Por Rodrigo Carvalho Follow @rroio
Março se mostrou um mês profano.
A quantidade de lançamentos relacionados ao black metal em tão pouco tempo é assombrosa, e considerando o que ainda está programado para o restante de 2015, as chances de termos a maior carga de blastbeats incessantes, melodias e tensões gélidas, e vômitos blasfemos dos últimos anos se mostra cada vez mais evidente.
Bem, coincidência ou não, é o ano da cabra, certo? Acompanhemos.
Code – Mut
Ironicamente, porém, o primeiro álbum é de uma banda que saiu de um extremo, do black metal de tendências experimentais, e chega aqui em outro, um progressivo extremamente limpo, que soa como uma amálgama entre Katatonia, Tool e Green Carnation. Uma atitude interessante, de interpretações sob outro ponto de vista das paranoias já externadas anteriormente, como se agora uma de suas personalidades estivesse sendo inibida, e a outra simplesmente entrasse em desespero ao perceber que não consegue existir sozinha.
Enslaved – In Times
O Enslaved vem explorando os mais cataclísmicos oceanos há incontáveis anos, que mesmo sem se afastar completamente de suas raízes, parece se aproximar em muito das margens cada vez mais complexas e indefinidas do universo, esbarrando em realidades até então desconhecidas. In Times é um turbilhão tenso, de ideias que convergem ao redor de si e formam a mais tempestuosa maré que os noruegueses já atravessaram. A nós, meros espectadores a bordo, resta observar como estas condições adversas apenas servem para soprar de forma ainda mais forte o Enslaved em direção à eternidade.
Dødheimsgard – A Umbra Omega
Poucos são visionários como o Dødheimsgard. Já na década de noventa os noruegueses inseriram elementos extremamente não convencionais naquela segunda geração do black metal. Uma ideia que não apenas persiste até A Umbra Omega como já não parece ter nenhum limite, seja com instrumentos de sopro ou influências tipicamente western, por exemplo. Cada segundo é milimetricamente pensado e inexplicável, como as gotas que formam uma tela desconexa, com a tinta ainda escorrendo, disforme. Basta parar por um segundo e olhar no fundo da imagem. Há beleza ali em meio ao caos, embora não saibamos explicar exatamente aonde.
Ghost Bath – Moonlover
Ok, talvez o Ghost Bath tenha mentido ao dizer que era uma banda chinesa. A questão é: o quão relevante é isso? Moonlover é um considerável passo para longe do estereótipo do blackgaze, não apenas apresentando um post-black ainda mais dinâmico, de atmosferas muito mais carregadas, mas trazendo detalhes folk e melodias inesperadas que tornam a experiência tão tenebrosa quanto ler certo velho conto chinês sobre uma mulher torturada, condenada a carregar uma lua amarrada a sua cabeça pelo resto da vida.
Leviathan – Scar Sighted
Jef Whitehead é um sujeito icônico no underground americano. Controvérsias a parte, a mente por trás do Leviathan não é apenas um personagem importante na história do black metal, mas também referência em todo o ressurgimento da cena extrema americana. Scar Sighted pode ser encarado como uma mente perturbada em reconstrução, que caminhou pelos mais enevoados e fantasmagóricos caminhos da loucura e voltou com cicatrizes ainda abertas e sangrando, que ardem ainda mais nos momentos de lucidez temporária.
Melechesh - Enki
Tão fascinante quanto as mitologias grega e nórdica, as quais estamos muito mais acostumados por conta de décadas de referências no heavy metal, as de origem mesopotâmicas e sumérias conseguem estar envoltas por uma obscuridade muito mais mística e profunda. Com base na gênese dessa cultura, o Melechesh faz de Enki não apenas uma obra musical criativa, como acaba entregando um documento extremamente metafórico sobre a situação político-religiosa do Oriente Médio.
Naïve – Altra
As opções para o prog metal são claramente amplas. E os franceses do Naïve encontraram no trip hop e na música eletrônica uma combinação natural com o post metal e o progressivo que oscila de forma tortuosa, mas ao mesmo tempo inacreditavelmente compreensível. O suficiente para transportá-lo para um momento completamente em transe, no meio de uma festa com o pulsar de uma multidão em volta, e no segundo seguinte flutuando sozinho entre as nuvens ao redor das mais altas e remotas montanhas.
Pyramids – A Northern Meadow
Pare por um instante e olhe bem a capa de A Northern Meadow. Que sensações ela transmite pra você? Nada muito agradável ou positivo, imagino. Pois poucos trabalhos até agora combinaram estes detalhes de forma tão honesta e brutal, equilibrando a arte com a música contida ali.
The Man-Eating Tree – In the Absence of Light
Uma das crias do Sentenced (ao lado do Poisonblack e do Kypck) depois do fim de suas atividades, o The Man-Eating Tree é como uma continuação natural do legado daquela que foi uma das mais importantes bandas do heavy metal finlandês. Mais atmosférica, há um claro resgate das raízes death metal sem abandonar o acessível gothic metal em In the Absence of Light – um equilíbrio que fará você se perguntar como passou tanto tempo sem ouvi-los antes.
Ufomammut – Ecate
Este trio de italianos simplesmente soltou as rédeas do mamute cósmico, a besta galáctica formada pela matéria degenerada dos préons. Com sua densidade imensurável, parece vagar pelo universo simplesmente engolindo tudo o que encontra pelo seu caminho em um vórtice lisérgico de proporções colossais, capaz de aprisionar a sua mente em um vicioso estado de hipnose com níveis e mais níveis de sintetizadores, formando o mais profundo pântano espacial de drone, doom e sludge.
Ah sim, como demorei mais de um mês para terminar essa lista, como um pedido de desculpas escrevi também notas rápidas sobre mais alguns álbuns:
Barren Earth – On Lonely Towers
Apenas o segundo álbum de um supergrupo formado por membros do Kreator, Moonsorrow, Amorphis e Clouds. O som? Imagine um Opeth neoclássico. Apenas isso.
Cancer Bats – Searching for Zero
Stoner bipolar que transtorna entre o desconcertado hardcore e o chapado blues, e com selo de exportação canadense? Sim.
Galar – De Gjenlevende
O álbum que estávamos esperando que o Borknagar tivesse lançado há anos (e não lançou).
Night – Soldiers of Time
Mercyful Fate e Helloween ficariam orgulhosos. Bem orgulhosos.
Sannhet – Revisionist
Porque blackgaze instrumental conseguiu tornar algo que já é belo e perturbador em uma viagem muito mais profunda.
The Gentle Storm – The Diary
Você simplesmente não pode deixar passar um projeto conceitual de Arjen Lucassen com Anneke van Giersbergen. Principalmente quando a obra traz duas interpretações musicais diferentes de uma mesma história.
A Forest of Stars – Beware the Sword You Cannot See
Se até agora não consegui convencê-lo a ouvir um dos álbuns de black metal de março, o A Forest of Stars é a última tentativa. A evidência final de que a música extrema ainda pode ser inacreditavelmente inventiva.
Basta clicar nos títulos dos discos para ouvi-los na íntegra.
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