Reféns do sucesso

Paul-McCartney

Muitas bandas e artistas fizeram sucesso nos anos 1960, e seus membros viraram gênios graças as suas composições e riffs inesquecíveis. Mais de 50 anos depois, muitos desses músicos ainda estão gravando discos e fazendo turnês, mas há um ponto interessante nisso: a maioria não conseguiu se desvincular da antiga banda e fazer um trabalho consistente na carreira solo.

Dois dos grandes exemplos saíram do Pink Floyd. Roger Waters e David Gilmour construíram juntos dois dos maiores álbuns da música mundial: The Dark Side of the Moon e The Wall, mas não conseguiram ser bem-sucedidos em seus discos solos. Não à toa, as músicas da antiga banda são quase certas nos repertórios, e isso anima bastante o público que, em sua maioria, vai para ver essas músicas mesmo e nem faz muita questão de saber o que eles estão fazendo – vide a turnê de Waters que passou por São Paulo no último ano, chamada ‘The Wall’, que lotou o estádio do Morumbi.

Quem também não conseguiu ter uma carreira solo muito boa foi Mick Jagger. Entre o início dos anos 1980 e o início dos anos 1990, convencido por empresários de que se daria bem fora dos Stones, ele gravou três discos solos que fizeram um sucesso razoável, mas, nem de longe, igualaram o nível e qualidade de sua antiga banda. Não demorou muito para que ele, também por causa do início do boom das superturnês, retornasse sua parceira com Keith Richards e os outros. E até hoje, apesar de qualquer desavença, os Rolling Stones seguem firmes.

Já Paul McCartney é o exemplo mais claro de que é possível ganhar dinheiro usando o vasto repertório de sua antiga banda – os Beatles, no caso. Em um show com mais de duas horas, existem poucas mudanças entre as apresentações, e ele não economiza na hora de escolher os hits. Um caso semelhante ao de Macca é o de Robert Plant, porém, diferente do ex-beatle, o ex-vocalista do Led Zeppelin rearranjou antigos clássicos como “Black Dog” e “Whole Lotta Love”. Mesmo com um Grammy de Melhor Álbum de 2009 por Raising Sand, com colaboração da cantora Alisson Krauss, e com novas influências musicais, Plant não conseguiu se desvincular de seu antigo grupo e volta e meia precisa lidar com perguntas sobre um possível retorno.

Talvez só duas pessoas conseguiram se desvincular de suas antigas bandas ou músicas: Bob Dylan e John Paul Jones. O primeiro apareceu como grande líder da segunda geração do folk estabelecida em Nova York. Com o passar dos anos, ele próprio se desconstruiu, abandonou o violão e partiu para a guitarra. Depois de um período ruim entre os anos 1980 e 1990, voltou com tudo e ainda não fez um disco ruim desde 1997 – e seu repertório atual é totalmente baseado nos últimos álbuns e contém uma canção de sucesso totalmente revistada, que aparece apenas na parte final do show. Já o antigo baixista do Zeppelin construiu, ao longo dos anos, uma carreira respeitável como produtor e colaborador – o Them Crooked Vultures é um bom exemplo disso –, e ele é chamado de coadjuvante de luxo por onde passa.

Mesmo com algumas boas músicas solos, tudo é sempre motivo para comparação com o trabalho deles dos nos anos 1960, e isso é até um pouco injusto. Todos eles estavam em bandas sensacionais, com gênios trabalhando em colaboração quase o tempo inteiro.

Usar o repertório da antiga banda ou de discos antigos não é ruim, pelo contrário. É uma ótima chance para as novas gerações verem músicas incríveis ao vivo. Só uma pena que eles, na maioria, acabam abrindo mão de uma carreira solo em troca de alguns dólares a mais. Um bom exercício seria saber o que eles fariam se não pudessem mais usar esse vasto repertório. Imagine só se McCartney abrisse mão do repertório dos Beatles e saísse por aí para tocar Kisses on the Bottom, seu álbum de covers, na íntegra, ou se Waters resolvesse lançar um disco de inéditas, o que ele não faz desde 1992? Seria ótimo ver esses caras fora da zona de conforto.

Comentários

  1. Então, Fagnito, boa sacada. Mas entendo um pouco o lado dos caras e lembro de ter escrito sobre isso na época do Paul em SP: 90% do público que vai num show dele (e eu estava incluído) não quer ver coisas da carreira solo, quer ver ele cantando Beatles (até escrevi sobre isso à época). E o Paul sabe disso e, ele que sempre foi o beatle com maior faro comercial, entrega exatamente o que os fãs esperam. Creio que o caso dos show de Gilmour e Waters seja parecido: o público é extremamente conservador, no fim das contas, e acaba obrigando os músicos a isso.

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  2. Eu também entendo o lado deles, amg. Só acho que seria interessante, musicalmente falando, ver esses caras fazendo uma coisa diferente. Eles, foram dinheiro, não tem muito a perder fazendo algo fora do roteiro.

    Abraços e valeu pelo comentário!

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