Por Rodrigo Carvalho Follow @rroio
Abril foi aquele mês em que mais estive fora do mundo musical. Não por acaso, quando chegou o momento de compilar essa lista, mal encontrava discos de qualidade o suficiente para metade dela.
A paranoia começou a bater e então cavar ainda mais fundo do que o normal parecia ser a última saída, e que grata surpresa: por alguma razão, vários desses álbuns sequer receberam pouco mais do que menção pela imprensa especializada mundo afora, o que por si só é uma injustiça. Basta uma rápida audição para descobrir por que.
Nota: os lançamentos de black metal continuam com tudo, mas o mês de abril foi muito, mas muito mais dinâmico do que os anteriores – e isso só torna as coisas ainda mais incríveis.
Nota 2: outro álbum que mereceria um espaço aqui e já foi resenhado pelo colega Giovanni Cabral é o Crooked Doors, do Royal Thunder. Se vocês gostaram do Yellow & Green, do Baroness (e teve alguém que não gostou?), esse disco é mais do que indicado.
Nota 3: Fora do metal, um trabalho que definitivamente não pode ser esquecido é o Salome, do Marriages. É intrigante, viajante, que flutua em algum lugar entre os planos do indie e do post-rock.
Enfim, vamos lá.
Como contemplar o nascer do sol ao sair de um lago no qual você quase acabou de se afogar, Here Comes the Sun é alívio semelhante ao primeiro inspirar de ar depois do pânico em águas geladas. Cada vez mais distante do prog groove tipicamente francês (Gojira, Hacride e afins), o Klone deixa a violência de lado em nome da serenidade do raiar de um novo dia muito mais tranqüilo, uma reflexão intimista fundada no prog metal tomado post-rock de ritmos quase ritualísticos.
Kontinuum – Kyrr
Um dos responsáveis por atrair o mundo para a pequena e isolada ilha de gelo do norte com a intrigante amálgama de black metal e alternative rock de Earth Blood Magic em 2012, os islandeses do Kontinuum continuam sua caminhada através das desoladas paisagens mortalmente congelantes, tomados por uma vertigem que cresce enquanto a sensibilidade física vai diminuindo. Uma vertigem que transporta a mente pelo doom, folk, gothic rock, post-punk ao sobrevoar todos os planos de uma terra única: rápida, sem limiares e hipnotizante.
Minsk – The Crash and the Draw
Um imperador que abandona seu território e seu povo em busca da iluminação espiritual, o Minsk permaneceu desaparecido por longos seis anos. The Crash and the Drew é como o retorno de um homem que passou por uma jornada indescritível, e agora reivindica o trono de uma terra em desgraça. A identidade é a mesma, mas o sludge post-metal progressivo parece ainda mais rico em detalhes e em sentimentos, em um nível claramente acima de muitos de seus semelhantes.
Monolord – Vænir
Basta o primeiro riff de Vænir para você perceber qual a dimensão o afundar no maior lago da Suécia irá lhe transportar: um lugar ao mesmo tempo simples e extremamente distorcido em suas beiradas, onde todas as coisas se movem na velocidade da própria translação da Terra, mas de pressão tão absurda sobre os ombros que chegam a deixar um gosto salobro na boca tamanho o esforço para se mover. O trio estabelece de uma vez por todas o seu pé no legado deixado pelos criadores deste cenário, como Electric Wizard e Sleep, nada disposto em sair do eixo. E não há nada errado com isso.
Shining - IX - Everyone, Everything, Everywhere, Ends
Niklas Kvarforth pode ser acusado de muitas coisas, e nenhuma delas é exatamente positiva. Tire o histórico de perturbação mental, as sequelas pelo abuso de drogas, as controvérsias de apologia ao suicídio e as agressões gratuitas, e você tem uma das mais criativas mentes do heavy metal. Tenha ele se livrado de alguns demônios ou não, o Shining tem trilhado o caminho da iluminação a cada novo trabalho, e IX - Everyone, Everything, Everywhere, Ends talvez seja o mais centrado, pacífico e sensato trabalho dos suecos. Porém, ainda oscila perigosamente, sofrendo os efeitos de uma abstinência que vai muito além da música.
Sigh – Graveward
Adentrar a mente doentia do Sigh é como ser convidado para um espetáculo em um circo freakshow itinerante, que viaja pelas eras através de infinitas dimensões, com o risco de ficar preso eternamente e tornar-se parte dele. Uma hora você está diante do remanescente black metal de seus primeiros álbuns, e quando menos espera é bombeardo por passagens sinfônicas e neoclássicas, um saxofone frenético, corais fantasmagóricos e vozes ensandecidas, música pop e tradicional japonesa, sintetizadores setentistas, riffs thrash, um caos formado abruptamente e sem o menor aviso ou cuidado com a sanidade do espectador. Se não é mais uma evidência de todas as possibilidades inventivas do heavy metal, difícil dizer o que é.
Thirdear – Resilience
Pode comparar o som dessa banda curitibana o quanto for com o Meshuggah. A influência está ali, com certeza, mas a névoa que a sua sonoridade expele em Resilience cria ilusões muito mais complexas e além do que se espera.
Tribulation – The Children of the Night
Uma banda sueca que resgata o heavy metal setentista para usar como base de suas histórias mirabolantes de terror, inserindo interessantes elementos que vão da música extrema ao gothic e ao pop, dando uma aura teatral para toda a sua obra. Apesar da semelhança, não, não é o Ghost, mas sim o Tribulation. The Children of the Night é o seu terceiro álbum e gerou um hype instantâneo no mês passado com o equilíbrio entre o black/death/thrash apresentado no primeiro disco e o mais progressivo/doom do segundo, com uma veia intencionalmente retrógrada e extremamente benéfica. Justifica os murmúrios que levantou? Sem a menor dúvida.
While She Sleeps – Brainwashed
Apesar de uma análise mais cuidadosa ser necessária, a verdade é que o metalcore americano apresenta muitas diferenças em relação ao seu irmão britânico. Enquanto o primeiro está reflexivo, preocupado com suas contas e as próprias questões internas e sociais de seu bairro, o segundo está naquela fase em que vive ao máximo, quer saber de tudo e tem uma visão nada boa do mundo. O While She Sleeps passou por uma fase em que realmente não estava nada indo bem, e todas as suas raivas e frustrações parece ter sido o que precisavam para dar a Brainwashed a devida importância, refletindo muito da negatividade desse período e a melancolia tipicamente inglesa e convertendo em uma voz inesperadamente impossível de não ser ouvida.
Wilderun – Sleep at the Edge of the Earth
Imagine um folk metal que em vez de recorrer às sonoridades nórdicas buscasse inspiração em suas raízes irlandesas e escocesas. É o que os americanos do Wilderun fazem em seu segundo álbum, Sleep at the Edge of the Earth, uma ode a natureza e a história como deve ser, porém com a tradicional música dos antepassados dos americanos sendo o pilar. Apesar de comparações com o Opeth serem quase inevitáveis, é importante notar que talvez a referência mais próxima seja o Suidakra, para exemplificar. Ou talvez, como o Mumford & Sons soaria se fosse uma banda de metal (muito, mas muito mais) criativa.
Ah sim, mais alguns álbuns que vocês deveriam dar uma conferida:
Anekdoten – Until All the Ghosts Are Gone
O Anekdoten ainda estava preso na Terra de tantas coisas inacabadas que deixou. Until All the Ghosts Are Gone representa muito mais um renascimento do que uma libertação.
Dance Gavin Dance – Instant Gratification
Alguém questionou alguma vez se o post-hardcore poderia ser tão esquizofrênico e excêntrico sem abandonar a veia pop ou adentrar os campos do extremo?
Dopethrone – Hochelaga
“Chameleon Witch”, “Vagabong” e “Scum Fuck Blues”. Evidências mais do que arrastadas de que o colosso permanece no mesmo movimento.
Fister – IV
Uma música. 44 minutos. Imensuráveis toneladas de riffs e opressivas atmosferas pantanescas. Zero chance de sair ileso ou limpo.
Noisem – Blossoming Decay
Depois desse disco a única coisa que sobra são os dentes no chão e o desvio incorrigível na cervical.
Lancer – Second Storm
Se Edguy e Gamma Ray não chamam a sua atenção, talvez este robô avestruz assassino chame (Alguém disse Megaman X2? Alguém?)
Luciferian Light Orchestra – Luciferian Light Orchestra
O antepassado ocultista e setentista do Therion. Você provavelmente sabe exatamente como soa.
Sulphur Aeon – Gateway to the Antisphere
Death metal tão profundo quanto o portal que liga a nossa dimensão ao dos antigos deuses abissais.
Wovoka – Saros
Estabelecendo mais uma vez como o híbrido de post-metal e sludge consegue ser reconfortante à alma e ao coração dos atormentados.
Unleashed – Dawn of the Nine
Apenas mais um item para você colocar na discografia básica de metal escandinavo, pequeno viking.