Os quase 50 anos em atividade do The Cure transformaram a banda em uma espécie de entidade, admirada pelos críticos e reverenciada pelos novos e velhos fãs. Em troca, eles entram no palco e dão o melhor de si em apresentações que variam entre duas horas e meia a três horas de duração, disparando hits como se fossem sorvete em uma tarde quente brasileira de verão. Não precisava, mas eles entraram em estúdio para gravar um novo álbum de inéditas. “Songs of a Lost World” é o 14º trabalho de estúdio, sucessor de “4:13 Dream” e o primeiro em 16 anos.
O disco é aquele negócio: não precisava até ouvir a íntegra na apresentação da sexta-feira (1), transmitida no canal da banda no YouTube. Depois eles desfilaram os sucessos e fim de papo. Mas ainda havia material para ouvir como foi gravado e os 49 minutos de duração só mostraram como o material inédito deles fez falta desse longo hiato. O primeiro tópico abordado é a solidão, na abertura “Alone”, uma mostra de como o Cure pode ser econômico no uso dos instrumentos não significa um som baixo. Ao contrário, aqui é o primeiro passo para mostrar a grandiosidade deles.
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O inevitável assunto morte chega na melancólica e solene “And Nothing Is Forever”, com o piano e o arranjo de cordas dando o tom inicial de uma promessa de Robert Smith: que estaria com alguém no leito de morte (“I know, I know/ That my world has grown old/ And nothing is forever/ I know, I know/ That my world has grown old/ But it really doesn't matter/ If you say we'll be together/ If you promise you'll be with me in the end”), complementada por “I Can Never Say Goodbye”, uma homenagem ao irmão morto do vocalista. Emocionalmente é uma canção muito pesada do início ao fim por trazer essa carga, ainda mais acentuada pelo vocal triste e um andamento que chega como ondas ao bater devagar na cabeça e no coração.
O amor surge em “A Fragile Thing”, explicando como esse sentimento é bonito, grandioso e, ao mesmo tempo, muito frágil e cheio de nuances muito próprias de cada um — o sentimento é único, mas cada pessoa oferece de uma forma. Com “apenas” quatro minutos e dezessete segundos de duração, “Warsong” traz o lado sombrio do álbum em uma composição apoiada na guitarra e nos elementos eletrônicos de fundo para criar esse clima de pura tristeza e falta de esperança, enquanto “Drone:Nodrone” parece diretamente de algum lugar dos anos 1980, relembrando o velho Cure pós-punk misturado com eletrônico e um refrão bem esperto.
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“All I Ever Am” chega com mais um grande refrão (“I waste all my world like this/ Intending time and memories/ And all for fear of what I'll find/ If I just stop and empty out my mind/ Of all the ghosts and all the dreams/ All I hold to in belief/ That all I ever am/ Is somehow never quite all I am now”) para abrir caminho para o encerramento apoteótico de “Endsong”. Com uma longa parte instrumental, a música traz a visão de Smith sobre a piora do mundo nos últimos 50 anos, como a sociedade foi deixando de ser unida em torno de uma comunidade para virar algo egoísta e mesquinho (“It's all gone, it's all gone/ I will lose myself in time/ It won't be long/ It's all gone, it's all gone, it's all gone”).
É difícil não se encantar pelo Cure em algum momento da vida, principalmente se estiver aberto a ver como a banda explora assuntos pesados sem soar piegas ou mais do mesmo. “Songs of a Lost World” surge em um momento de descrença para a humanidade, acentuada pelos acontecimentos das últimas horas, mas sempre há um sopro de esperança e amor presentes para alentar todo mundo. Ouvi-los é um privilégio e tanto, e esse fôlego para um novo disco só mostra como eles ainda têm muito a dizer se estivermos dispostos a ouvir.
Ficha técnica
Tracklist:
1 - “Alone”2 - “And Nothing Is Forever”
3 - “A Fragile Thing”
4 - “Warsong”
5 - “Drone:Nodrone”
6 - “I Can Never Say Goodbye”
7 - “All I Ever Am”
8 - “Endsong”
Gravadora: Fiction/ Lost/ Polydor/ Universal/ Capitol
Produção: Robert Smith & Paul Corkett
Duração: 49m13
Avaliação: ótimo
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