Resenha: Kendrick Lamar - To Pimp a Butterfly


Em um dia, To Pimp a Butterfly, novo álbum de Kendrick Lamar, foi ouvido por quase dez milhões de pessoas – certamente, já deve ter aumentado esse número ao longo das últimas horas. Preparando o público há algumas semanas, o rapper havia adiantado que a temática do disco seria o racismo e usaria os problemas atuais como pano de fundo para seu terceiro álbum de estúdio.

Outra coisa que não foi muito falada foi a estratégia para o lançamento: ao invés de disponibilizar em parceria com alguma rádio americana ou ir soltando canções ao poucos, Lamar resolvei antecipar o lançamento em uma semana, evitando o vazamento do trabalho por aí. Um ponto altamente positivo para ele e para a equipe que o acompanha.

Só de ter George Clinton logo de cara, Kendrick Lamar já merecia ganhar pontos. "Wesley's Theory" começa muito bem ao tocar no tema principal do disco logo nos primeiros minutos, e isso significa que esse disco em especial não pegará leve em nenhum momento. Segunda faixa, "For Free? (Interlude)" é um jazz com rap que serve para introduzir "King Kunta", um funk de alto nível.

Com uma melodia mais leve, "Institutionalized" conta com Bilal, Anna Wise e Snoop Dogg nas rimas para usar a borboleta do nome do disco como uma metáfora para vida, já “These Walls” trata de uma espécie de guerra racial em que os negros precisam sempre estar atrás de um muro para se proteger – além disso, ele cita a morte de alguns amigos e o ressentimento vem em um trecho sem melodia, uma parte belíssima.

Primeira canção conhecida do álbum, "u" me incomodou bastante pela falta de foco. Em determinado momento, é um rap romântico forte; em outro, vira uma espécie de jazz. Em "Alright", Lamar optou por um refrão grudento e um acompanhamento bem suave, bem diferente da letra, e em "For Sale? (Interlude)" a opção por algo mais lento acabou sendo a melhor escolha.

Pode não parecer, mas a letra de "Momma" é muito, muito boa por se tratar de uma história, provavelmente real, e o clima é mantido em "Hood Politics", uma dessas rimas que soam muito como trabalhos feitos nos anos 1990. De novo, a mudança abrupta de ritmo e de intenção em parte da melodia incomoda muito, mas a parte sem melodia alguma é espetacularmente bonita.

Bonita mesmo é "How Much a Dollar Cost", que com seu teor de vida real bate na cara de todos que acham, por algum segundo que seja, que não há preconceito contra negros na sociedade atual. Uma pena, porque deveríamos ter evoluído, não regredido ao longo dos últimos 50 anos. Com o vocal de Rapsody na parte final "Complexion (A Zulu Love)" ganha muito em complexidade em uma das faixas com o maior número de referências à cultura pop. "Mortal Man" encerra o disco com uma homenagem a Tupac Shakur, um dos melhores rappers da história, em uma canção que serve para refletir.

Os samplers e os efeitos nas vozes conseguem criar um clima épico em "The Blacker the Berry", outra canção que bate forte no momento da população negra nos Estados Unidos, e "You Ain't Gotta Lie (Momma Said)" tem um quê de Prince. Mais uma recheada com bons samplers, "i" tem potencial gigante para fazer sucesso nas rádios – mesmo que com muitas partes cortadas.

Apesar de não ter gostado muito da falta de definição do que é o álbum, To Pimp a Butterfly é um ótimo disco por contar uma história corrente, quase um seriado em que o negro é o protagonista da vida real. Não é a obra-prima que muitos estão falando, mas é um trabalho que tem tudo para ser um dos mais lembrados desta década no hip-hop.

Tracklist:

1 - "Wesley's Theory" (featuring George Clinton e Thundercat)
2 - "For Free? (Interlude)"
3 - "King Kunta"
4 - "Institutionalized" (featuring Bilal, Anna Wise e Snoop Dogg)
5 - "These Walls" (featuring Bilal, Anna Wise e Thundercat)
6 - "u"
7 - "Alright"
8 - "For Sale? (Interlude)"
9 - "Momma"
10 - "Hood Politics"
11 - "How Much a Dollar Cost" (featuring James Fauntleroy e Ronald Isley)
12 - "Complexion (A Zulu Love)" (featuring Rapsody)
13 - "The Blacker the Berry" (featuring Assassin)
14 - "You Ain't Gotta Lie (Momma Said)"
15 - "i"
16 - "Mortal Man"

Nota: 4/5


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