Neil Young, ao lado do Bruce Springsteen, carrega o fardo de ser um dos últimos trovadores da música. E famoso que é, usou o que tem, financeiramente e seu status, na melhora dos discos – o serviço digital Pono é um deles. A moda antiga, com ajuda do seu novo fiel companheiro Jack White, ele resolveu ser interprete de canções que tocaram o coração de algumas gerações. E o dele.
Antes de o disco começar para valer, uma fala de Neil Young abre os trabalhos. Então vem a melodia delicada de "Changes", de Phil Oachs, e vemos que, além de interpretar canções que gosta, Young não se deu ao luxo de usar mais do que um violão em algumas faixas. E você pode até estranhar os ruídos, mas é exatamente assim que as pessoas ouviam músicas nos anos 1940, 1950. É tudo muito atraente, principalmente o cheiro de antiguidade.
Falam que "Girl from the North Country", de Bob Dylan, homenageia Suze Rotolo, que estampou a capa de The Freewheelin' Bob Dylan ao lado do então namorado. Aqui a gaita aparece, e Neil Young mostra o motivo de ser um dos grandes do folk rock em uma interpretação belíssima, soando como um Woody Guthrie do século 21. Não é difícil imaginar que "Needle of Death" foi uma das inspirações do cantor no início da carreira, e vê-lo cantar uma letra tão cheia a amargura em uma bela interpretação é de arrancar lágrimas nos olhos.
Cantando "Early Morning Rain", de seu conterrâneo Gordor Lightfoot, Young mostra que não esqueceu suas raízes, mesmo morando no Havaí. A gaita aparece novamente em um belo, e melancólico ao mesmo tempo, solo. A balada “Crazy” conta a história de um compositor que não conseguiu fazer sucesso, e isso remete ao início da carreira de Neil, quando disseram a ele que sua voz não era boa. Que engano, não? Mais uma vez, ele não poupa sentimentos na hora de declamar a bela letra.
"Reason to Believe" foi regravada algumas vezes, mas aqui tem apenas o piano em uma gaita acompanhando os vocais, diferente de "On the Road Again", uma das duas faixas que Jack White faz os vocais de apoio e toca piano. Duas que ganharam novas e boas roupagens. A desconhecida "If You Could Read My Mind", sucesso no Canadá nos anos 1970, também ganhou uma versão acústica.
Único standard em A Letter Home, "Since I Met You Baby" é um classico da gravadora Atlantic, a mesma que revelou Ray Charles, por exemplo. E a maneira como foi regravada dá impressão que só mudaram a voz, porque o tom de saudosismo é o mesmo da original. E se muitas das canções que estão no álbum são antigas, não é o caso de “My Hometown”, de Bruce Springsteen, que ganhou ainda mais cara de clássico na nova versão. E a regravação prova que os dois são os melhores trovadores da música mundial nesses tempos atuais em que ninguém dá a cara, tampouco se expõe para não perder privilégios. Para encerrar, um clássico dos Every Brothers, "I Wonder If I Care as Much", cantado, como no original, por um dueto – desta vez formado por Young e White.
Além de ter gravado o que quis, Neil Young simplificou todas as canções e as transformou em versões que parecem ter sido escritas por ele. É incrível como um violão, uma gaita e um piano podem ser usados de maneiras tão simples em um disco que teria boas chances de fracassar se gravado por outros artistas. Young sabe tratar a música com o respeito que ela merece, não pensando nesse pop descartável de hoje. Talvez esteja na hora de o exaltarmos como um dos últimos bastiões da música pela música.
Tracklist:
1 - "Changes" (Phil Ochs)
2 - "Girl from the North Country" (Bob Dylan)
3 - "Needle of Death" (Bert Jansch)
4 - "Early Morning Rain" (Gordon Lightfoot)
5 - "Crazy" (Willie Nelson)
6 - "Reason to Believe" (Tim Hardin)
7 - "On the Road Again" (Willie Nelson)
8 - "If You Could Read My Mind" (Gordon Lightfoot)
9 - "Since I Met You Baby" (Ivory Joe Hunter)
10 - "My Hometown" (Bruce Springsteen)
11 - "I Wonder If I Care as Much" (The Everly Brothers)
Nota: 4,5/5
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