Crítica: Só Garotos, de Patti Smith

Patti Smith é uma espécie de mãe do punk nova-iorquino. Poetisa, cantora, artista, fã de Arthur Rimbaud, poucas pessoas conseguem transmitir tanta sinceridade nas palavras quanto ela em diversos formatos sem perder a essência e naturalidade que a fizeram ser quem é. Testemunha viva dos anos dourados da efervescência criativa de Nova York, prometeu ao fotógrafo e artista plástico Robert Mapplethorpe, morto em 1989, que contaria a história deles em um livro.

Mais de 20 anos depois, ela lançou "Só Garotos", no Brasil pela Companhia das Letras, um retrato que mescla as histórias dos dois e grandes momentos da cultura nova-iorquina que mudaram para sempre a cidade e todos os envolvidos. Nascida em Chicago, passou a infância em Nova Jersey, lugar em que podia exercitar a imaginação e na leitura, quando ficou extremamente doente e passou um longo período na cama. 

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Já fã de poetas rebeldes e de rock, viu em Nova York uma mistura de paraíso e maldição para quem desejava realizar os próprios sonhos. Praticamente sem dinheiro, encontrou em bancos de praça e sofás alheios lugares para ficar. E em uma dessas coisas mágicas, conheceu Mapplethorpe, um jovem de família católica que havia abandonado tudo para virar artista.

A amizade virou amor que os aqueciam nas noites frias e davam ânimo para continuar os próprios projetos, sempre em busca de uma oportunidade. Entre roubos, loucuras, alegrias e tristezas, cada um teve espaço e os conselhos um do outro para se desenvolver e encontrar a própria voz. O auge disso foi quando, sem ter para onde ir, acabaram parando no Chelsea Hotel, casa de artistas, loucos e vagabundos em geral — às vezes, tudo isso ao mesmo tempo — durante um período marcante na vida dela.

Smith não só foi protagonista da própria história e dos momentos iniciais de Mapplethorpe, que descobriu ser gay e abriu novas portas para experimentar na fotografia (ainda uma forma de arte menor), mas também foi coadjuvante de vários momentos da história da cultura pop de Nova York. Lá, viu a formação do Velvet Underground nascer e morrer, viu Leonard Cohen indo para lá e para cá no Chelsea, viu o sofrimento e solidão de Janes Jopin e pôde chorar a morte de Jim Morrison, de quem era fã. E frequentou Max's Kansas City, lugar preferido de Andy Warhol e do pessoal da Factory no auge da criatividade do artista e antes de ser baleado em 1968.

Com o destino traçado, ambos conseguiram o sucesso nas respectivas áreas. As fotografias de Mapplethorpe, principalmente exposições da cultura gay dos anos 1960 e 1970 — escondidas aos olhos da sociedade —, chocaram e fizeram dele um dos grandes do século XX. E Smith, com a mistura de poesia e rock, tornou-se um símbolo do rock da cidade ao falar sobre diversos temas em canções que ressoam até hoje.

Delicioso do início ao fim, "Só Garotos" é uma aventura narrada por uma escritora de primeiro nível que fala de si, do melhor amigo de uma vida e de uma cena que só seria comparada nos anos 1980, com o surgimento de novas bandas e artistas de uma nova geração. Smith faz do livro um documento histórico sobre uma geração histórica.

Avaliação: excelente

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