Discos para história: Chega de Saudade, de João Gilberto (1959)


Clássico álbum brasileiro foi destrinchado na edição 140 da seção

História do disco

“João Gilberto é um dos mais musicais de nossos cantores populares, predicado que compensa amplamente o seu pequeno volume de voz”, publico o 'Estado de S. Paulo', em 1959, ano de lançamento do clássico mundial Chega de Saudade. Aqui, a bossa nova atingia seu auge, mas o gênero vinha crescendo no Brasil desde os anos 1940, quando perceberam que a mistura de jazz com samba poderia dar em algo. E deu.

Quem fazia sucesso no Brasil uma década antes da explosão da bossa nova eram os grandes cantores, como Francisco Alves, Orlando Silva, Cyro Monteiro e Gilberto Alves. Imaginar que alguém franzino, tímido e de voz quase sussurrada faria sucesso pouco mais de uma década depois beiraria a ofensa.

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Nascido em Juazeiro, na Bahia, João Gilberto já mostrava um talento nato para música ainda na infância. Disso para ganhar o primeiro violão foi um pulo. E outro para entrar na primeira banda. Quando viu, estava no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, para tentar a carreira como músico profissional. Assim como muitos naquela época, ele fez de tudo um pouco: foi músico de estúdio, compôs letras para outros compositores e gravou algumas faixas em inglês.

O encontro que mudou sua vida nasceu de uma insistência em querer um violão mostrar uma canção. O instrumento era do jovem Roberto Menescal, que ficou encantado com João Gilberto e sua técnica para reproduzir melodias. Logo, o cantor iria conhecer boa parte do grupo que formaria a bossa nova. E o ponto de virada aconteceria com o lançamento de Canção do Amor Demais, de Elizete Cardoso, de 1957. Aqui, "Chega de Saudade" foi gravada pela primeira vez, mostrando ao Brasil os primeiros passos do novo movimento.

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Em março de 1959, depois de um mês e meio trabalhando no LP, ele lançava o disco Chega de Saudade, um clássico que mudou a música brasileira e fez enorme sucesso nos Estados Unidos – os norte-americanos chegaram a falar que a faixa era totalmente baseada em Barney Kessel acompanhando Julie London em "Cry Me a River, mas havia, eles reconheceram, algo a mais do brasileiro em sua gravação.

Uma canção e um cantor mudaram a música brasileira para sempre. Outro movimento tão forte só apareceria no meio da década seguinte, com a Jovem Guarda. Até lá, a bossa nova e João Gilberto reinariam absolutos nas paradas.


Resenha de Chega de Saudade

Como não poderia deixar de ser, o clássico "Chega de Saudade" abre os trabalhos do disco. Ritmicamente impecável, principalmente por usar toques de jazz, não mostra nada de novo em questão de letra, mas acabou sendo inovadora por ser cantada por alguém de voz baixa e que usava o violão de forma completamente diferente. E foi assim que essa faixa, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, virou a mais importante do Brasil em todos os tempos.

A seguinte, "Lobo Bobo", é curta e mescla elementos do samba-canção, apesar de ter virado outra canção fundamental para entender a bossa nova - composição de Ronaldo Bôscoli, outro cara que sua história de vida mistura-se com um longo período da música brasileira. Se a primeira parte de "Brigas, Nunca Mais" já apresenta toda letra, a segunda começa com uma bonita parte instrumental - aliás, os arranjos desse álbum são ótimos.



"Hó-Bá-Lá-Lá", primeira de duas canções de João Gilberto no álbum, é outra bem próxima de um samba-canção, e isso fica mais claro quando entra os vocais de apoio masculinos, dando bastante ímpeto aos versos cantados. Nem precisa dizer que "Saudade Fez um Samba" é um... samba, claro. Simples, trata de como sentimentos são fortes na hora de fazer uma letra. E "Maria Ninguém" traz um belo elogio a várias Marias espalhadas pelo Brasil.

O lado B abre com "Desafinado", uma fina ironia sobre as críticas que João Gilberto sofria por não ser um grande cantor como os surgidos na década anterior. E, claro, uma composição de Dorival Caymmi aparece na gravação da bonita e simples "Rosa Morena", enquanto a mulher e o samba são exaltados em "Morena Boca de Ouro", de Ary Barroso.



Segunda faixa de João no LP, "Bim-Bom" é outra simples, porém a harmonia preenche muito bem o espaço das poucas palavras da letra. Mais melancólica de todas, "Aos Pés da Cruz" é uma letra sobre as pessoas se justificarem algumas escolhas. Por fim, "É Luxo Só" é mais uma letra que exalta "a mulata que dança o samba" e "é bamba".

Por não ser o disco que muita gente gosta, mas é fundamental para entender uma parte muito grande da música brasileira dos anos 1950. E João Gilberto seria exaltado no mundo inteiro por ser considerado o precursor desse movimento que mudou os rumos de muita gente na indústria musical no Brasil por algum tempo.



Ficha técnica

Tracklist:

Lado A

1 - "Chega de Saudade" (Antônio Carlos Jobim, Vinicius de Moraes) (2:01)
2 - "Lobo Bobo" (Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli) (1:20)
3 - "Brigas, Nunca Mais" (Antônio Carlos Jobim, Vinicius de Moraes) (2:05)
4 - "Hó-Bá-Lá-Lá" (João Gilberto) (2:15)
5 - "Saudade Fez um Samba" (Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli) (2:01)
6 - "Maria Ninguém" (Carlos Lyra) (2:21)

Lado B

7 - "Desafinado" (Newton Mendonça, Antônio Carlos Jobim) (1:58)
8 - "Rosa Morena" (Dorival Caymmi) (2:04)
9 - "Morena Boca de Ouro" (Ary Barroso) (1:58)
10 - "Bim-Bom" (João Gilberto) (1:16)
11 - "Aos Pés da Cruz" (Marino Pinto, Zé da Zilda) (1:34)
12 - "É Luxo Só" (Ary Barroso, Luiz Peixoto) (1:56)

Gravadora: Odeon
Produção: Aloísio de Oliveira
Duração: 22min37s

João Gilberto: violão, vocal e arranjos

Convidados:

Tom Jobim: arranjos
Copinha: flauta
Maciel: trombone
Milton Banana: bateria
Guarany: caixeta
Juquinha: triangulo
Rubens Bassini: bongô
Milton. Acyr e Edgardo: vocal de apoio



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