Resenha: Spector (Star+)

Phil Spector é considerado um dos grandes gênios da história da música pop ao conseguir redefinir o gênero no início dos anos 1960 ao emplacar vários sucessos nas paradas, principalmente com grupos femininos. E foi esse mesmo homem que, no início dos anos 2000, acabou sendo preso e condenado pelo assassinato da atriz Lana Clarkson.

É a história das duas facetas do produtor musical, morto em 2021 em consequência da COVID-19, que "Spector" aborda. Logo de cara, ao começar com a chamada do motorista Adriano de Souza para polícia, a série de quatro episódios tinha toda pinta de ser algo parecido com os programas criminais e sensacionalistas do Discovery Channel, um monte de lixo que inunda a TV praticamente 24 horas por dia.

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Mas a abordagem mais sóbria de "Spector" mostra como é possível fazer um seriado sobre um crime terrível, explicar o contexto dos envolvidos e tratar a vítima como um ser humano, não apenas um pedaço de carne a ser exibida em depoimentos para lá de lamentáveis. O tom sóbrio entre vida e a obra de Spector e o terrível acontecimento é importante para compreender quem foi aquele homem.

Spector nasceu em uma considerada padrão para os anos 1930, mas a vida mudou completamente quando o pai cometeu suicídio. A partir desse momento, aos nove anos, ele foi maltratado pela mãe e pela irmã, que tinha sérios problemas psiquiátricos e passou anos frequentando as chamadas na época de "instituições mentais".

Um bom ponto da série é o uso do áudio da então última entrevista dada por ele na época, feita cinco semanas antes do assassinato, para mostrar como Spector estava sóbrio e parecia disposto a reconhecer os erros cometidos em vida. De acordo com quem conviveu com ele entre o final dos anos 1980 e poucos dias antes da tragédia, ele soava mais tranquilo.

Os quatro episódios também trazem depoimento de pessoas que trabalharam com ele antes, durante e depois do auge, seja em entrevistas novas ou em imagens de arquivo. E existe um ponto em comum: quanto mais sucesso ele fazia, mais ambicioso ficava e mais inseguro também. Passou a beber muito, a usar drogas, a andar armado e a tratar cada vez pior os cantores e cantoras com quem trabalhava - ameaçando alguns deles dando tiros para o alto. A genialidade ia virando um fiapo, mesmo quando conseguiu trabalhar com os Beatles, até restar raros momentos de quem foi um dia.

Amargurado e considerado esquecido, viu na entrevista uma chance de se reerguer. E retomar velhos hábitos. Um deles, era levar pessoas para casa e não deixá-las sair, as ameaçando com o arsenal de armas que tinha em praticamente todos os cômodos. O outro era encher a cara até cair. Um dia, isso deu errado e Lana Clarkson acabou morrendo.

A série trata Clarkson com muito respeito e a apresenta como uma pessoa cheia de sonhos e determinada a conquistar os próprios objetivos. Os amigos e a mãe, até hoje, ainda sentem muito o golpe da morte dela, um vazio nunca mais preenchido, mesmo com condenação de Spector em um longíssimo julgamento em que a vitória só veio após o promotor público recorrer da primeira sentença - na Califórnia, é necessário unanimidade do júri para condenar alguém à prisão perpétua por assassinato.

No fim, a boa série retrata a morte de duas pessoas: Clarkson, reduzida na mídia a uma atriz de filmes B assassinada na mansão de uma pessoa famosa, e Spector, um homem cheio de problemas que acabou pagando pelo comportamento irascível ao longo de muitos e muitos anos. "Spector" deveria ser um modelo de como é possível equilibrar a vida dos envolvidos e falar da tragédia sem apelação.

Avaliação: bom

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