artistas das distrações diárias do dia a dia. É essa história que Gracie Otto conta no documentário "Under The Volcano", disponível atualmente no Star+, serviço de streaming da Disney. 

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Martin e o sócio John Burgess tinham o intuito de levar a experiência de ambos para outros artistas e, em 1965, fundaram a Associated Independent Recording (AIR). Cinco anos depois, o estúdio começou funcionar de fato, em Londres, conseguindo bastante sucesso com, por exemplo, "Meddle", do Pink Floyd, "Sheer Heart Attack", do Queen, "For Your Pleasure", do Roxy Music e a trilha sonora do filme "007: Viva e Deixe Morrer", do próprio Martin com a música-tema de Paul McCartney, sendo gravados lá.

Com o sucesso do estúdio, o produtor começou a viajar para o Caribe e conheceu a ilha de Montserrat, lugar pelo qual se apaixonou e passou a considerar praticamente um segundo lar. E teve a ideia de montar um segundo estúdio nesse lugar completamente isolado, que receberia alguns dos artistas mais famosos do mundo ao longo de uma década de funcionamento.

"Under The Volcano" aborda esse momento fascinante da música com depoimentos de quem trabalhou no estúdio e participou ativamente do local. De músicos famosos a funcionários locais, a construção do documentário passa por essas pessoas importantes não só na indústria, mas moradores que conviveram com essas pessoas. E as histórias são maravilhosas.

De Elton John passando horas no bar pagando bebidas para todos que entrassem até Stevie Wonder tocando por quatro horas durante uma noite (e alguém gravou isso) até as gravações de álbuns históricos, o local idílico funcionava como vetor de criatividade e relaxamento por músicos, 100% focados em criar os melhores trabalhos possíveis com uma equipe de primeira. O Dire Straits fez os melhores discos da carreira lá, incluindo "Brothers in Arms", o primeiro a ser feito 100% digitalmente; "Tugs of War", de Paul McCartney, foi gravado na ilha e ele levou Ringo Starr, Linda, os filhos e a banda inteira. Mas as melhores histórias são as dos ex-integrantes do Police que, 40 anos após o fim da banda, ainda guardam rancor das brigas e momentos ruins, gerando ótimas risadas.

Logo após a gravação do álbum de retorno dos Rolling Stones, "Steel Wheels", de 1989, um furacão passou e destruiu tudo, incluindo a estrutura do estúdio. Com a melhora da tecnologia, reorganização das gravadoras e aperto do orçamento, um lugar de gravação em uma ilha caribenha isolada do resto do mundo não fazia mais sentido. Assim, Martin recolheu os equipamentos e fechou o lugar.

Muitas pessoas que passaram por lá se perguntavam sobre o vulcão ativo, chamado Soufrière Hills, não poderia acordar um dia e simplesmente destruir tudo. Isso aconteceu, em 1995, quando o estúdio não existia mais e devastou uma parte considerável da ilha. Hoje, existe um lugar isolado e inacessível aos visitantes, quase uma Chernobyl no Caribe.

"Under The Volcano" é um documentário delicioso de assistir pelas ótimas histórias contadas pelos artistas e o povo local, que puderam compartilhar experiências de uma época na indústria da música que não existe mais e são símbolos inesquecíveis da criatividade de novas bandas e gêneros surgidos naquele período. Uma das coisas que vale a pena gostar de música é ouvir e se emocionar com essas histórias. 

Avaliação: muito bom

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