Resenha: Summer of Soul (... ou, Quando A Revolução Não Pode Ser Televisionada), de Questlove

Em agosto de 1969, um festival histórico reuniu centenas de milhares de pessoas em vários dias seguidos de música, política, religiosidade e reflexão, marcando a vida de quem esteve lá de alguma maneira - seja no público ou no palco. Se você pensou em Woodstock, não está 100% errado, já que a história é bem semelhante. Nesse caso, o evento é o Harlem Cultural Festival.

Dirigido pelo baterista do The Roots e DJ Questlove, "Summer of Soul (... ou, Quando A Revolução Não Pode Ser Televisionada)" levou o Oscar em 2022 de Melhor Documentário com total justiça. Uma pena que a entrega da estatueta foi logo após o tapa de Will Smith em Chris Rock, jogando todo momento especial para o diretor novato e a produção por água abaixo.

Mas isso pouco importa.

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A edição do longa faz questão de explicar em detalhes como a comunidade afro-americana estava sofrendo ao longo de toda década de 1960. Apesar da vitória na luta pelos Direitos Civis, muitos líderes daquele movimento ou pessoas simpáticas às pautas foram assassinadas. E as pessoas ficaram revoltadas, gerando destruição em várias cidades dos Estados Unidos. A tensão entre políticos, polícia e essa comunidade era tensa, para falar o mínimo.

Quando Tony Lawrence chega com a ideia do Harlem Cultural Festival, muita gente não gosta e vários artistas são reticentes a aceitar o convite - o receio de confusão era grande. Dividido nos finais de semana entre o fim de junho e o final de agosto, o evento faz história com apresentações sensacionais. De coros religiosos a ativistas políticos, passando por artistas do mais alto nível, o festival é um sucesso de público.

As imagens são de chorar de tão boas. De um jovem Steve Wonder pronto para mudar o rumo da carreira, passando pelos Staples Singers, The 5th Dimension, Sly and the Family Stone, B.B. King, Nina Simone, Mahalia Jackson e outros, essa união mostrou como o povo só queria coisas melhores e viver de maneira digna - as pessoas não dando a mínima para chegada do homem à Lua é um ponto de discussão entre os presentes. Até a comunidade latina é representada com shows de Mongo Santamaria e Ray Barretto, uma união importante de pessoas que, até hoje, enfrentam situações parecidas nos Estados Unidos - a suposta "Terra da Liberdade".

Com depoimentos de alguns dos artistas presentes e vários anônimos, "Summer of Soul (... ou, Quando A Revolução Não Pode Ser Televisionada)" pode passar a imagem de ser um documentário só sobre música. Mas não é só. Também é sobre o apagamento deliberado das comunidades afro-americanas do cotidiano e da história. Como algo desse tamanho, com tanta gente boa entre as atrações e tantos discursos brilhantes, foi simplesmente esquecido? Hoje, entendemos melhor os motivos. Ainda bem que houve esse resgate, porque algo assim não merece, nem deve, ficar escondido.

Avaliação: ótimo

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