Discos para história: Bossanova, do Pixies (1990)


A edição número 125 da seção fala de Bossanova, terceiro álbum de estúdio do Pixies, que mostrava a maturidade da banda em estúdio

História do disco

As tensões entre Black Francis e Kim Deal atingiram o auge durante as gravações de Doolittle – não durante o trabalho no disco em si, mas nas apresentações feitas no período. Depois que Francis atirou a guitarra na direção de Deal, ela se recusou a fazer a apresentação seguinte e quase foi demitida do Pixies, o que aconteceria alguns anos depois.

A briga serviu para a baixista entender que nunca teria sua própria voz na banda, então uma parada nas atividades. O período serviu para Deal formar o ótimo The Breeders com Tanya Donelly, do Throwing Muses, e com produção de Steve Albini – elas lançaram o ótimo Pod, em 1991, álbum que será abordado nesta série do blog algum dia.

Os ponteiros entre a banda foram acertados e três dos quatro membros decidiram morar em Los Angeles, com Deal sendo a única a não fazer isso. Francis alegou que o novo disco seria gravado lá, e isso também motivou a mudança do produtor Gil Norton. Um problema na captação do som impedia o início do trabalho antes das 6 de tarde, depois um problema na mesa de som que não deixava a equalização da guitarra boa o suficiente.

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A gravadora não ficou sabendo de nada disso, já que Norton tentava resolver as coisas da maneira mais silenciosa possível. Quando ele e o guitarrista Joey Santiago estavam em um bar, acabaram conhecendo o produtor Rick Rubin. E parece ter sido algo dos deuses, porque Rubin rapidamente ligou para seu assistente e ajudou a encontrar um lugar apropriado para realizar as gravações de Bossanova.

Diferente dos outros discos, em que os quatro estavam juntos o tempo inteiro, a maioria das letras foi escrita por Black Francis no estúdio. Eles ensaiaram muito no trabalho anterior, enquanto só tiveram duas semanas juntos antes de entrar em estúdio para gravar o que seria o terceiro disco deles. Claro, isso muda a perspectiva e estilo de gravação, pois não há tempo hábil para fazer drásticas modificações em canções.

Lançado em 13 de agosto de 1990, Bossanova atingiu o terceiro lugar nas paradas do Reino Unido, mas apenas o 70º lugar nos Estados Unidos – mostrava a força do Pixies na Europa, e o desprezo dos americanos por eles. O disco foi bem recepcionado pela crítica, que destacou a guitarra mais melódica. Aliás, é por esse motivo que Joey Santiago o trata como melhor álbum que gravou com o grupo.

"Meu álbum favorito que gravamos é o Bossanova. É muito melódico, e eu gosto que ele seja mais cru. As partes de guitarra que eu toquei eram mais fluídas e melódicas", disse ele em entrevista ao site 'Slicing Up Eyeballs' em 2011.


Resenha de Bossanova

Santiago tem razão ao afirmar que Bossanova é um disco mais cru, principalmente no início do trabalho com a faixa instrumental "Cecilia Ann". A guitarra domina completamente o cenário, mostrando uma força do instrumento ainda não explorada em sua totalidade pela banda em seus anos de atividade. A seguinte, "Rock Music", mantém a pegada, mas tem mais cara de Pixies – o vocal gritado de Francis é identificável de longe.

Uma que ultrapassou a linha do tempo e virou um clássico foi "Velouria". De ritmo bem assobiável, o vocal de apoio de Kim Deal fazendo diferença e refrão grudento (my velouria, my velouria/even i'll adore you/my velouria), a faixa, inspirada no folclore da Califórnia, tornou-se figurinha fácil entre os fãs por conseguir representar bem o espírito deles. A curta "Allison" é um punk bem cru e saudável para cantar junto.



Outro clássico, "Is She Weird" é muito Pixies. Por quê? É difícil não associar esse estilo de música com eles, parece que só eles conseguem boas canções ao fazer isso. "Ana" funciona, mas parece mais estar ali para preencher um lugar vazio, diferente de "All Over the World", a maior do disco em duração. Com um riff de guitarra bem forte, o Pixies se explora bem nessa música em especial.

Confessadamente uma tentativa de 'soar como o Talking Heads', "Dig for Fire" até que é animada consegue fazer o ouvinte dançar em qualquer lugar, já "Down to the Well" marca o retorno da guitarra mais crua e melódica citada por Santiago. A sumida Deal aparece na introdução de "The Happening", uma das muitas letras autobiográficas escritas por Francis ao longo da carreira.



"Blown Away" é cheia de efeitos nos vocais, até dificultando um pouco o entendimento da letra, mas a melodia é ótima. Mais uma clássica, "Hang Wire" é Pixies em sua essência. Não dá para saber se "Stormy Weather" é algum tipo de indireta, mas parece que é e tem direção certa. O álbum encerra com a curta e também muito Pixies "Havalina".

Deal teve seus momentos bem diminuídos nesse disco em comparação ao anterior, mostrando que a relação com Francis não andava boa. Mesmo assim, sendo um disco mais cru e melódico, Bossanova é muito bom e serviu para mostrar outra banda: disposta a mudar quando não dá para fazer a mesma coisa de sempre.



Ficha técnica:

Tracklist:

1 - "Cecilia Ann" (2:05) (Frosty Horton e Steve Hoffman)
2 - "Rock Music" (1:52)
3 - "Velouria" (3:40)
4 - "Allison" (1:17)
5 - "Is She Weird" (3:01)
6 - "Ana" (2:09)
7 - "All Over the World" (5:27)
8 - "Dig for Fire" (3:02)
9 - "Down to the Well" (2:29)
10 - "The Happening" (4:19)
11 - "Blown Away" (2:20)
12 - "Hang Wire" (2:01)
13 - "Stormy Weather" (3:26)
14 - "Havalina" (2:33)

Todas as músicas foram escritas por Black Francis, exceto a primeira

Gravadora: 4AD/Elektra
Produção: Gil Norton
Duração: 39min45s

Black Francis: vocal e guitarra
Kim Deal: baixo e vocal
David Lovering: bateria
Joey Santiago: guitarra

Convidado:

Robert F. Brunner: teremim em "Velouria" e "Is She Weird"



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