Discos para historia: War, do U2 (1983)

U2 - War [Deluxe Edition] Front

A quarta edição da seção Discos para história será uma homenagem ao primeiro grande sucesso do U2: o disco War, de 1983. Primeiro com viés político da banda, o terceiro álbum de estúdio elevou o patamar dos irlandeses e mudou, definitivamente, os rumos do grupo, que emendou vários álbuns de sucesso nos anos 1980.

História do disco

A carreira de estúdio do U2 começou em 1980, com Boy. Um ano depois, a banda lançou October. Com focos em assuntos adolescentes, o sucesso comercial dos dois primeiros álbuns não foi dos melhores. E, piorando um pouco mais a situação, o single “A Celebration”, lançado em 1982, também não foi bem nas paradas e fracassou.

Neste mesmo ano, a Irlanda viva seu pior momento político. O IRA (Irish Republican Army) que, ao longo de quase três décadas de luta armada, foi responsável por mais de 3.500 mortes. Tudo por dois motivos: 1) intolerância religiosa (maioria protestante contra uma minoria de católicos); 2) interesse de tornar a Irlanda do Norte uma região politicamente independente da Inglaterra.


Foi nesse tempo que Bono, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr. começaram a pensar como irlandeses, de como era duro ser um deles nesse momento difícil e de incerteza. War surgiu do envolvimento político da banda com questões que aconteciam em seu país, e esse entendimento só aconteceu pelo amadurecimento da banda, não apenas como músicos, mas como homens que precisavam compreender o momento delicado da Irlanda.

A montagem do disco começou um ano antes de seu lançamento, em maio de 1982, mas aconteceu uma breve pausa nas gravações por conta do casamento de Bono. Mesmo com a felicidade do matrimônio, o período emocional da banda não estava nada bom, principalmente por The Edge, que vivia um momento pessoal muito delicado e estava se questionando muito. Tudo isso junto, formou um dos álbuns mais brilhantes da história da música. O primeiro single do álbum, "New Year's Day", conseguiu a façanha de ser número 1 das paradas fora do Reino Unido. E isso mudou a história do U2 para sempre, que tirou Thriller, de Michael Jackson, do primeiro lugar das paradas.

O disco foi tão impactante, que a War Tour teve todos seus ingressos esgotados na Europa e nos Estados Unidos. E a figura de Bono agitando uma bandeira branca durante a execução de “Sunday Bloody Sunday” se tornou a grande imagem daquela leva de shows, e o que mudou para sempre a figura do vocalista.

War foi o primeiro disco com as fotos de Anton Corbijn, que continua como diretor de fotografia do grupo até hoje e, claro, foi responsável pela foto de Peter Rowen, o menino que estampa a capa do álbum. Ao colocar uma criança, a banda quis mostrar que a guerra não tem apenas seu lado físico, mas também é psicológico. Ao colocar um título tão impactante em seu terceiro trabalho, os irlandeses queriam mostrar os problemas do mundo e, ao mesmo tempo, mudar a imagem do início da carreira.


Resenha de War

A primeira canção o disco é um dos marcos da história do U2. “Sunday Bloody Sunday” conta parte da história do massacre em Derry, na Irlanda do Norte, 1978, quando tropas britânicas mataram dezenas de manifestantes dos Direitos Civis e pessoas que apenas passavam pela rua. O dia ficou conhecido como “Bloody Sunday” e está entre os acontecimentos mais importantes da história do país. A letra também faz referência ao outro “Bloody Sunday”, mas o acontecido em 1920, quando civis irlandeses foram mortos durante a Guerra de Independência da Irlanda.

A bateria quase militar de Larry Mullen Jr. arrepia, assim como a guitarra de The Edge, compositor do riff e de parte da letra, feita no momento em que ele duvidava da própria capacidade como músico. Ele montou boa parte da estrutura e Bono deu o famoso tapa final. A canção está entre as melhores já feitas pelo U2, certamente.

O disco continua com “Seconds”, que fala sobre um possível fim do mundo por conta de algum acidente nuclear. É uma das poucas músicas que The Edge canta, mas ele faz isso com grande maestria. Ao cantar A revolution every Day/U.S.S.R., D.D.R./London, New York, Peking/It's the puppets, It's the puppets who pull the strings, o guitarrista expõe a situação dos anos 1980 mais uma vez no álbum. Melodicamente, a música mantém a pegada militar de “Sunday Bloody Sunday”.

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A terceira canção que compõe War é outro clássico do U2. "New Year's Day" foi composta durante a lua de mel de Bono e era dedicada à sua esposa, mas mudaram de ideia e a música fez uma bonita homenagem ao Solidariedade, movimento sindical fundado em 1980, no Estaleiro Lênin, na Polônia. Os sindicalistas, liderados por Lech Walesa, exigiam uma série de reformas políticas para acabar com o regime socialista e unipartidário – o que só aconteceria mais de dez anos depois (Walesa ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1983 e foi o primeiro presidente do país pós-regime socialista).

Nesta canção, The Edge tocou teclado e tem um riff muito forte fazendo a ponte entre a primeira e a segunda metade da letra, mas a música é mesmo baseada no baixo de Adam Clayton. Outra coisa a se destacar na música é o vocal de Bono, quase gritado.

“Like a Song” é uma das raras músicas que o U2 só tocou uma vez ao vivo, e ela simboliza o preconceito que a banda vivia por não fazer parte do movimento punk, moda no final dos anos 1970 – quando a banda começava sua carreira. Too set in our ways to try to rearrange/To right to be wrong in this rebel song/Let teh bells ring out is there nothing left?/Honesty what you want? deixa isso bem claro. Depois de um início muito pesado, tanto nas letras quanto na melodia, “Like a Song” começa leve, porém logo também entra em um clima bem denso.

Encerrando o lado A do disco, "Drowning Man" é uma música mais tranquila, meio em ritmo de mantra. Prestem atenção na letra, que é muito bonita. Essa é uma das músicas que o U2 nunca tocou ao vivo em toda sua carreira. É o que podemos chamar de canção perfeita em todos os aspectos.

Se a primeira parte de War é cheia de músicas radiofônicas, o lado B é completamente diferente. São canções mais complicadas, como "The Refugee" que – como diz o nome – conta a história de uma refugiada, mas ‘ela’ representa muito mais do que apenas uma pessoa. Representa um momento muito delicado da humanidade àquela época.

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"Two Hearts Beat as One" foi o segundo single de War e chegou ao top-20 mesmo não sendo uma música comercial. A frase que dá nome a música foi retirada de uma peça do século 19 chamada de Ingomar, o Bárbaro, de Friedrich Halm. Também baseada no baixo de Clayton, a canção apresenta outra letra linda escrita pelo U2 e tem uma banda inspiradíssima em uma canção de amor inserida em um disco muito denso.

Já que o lado B do disco era cheio de experimentos, “Red Light” mostra bem isso. Algo inédito foi a inclusão do vocal feminino no início da música, o que vai de encontro com o significado de “Red Light”, nome dado a antigas zonas de prostituição pela Europa. Retornando com a pegada militar da primeira parte, temos “Surrender”. E, mais uma vez, a figura da mulher é usada para personificar o momento do mundo. A letra também trata de morte e ressurreição, mas não do aspecto cristão, e sim do renascimento após uma fase difícil – algo que todos passam cedo ou tarde. Destaque para o recurso da voz feminina mais uma vez.

Para encerrar o disco vem outra grande música do U2: “40”. Sem ter uma boa canção para terminar o álbum, e sem o baixista Clayton no estúdio, os outros três membros trabalharam rapidamente para compor e musicar uma letra que Bono havia escrito. Inspirado pelo salmo 40 da Bíblia, o vocalista escreveu “40” em dez minutos. E disso tudo saiu uma das músicas mais comoventes da banda, quase uma prece a Deus. Com o título de "40 (How Long)", o trabalho saiu como single apenas na Alemanha, em 1983.

War foi um marco para o U2. Um recomeço para quem havia fracassado nos anos anteriores. A partir desse disco, a banda irlandesa se tornou a grande banda da década de 1980.

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