Resenha: Slash feat. Myles Kennedy and The Conspirators - World on Fire


Por Rodrigo Carvalho

Certas figuras, ao longo da história da música, tornam-se tão icônicas que simplesmente transcendem qualquer barreira e são eternizadas na cultura pop, facilmente reconhecidas por qualquer pessoa. Seja um sujeito que mordeu a cabeça de um morcego no palco, quatro mascarados com um suposto pacto com o demônio, ou “aquele guitarrista da cartola e com um cigarro no canto da boca”.

Tendo feito parte de uma das maiores bandas da história do rock (ou mais famosas, se o seu gosto não lhe permite admitir tal fato) e gravado alguns dos clássicos do estilo entre o final da década de oitenta e o início dos anos noventa, antes de sua implosão cheia de polêmicas e causos mal contados, Slash tem permanecido ativo ao longo dos anos, seja com o Slash’s Snakepit, o Velvet Revolver ou, recentemente, sua carreira solo.

Acompanhado pelo Myles Kennedy and The Conspirators (o baixista Todd Kerns e o baterista Brent Fitz), o agora estabelecido quarteto retorna com World On Fire, dois anos depois do irregular Apocalyptic Love, em dezessete (!!!) novas composições produzidas por Michael Baskette e Jef Moll.

A faixa título abre o disco com um hard rock renovado, carregado daquele cheiro de carro antigo que passou por uma restauração de respeito, simples e ao mesmo tempo imponente. Um approach mais pesado e com uma visão para o cenário atual que outros artistas simplesmente insistem em continuar negligenciando. Esse formato de composição se repete ao longo do álbum, de diferentes formas, seja na grudenta “Shadow Life” (fala a verdade, não parece algo que você ouvia nas rádios lá pela metade da década passada?) ou na blueseira densa de “Beneath The Savage Sun” (Myles demonstrando em alguns minutos toda a sua versatilidade vocal).

Também não tem como negar que Slash permanece um grande compositor ao reverenciar o seu próprio passado, principalmente na união entre o hard e o heavy oitentista da frenética “Automatic Overdrive”, do épico southern “Avalon” e da referência descarada a “Paradise City” na ótima “30 Years To Life” (diabos, soa quase como uma versão remodelada do clássico do Appetite For Destruction). Destaca-se também a habilidade do guitarrista e de Myles Kennedy de escreverem músicas mais tranquilas, como a quase progressiva “Battleground”, o clima faroeste do crescendo em “The Dissident” e a bem vinda influência de Lynyrd Skynyrd em “Bent To Fly”.

Evidentemente, nem tudo funciona como o esperado: “Dirty Girl” tenta engatar a mesma fórmula “moderna” e falha vergonhosamente, em um dos momentos mais mequetrefes do disco. Possivelmente tão descartáveis como ela, podemos incluir o despejo sem sentido de riffs em “Stone Blind”, a repetição incessante e sensação de déjà vu gunsnrosiano de “Too Far Gone” e de “Wicked Stone” (esses timbres dos instrumentos estão ligeiramente forçados, heim). O refrão chatíssimo que ofusca os bons momentos de “Withered Delilah” e a balada meio chupinhada do Queen em “Iris of the Storm” são outras passagens que conseguem contribuir ainda mais para a experiência das 17 músicas serem um tanto quanto cansativas.

A grata surpresa em World On Fire está após a inexplicável “Safari Inn” (qual a necessidade de incluir uma instrumental a essa altura?), com “The Unholy”: uma mistura entre o Black Sabbath de Tony Martin e o Avenged Sevenfold atual, por mais controverso que possa soar. Densa, quase arrastada e extremamente diferente de todo o resto, é como um conto de Stephen King sendo lido em voz alta, ecoando por um prédio abandonado. Intrigante maneira de fechar o trabalho.

Se Apocalyptic Love mostrava novamente o esforço para de fato lançar um disco que trouxesse aquele hard rock que o tornou um ícone há mais de vinte anos para um panorama atual, sem se desvencilhar de suas origens, World On Fire soa como um natural passo à frente nesse caminho, de composições simples e extremamente bem produzidas. Verdade seja dita: o disco soa de fato como uma banda, com cada instrumento em seu devido lugar e, principalmente, um Myles Kennedy afiado como sempre (o seu estilo não é dos meus favoritos, particularmente, mas seria ignorância negar o talento do sujeito).

Tentando equilibrar o lado mais moderno de suas composições com aquelas que invariavelmente remetem ao Guns ‘n’ Roses (não ter uma música com esse cheiro é praticamente inevitável), o disco acerta em cheio na primeira categoria e dá umas escorregadas na segunda, talvez pela comparação que acabamos fazendo. No fim das contas, os seus 77 minutos de duração, com tantas faixas irrelevantes, acabam atrapalhando muito o desenvolvimento e o foco no álbum.

Exageros a parte, o mais importante a cada novo trabalho lançado por Slash é a constatação de que ele de fato permanece em evolução como músico. Nada mal depois de quase trinta anos, mas antes tarde do que nunca. Ao passo em que muitos desinformados insistentes continuam questionando uma absurda e estúpida reunião do Guns ‘n’ Roses original em qualquer oportunidade que encontram, a realidade é que não há mais espaço pra isso. Seria o apocalipse final para todos os envolvidos, em que nem a nostalgia sobreviveria.

Slash está tacando fogo em tudo aquilo de ruim que o prende ao passado e seguindo em frente.

E você? Está preparado pra seguir em frente também?

Tracklist:

1 - "World on Fire"
2 - "Shadow Life"
3 - "Automatic Overdrive"
4 - "Wicked Stone"
5 - "30 Years to Life"
6 - "Bent to Fly"
7 - "Stone Blind"
8 - "Too Far Gone"
9 - "Beneath the Savage Sun"
10 - "Withered Delilah"
11 - "Battleground"
12 - "Dirty Girl"
13 - "Iris of the Storm"
14 - "Avalon"
15 - "The Dissident"
16 - "Safari Inn"
17 - "The Unholy"

Nota 3,5/5



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