Crítica: Green Day - Saviors

Há quase 20 anos, o Green Day fazia parte de toda uma geração com o disco mais político da carreira. Em meio ao fracasso da chamada “Guerra ao Terror”, liderada por George W. Bush, o trio lançou “American Idiot” e tocou em temas sensíveis para os americanos e mexeu em feridas há muito não rebertas pela sociedade. Como o tempo mostrou, eles estavam certos nos protestos contra essa empreitada que ceifou a vida de muitos soldados e teve um resultado patético em uma retirada tão vergonhosa quanto a da Guerra do Vietnã.

Em 2024, o mundo mudou. A extrema-direita está forte e ocupa espaços dos quais haviam sido expulsos 80 anos antes. O trio também mudou e faz várias tentativas de conseguir um novo grande disco, sem sucesso. Agora, os três com mais de 50 anos, chegou a hora de retornar aos temas políticos com “Saviors”, 14º álbum de estúdio da carreira.

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O novo trabalho também foi lançado para celebrar os mais de 30 anos de carreira, não comemorados por conta da pandemia, e vem com o anúncio de uma enorme turnê com as apresentações na íntegra de “Dookie” e “American Idiot”. Então, começar com um potencial hit, “The American Dream Is Killing Me”, é algo perfeitamente dentro da normalidade. Como no auge, a faixa trata das crises imobiliária e política, o alto desemprego e com a extrema-direita tendo em Donald Trump um representante de força no Partido Republicano. O sonho americano, de ter uma casa, estabilidade e uma família, soa muito mais como algo do passado do que algo concreto no presente.

Ao longo do disco, fica claro a intenção de contar uma história usando uma ordem. A idiotização das pessoas tem seu próprio momento (“Look Ma, No Brains!”), assim como o desejo por garotos e garotas (“Bobby Sox”) e se vingar de algo que aconteceu há algum tempo (“One Eyed Bastard”). E os problemas de Billie Joe Armstrong com álcool nos últimos são tema da cheia de guitarras “Dilemma”, quando ele abre o jogo sobre a dificuldade em conseguir se manter sóbrio (“I was sober, now I'm drunk again/ I'm in trouble and in love again/ I don't wanna be a dead man walking/ I don't wanna be a dead man walking”). A primeira metade termina com uma bobinha e bem ligeira (“1981”) e uma balada romântica (“Goodnight Adeline”).

As competentes “Coma City” e “Corvette Summer” abrem a segunda parte para falar de como o mundo virou um lugar pior com o passar dos anos e ninguém faz nada para melhorar, enquanto a segunda traz a vida de um astro da música que não liga para dinheiro ou fama. O Green Day explora lembranças de um passado um tanto mais glorioso (“Suzie Chapstick”), usa a morte de David Bowie e o tom político para mostrar como tudo piorou desde a morte dele (“Strange Days Are Here to Stay” e “Living in the '20s”).

A balada no violão “Father to a Son”, com destaque para o arranjo de cordas, soa uma homenagem de Armstrong aos filhos e uma promessa em não decepcioná-los (“Is there anything I can do?/ Wisdom where your heart is heading to/ A place you want more than I could give/ Father to a son”). O álbum termina com um pedido para salvar o mundo (“Saviors”) e a perda de noção da realidade nos últimos anos e como isso tem causado impacto na transformação dos países nos últimos anos (“Fancy Sauce”).

Eu envelheci, você envelheceu e o Green Day não ficou atrás. Parece haver o entendimento de não precisar mais lançar canções ruins ou replicar uma juventude deixada para trás, como o feito no desastroso último disco. Com mais de 50 anos e uma base de fãs madura, o trio não precisa mais replicar o modelo dos anos 1990. Tudo que a idade exige de nós é honestidade, com o público e nós mesmos. E, finalmente, eles entenderam isso.

Tracklist:

1 - “The American Dream Is Killing Me”
2 - “Look Ma, No Brains!”
3 - “Bobby Sox”
4 - “One Eyed Bastard”
5 - “Dilemma”
6 - “1981”
7 - “Goodnight Adeline”
8 - “Coma City”
9 - “Corvette Summer”
10 - “Suzie Chapstick”
11 - “Strange Days Are Here to Stay”
12 - “Living in the '20s”
13 - “Father to a Son”
14 - “Saviors”
15 - “Fancy Sauce”

Avaliação: muito bom

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