Discos para história: A Hard Day’s Night, dos Beatles (1964)


A 38ª edição do Discos para história fala de A Hard Day’s Night, terceiro disco de estúdio dos Beatles. Depois do estouro nos Estados Unidos, o Fab Four retornou aos trabalhos como a grande banda do verão. E nesse embalo viria o primeiro filme deles, que levaria o nome do novo álbum.

História do disco

A Beatlemania estava estourada nos dois lados do Atlântico. Os cabelos dos Beatles eram copiados pelos rapazes, a meninas compravam pôsteres e revistas sobre a banda, empresas de instrumentos musicais Rickenbacker e Ludiwig não davam conta do alto número de encomendas; Brian Epstein cada vez mais sendo reconhecido como bom empresário e angariando mais bandas à sua empresa; e George Martin, enfim, chegava conquistava respeito como um produtor – reza a lenda que os grupos que ele produziu em 1964 ficaram 32 das 54 semanas do ano na primeira colocação.


No dia 4 de abril de 1964, os Beatles ocupavam 12 das 200 posições no ranking semanal da Billboard, um feito e tanto. Isso gerou interesse de outros países das antigas colônias britânicas, como Austrália e Nova Zelândia, a contratá-los para turnês. Enfim, eles estavam na moda e arrecadando algumas centenas de dólares em shows e merchandising. Era um sucesso nunca visto.

Mesmo assim, era impossível estar em vários lugares. Por isso, Epstein teve a ideia de gravar vídeos promocionais dos quatro. Um deles dizia algumas palavras (“Olá, somos os Beatles e agradecemos a audiência de [lugar em questão]. Um dia estaremos aí!”) e logo depois dublavam um dos singles lançados.  Mas isso não era suficiente, então a ideia de um filme apareceu – mais uma forma de ganhar dinheiro com a exposição deles.

O roteirista Alun Owen passou uma semana com John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Star, e ele traçou um perfil de cada um para criar os personagens. O filme A Hard Day’s Night, lançado no dia 6 de julho de 1964, contava a história de um dia comum na vida do grupo: uma gravação com direito à fuga de fãs ensandecidas, mas com o acréscimo de que o avô de Paul, interpretado muito bem por Wilfrid Brambell, estava junto e se metia em altas confusões.

Nesse meio tempo, entre as gravações, shows e promoções, eles gravaram A Hard Day’s Night, o álbum. Gravado entre fevereiro e junho de 1964, foi lançado em julho do mesmo ano, chegando ao primeiro lugar das paradas muito rapidamente. O disco seria marcado por alguns fatores importantes, sendo dois deles mais destacáveis: 1) todo material era inédito, nada de covers como nos dois primeiros álbuns; 2) todas as faixas foram compostas por Lennon, McCartney ou os dois.

Em comparação com Please Please Me e With the Beatles, este trabalho era muito mais sofisticado. Claro, com mais recursos em caixa por parte da gravadora e pelo sucesso, foi natural essa melhora significativa no processo de construção das canções. E também havia uma pequena melhora na formação das letras, que seguiam românticas, e na estrutura das melodias. Estava claro que eles estavam melhorando como compositores.

Seria o último disco deles desse tipo. A partir de Beatles For Sale, veríamos mais composições pessoais, principalmente por parte de Lennon. E também veríamos os Beatles fazendo a transição entre a fase pop-rock para algo mais adulto e experimental, resultando em Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band dois anos depois.



Resenha de A Hard Day’s Night

A canção-título abre A Hard Day’s Night com um dos riffs que virou uma das marcas dos Beatles. A faixa em si mostra como eles eram uma banda que não dependia de recursos de fora ou de algum apoio instrumental para fazer a coisa fluir – todos são fundamentais para construí-la. O título saiu da cabeça de Ringo Starr, que, junto com os outros estava trabalhando havia algumas horas. Questionado pelo DJ em uma entrevista ele disse: "It's been a hard day ...night!". A letra é de John Lennon com Paul McCartney dando aquela força.

Três takes foram suficientes para fazer a versão de "I Should Have Known Better" que entrou no disco. Lennon e sua gaita comandam a seção rítmica, com George Harrison solando na parte final. Aliás, particularmente neste trabalho, a guitarra de Harrison ganharia destaque. Seria a penúltima canção em que a gaita apareceria, sendo “I’m a Loser”, de Beatles For Sale, a última. Aqui também temos um importante detalhe: era a primeira influência de Bob Dylan, até então apenas um cantor talentoso para eles, nos Beatles.



“If I Fell” é a primeira balada escrita por John Lennon. Não é apenas uma canção romântica, mas tem todos os requistos necessários para ser uma. Aqui vemos uma tentativa mais clara de rompimento da fórmula verso-refrão. Não que eles não tivessem feito isso antes, mas vemos uma música sem refrão, grande novidade no repertório deles. Em "I'm Happy Just to Dance with You" temos a única participação de Harrison nos vocais em uma faixa feita para ele ter sua vez em A Hard Day’s Night.

A história de “And I Love Her” é sensacional. McCartney chegou com a letra no estúdio e orientou seus amigos de como a queria. Logo que a gravação começou, George sentiu que precisava de algo mais, então pegou o violão e soltou o riff que está no início. E isso faz toda diferença, trazendo o ouvinte a acompanhar mais atentamente a hora do solo. Ela é uma bela balada, enquanto “Tell Me Why” fala dos argumentos que Lennon usava nas discussões com Cynthia, então sua mulher.



De Paul, "Can't Buy Me Love", diz ele, fala sobre o momento que eles viviam recebendo vários tipos de convites, indecorosos ou não, e recusavam durante a estada de algumas semanas em Paris. Dessa premissa partiu a ideia da letra. A melodia conta com outro solo de guitarra, mas não tem nada de muito diferente e é bem semelhante a outras. Na faixa seguinte, "Any Time at All", temos uma seção de cordas funcionando muito bem – ideia de McCartney.

"I'll Cry Instead" é o primeiro indício de insatisfação de Lennon com a vida que levava – ídolo e milionário, mas infeliz na vida pessoal, tema que viria a dominar algumas de suas letras no futuro. E nada como tratar de um assunto tão pessoal com ares de country. Assim como seu amigo, Macca também deu um toque pessoal na acústica "Things We Said Today", falando de seu relacionamento com a atriz Jane Asher.



O primeiro rock de raiz do disco aparece em "When I Get Home", momento que lembra muito faixas que estão em Please Please Me, seja pela estrutura ou pela forma como Paul e John dividem os vocais. A levada de "You Can't Do That" é cheia de groove e gingado, já a letra é outra que Lennon testou seu poder de escrever sobre si mesmo. Encerrando o álbum, "I'll Be Back" é difícil, levando em consideração a estrutura elaborada e a guitarra em comum, e é possível lembrar música espanhola ao ouvi-la.

A Hard Day’s Night é mais um número 1 na carreira dos Beatles. Analisando o todo, ele é superior aos dois primeiros pela variação das melodias e nas letras, e mostra que eles já haviam atingido o limite no pop-rock que eles fizeram por alguns anos. O álbum seguinte seria o ponto de virada na evolução deles como músicos.



Veja também:
Discos para história: Dookie, do Green Day (1994)
Discos para história: The Jimi Hendrix Experience - Are You Experienced (1967)
Discos para história: Revoluções Por Minuto, do RPM (1985)
Discos para história: Band on the Run, de Paul McCartney & Wings (1973)
Discos para história: The Times They Are a-Changin', de Bob Dylan (1964)
Discos para história: Led Zeppelin, do Led Zeppelin (1969)

Me siga no Twitter e no Facebook e assine o canal no YouTube. Compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!

Saiba como ajudar o blog a continuar existindo

Gostou do post? Compartilhe nas redes sociais e indique o blog aos amigos!