Discos para história: Luiz Gonzaga Canta Seus Sucessos com Zé Dantas, de Luiz Gonzaga (1959)


Gonzagão gravou uma coletânea só com músicas de outro importante parceiro de composição

História do disco

É impossível não falar de forró sem citar Luiz Gonzaga (1912-1989), um dos mais importantes artistas brasileiros do século 20. Ex-cabo do exército durante uma década, acabou parando no Rio de Janeiro quando o tempo de serviço acabou. Na então capital do Brasil, ao tentar a sorte com sua sanfona, foi sumariamente desprezado pelos apresentadores das rádios, que zombavam das cantigas nordestinas e suas letras sobre a vida no sertão.

Mas o futuro “Rei do Baião” não deixou abater com as críticas e encontrou no então advogado Humberto Teixeira (1915-1979) o parceiro ideal para refinar um pouco as letras. A cultura nordestina já fazia parte da vida da população, por conta dos migrantes que vinham tentar a sorte na cidade, mas ainda não conseguia entrar nas rádios. Gonzaga e Teixeira fariam história juntos no fim dos anos 1940 com “Asa Branca”, um dos grandes clássicos da música popular brasileira.

Mais discos dos anos 1950:
Discos para história: Convite para Ouvir Maysa Nº2, de Maysa (1958)
Discos para história: Gunfighter Ballads and Trail Songs, de Marty Robbins (1959)
Discos para história: Brilliant Corners, de Thelonious Monk (1957)
Discos para história: Orfeu da Conceição, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes (1956)
Discos para história: Ritchie Valens, de Ritchie Valens (1959)
Discos para história: Caymmi e Seu Violão, de Dorival Caymmi (1959)



Foi mais ou menos nessa época, quando começava a fazer sucesso na rádio e em shows feitos para o pessoal dançar e se divertir, Gonzaga conheceu outro importante – e menos reconhecido – parceiro de composição. José de Souza Dantas Filho (1921-1962) conheceu o cantor em 1947, no Recife, Pernambuco, onde morava e estudava medicina.

Zé Dantas colabora pela primeira vez com Gonzaga em “Vem Morena”, um sucesso nas rádios em 1950 e, no mesmo ano, muda-se para o Rio de Janeiro para trabalhar no Hospital dos Servidores do Estado – ele acabaria ficando em definitivo no lugar como obstetra. No início, por medo da opinião da família por envolver-se em música popular, o compositor não queria seu nome aparecesse nos créditos das letras e deixou Gonzagão levar os créditos sozinho. Mas acabou por ceder quando viu o sucesso de Luiz Gonzaga era algo incontrolável. Quando Teixeira se “aposentou” das composições para candidatar-se a deputado federal – e ganhar –, Dantas virou o principal parceiro de Gonzaga.

Veja também:
Discos para história: Pornography, do The Cure (1982)
Discos para história: Nowhere, do Ride (1990)
Discos para história: Night Life, de Ray Price (1963)
Discos para história: Fever to Tell, do Yeah Yeah Yeahs (2003)
Discos para história: Tom Petty and the Heartbreakers, de Tom Petty and the Heartbreakers (1976)
Discos para história: The "Chirping" Crickets, dos Crickets (1957)


Os dois foram igualmente importantes para Luiz Gonzaga. Humberto Teixeira foi o responsável por criar versões urbanas para músicas de tradições nordestinas, Zé Dantas foi um retorno às raízes ao ir cada vez mais fundo na cultura nordestina, seus ritmos, vida, tristezas e alegrias do dia a dia de cultura rica e complexa. Ao longo dos anos 1950, a parceria rendeu vários sucessos, resumidos na coletânea “Luiz Gonzaga Canta seus Sucessos com Zé Dantas”, lançada em 1959.

O compositor morreria três anos depois do lançamento do disco, aos 41 anos, por complicações no fígado. Menos lembrado parceiro de Luiz Gonzaga, Zé Dantas foi igualmente importante na vida do sanfoneiro, principalmente por colocar canções diretamente ligadas ao Nordeste de volta ao repertório. Seria um dos momentos mais lembrados da carreira do “Rei do Baião”.


Resenha de “Luiz Gonzaga Canta seus Sucessos com Zé Dantas”

Zé Dantas teve uma musa em suas composições: a então namorada que virou mulher. Yolanda Dantas foi homenageada em várias composições do cantor, começando por "Sabiá". A melancólica faixa traz no xote a saudade do amor que está longe e uma homenagem a um dos pássaros mais famosos da fauna brasileira, já a próxima, "O Xote das Meninas", também foi um grande sucesso ao utilizar de uma metáfora para falar que uma menina estava deixando de ser criança e virando adolescente ao desejar um namorado. Até hoje, é tocada e cantada em várias festas pelo Brasil.

Outra bem animada é "Vem Morena", uma ode a uma moça – ou a junção de várias – que gosta bastante de dançar no forró “até o sol raiar”, já "A Volta da Asa Branca" é a continuação do clássico “Asa Branca”, só que com um ar bem mais otimista do que a irmã mais velha. Outra faixa que Dantas homenageou a namorada foi "A Letra I", em que ele escreve sobre a saudade da amada e como só é possível matá-la a partir de cartas que ninguém mais pode abrir.

Uma das coisas comuns no Nordeste eram as brigas de faca em festas, bem retratada em "O Forró de Mané Vito". Geralmente, alguém era ofendido e logo sacava a “peixeira” para cima do ofensor. Geralmente, alguém acabava furado. Sem briga, "A Dança da Moda" é a história do sucesso do baião no Rio de Janeiro, quando o forró dominava as rádios populares, então “tudo estava mudado nas noites de São João” no Sudeste.



"Riacho do Navio" conta a história de um dos afluentes mais importantes do Rio São Francisco, na zona do Pajeú, em Pernambuco, em que vemos Gonzagão contando o tipo de vida que gostaria de ter se pudesse morar nessa região do país longe das “notícias das terras civilizadas”, bem diferente do tom político de "Vozes da Seca”. Em um ano com uma grande seca no Nordeste, Dantas escreveu uma letra em que pede planos mais eficientes para combater a falta de água e condena qualquer tipo de ajuda financeira mais direta ("Seu doutô os nordestino/ Têm muita gratidão/ Pelo auxílio dos sulistas/ Nesta seca do Sertão/ Mas doutô, uma esmola/ A um home qui é são/ Ou lhe mata de vergonha/ Ou vicia o cidadão").

"Cintura Fina" volta ao lado mais galanteador da dupla, o que muda drasticamente em "Algodão" – essa um pedido particular do então Ministro da Agricultura para incentivar o plantio do chamado “Ouro Branco” no Nordeste. O LP acaba com “Paulo Afonso”, comemoração aos homens que trabalharam na construção da barragem no Rio São Francisco para gerar energia elétrica e considerada fundamental para o desenvolvimento da região.

A parceria entre Luiz Gonzaga e Zé Dantas durou até a morte do compositor e ainda rendeu canções póstumas, lançadas em 1963. Gonzagão veria o surgimento da bossa nova tirar a atenção de sua música e cairia no ostracismo no Sudeste, o que nunca aconteceu no Nordeste. Ele voltaria a fazer sucesso no Brasil inteiro quando a então nova geração da MPB falaria e o homenagearia diversas vezes nos anos 1970 e 1980, incluindo Gonzaguinha, seu filho.



Ficha técnica

Tracklist:

1 - "Sabiá" (2:26)
2 - "O Xote das Meninas" (2:51)
3 - "Vem Morena" (3:17)
4 - "A Volta da Asa Branca" (2:44)
5 - "A Letra I" (2:23)
6 - "O Forró de Mané Vito" (2:12)
7 - "A Dança da Moda" (3:04)
8 - "Riacho do Navio" (2:36)
9 - "Vozes da Seca” (2:40)
10 - "Cintura Fina" (2:31)
11 - "Algodão" (2:37)
12 - "Paulo Afonso" (2:46)

Todas as faixas foram compostas por Luiz Gonzaga e Zé Dantas

Gravadora: RCA Victor
Produção: -
Duração: 32 minutos

Luiz Gonzaga: sanfona e vocal principal



Me siga no Twitter e no Facebook e assine o canal no YouTube. Compre livros na Amazon e fortaleça o trabalho do blog!

Gostou do post? Compartilhe nas redes sociais e indique o blog aos amigos!

Continue no blog: