Crítica: Tudo Passará - A Vida de Nelson Ned, o Pequeno Gigante da Canção, de André Barcinski

A história da música brasileira é contada dia após dia, sucesso após sucesso. O passado? Raros jornalistas gostam e se empenham o suficiente para contar e mostrar às novas gerações que o mundo não começou ontem. Diria que dezenas de artistas de muito sucesso ao longo dos anos, responsáveis pela construção da identidade musical do Brasil, foram jogados na sarjeta do esquecimento quando não atendiam mais aos desejos de audiência dos programas de TV e rádio. Um desses artistas é Nelson Ned.

De enorme sucesso ao longo de quase três décadas, morreu pobre, esquecido e contando com a benfeitoria de amigos e parentes para ajudar as filhas a bancar os cuidados médicos. O cantor teve a história contada no livro "Tudo Passará - A Vida de Nelson Ned, o Pequeno Gigante da Canção", de André Barcinski, lançado pela Companhia das Letras em novembro. 

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Nascido em Ubá, no interior de Minas Gerais, foi o primeiro da família a ter nanismo, condição que seria usada para destacá-lo dentre os outros cantores, como motivação para brigas com figurões da música brasileira que gostavam de humilhá-lo pelo tamanho. Mas nada disso foi impeditivo para Nelson Ned, união dos nomes do pai e da mãe, buscar o sucesso. Era difícil ignorar aquela potente voz.

As dificuldades foram muitas no início da carreira ainda em Minas Gerais, quando foi abraçado pelo primeiro chefe, a mudança para o Rio de Janeiro até fixar residência em São Paulo, quando começou a ser empresariado por Genival Melo. O primeiro LP não deu muito resultado, mas serviu para produtores e músicos conhecerem Nelson, que, abraçado por Chacrinha e Silvio Santos, explodiu com a música "Tudo Passará". A partir disso, as músicas dele seriam sucesso no Brasil, na América Latina, Estados Unidos, Angola e Moçambique por mais de 20 anos.

Ao longo das quase 250 páginas, o mérito de Barcinski está em não esconder nada e contar as maiores loucuras feitas pelo cantor no auge da carreira. Milionário, ele gostava de aproveitar a vida e gastou boa parte do dinheiro com extravagâncias. Com o esforço para cumprir a agenda pesada de shows para bancar essa vida, começou o vício em remédios e drogas para tentar diminuir as dores causadas pelo nanismo. O abuso e o vício em sexo afetaram profundamente as relações pessoais de Nelson pelo resto da vida.

Os causos são espetaculares, como os chefões do tráfico colombiano mandando aviões para o Campo de Marte para buscá-lo para apresentações particulares e como fez amizade com um general mexicano chamado Durazo Moreno, responsável por inúmeras mortes de opositores ao longo dos anos 1970 e 1980 no México. Ou como foi o primeiro brasileiro a lotar o Carnegie Hall, famosa casa de shows nos Estados Unidos, duas vezes no mesmo dia, ou ainda como ajudou um menino venezuelano com manismo a ter melhores condições de vida.

Nelson Ned fez a alegria de vários povos com suas canções melancólicas sobre o amor, problemas pessoais, preconceitos e tudo mais que desejasse cantar. Esquecido há muito tempo, um dos maiores vendedores de discos do Brasil tem a história da vida resgatada em uma biografia deliciosa, engraçada e comovente. Tomara que ele, assim como muitos outros, tenha o devido reconhecimento por ser parte fundamental da música brasileira.

Avaliação: ótimo

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