Discos para história: Acabou Chorare, dos Novos Baianos (1972)

Com o blog retomado, a seção mais acessada também retorna com força total. A cada 15 dias, um disco histórico – nacional ou internacional – será destrinchado e analisado novamente. O primeiro da série foi Some Girls, dos Rolling Stones, e é um dos posts mais acessados do blog até hoje.

O segundo disco vai ser, para mim, a maior obra prima da música brasileira: Acabou Chorare, dos Novos Baianos.

História do disco

O pequeno sucesso de É Ferro na Boneca não colocou os Novos Baianos no patamar de grande banda brasileira no início dos anos 1970. Mas isso mudou em dois anos, quando aconteceu a mudança para o Rio de Janeiro e Baby Consuelo, Moraes Moreira, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor, Dadi e Luiz Galvão criaram uma comunidade vivendo em harmonia.

O que mudou a história do grupo e da música brasileira foi a contada e recontada visita de João Gilberto ao apartamento onde os Novos Baianos moravam (o documentário Filhos de João, O Admirável Mundo Novo Baiano conta isso muito bem) em Jacarepaguá. O já experiente cantor foi fundamental na aproximação dos compositores com a música nacional e na mistura dos ritmos, que pautou o disco.

Temendo algum tipo de batida policial – lembrando que o Brasil estava na ditadura militar – eles deixaram o apartamento no centro do Rio e mudaram para um sítio. E ao meio de muitas drogas, harmonia, futebol, crianças e música, surgiram o que seria o Acabou Chorare.


Influenciados pela contracultura, Tropicália, o movimento hippie, samba, os ritmos nordestinos, o rock e um pouco de bossa nova, eles criariam uma unidade e assim foi feito o melhor disco brasileiro de todos os tempos. O álbum também marcou o auge criativo de todos os músicos neste registro histórico, uma aposta de João Araújo, pai de Cazuza, dono e diretor da Som Livre.

A capa do LP é simples: é uma foto de uma mesa construída por Pepeu e representa o dia da trupe. Em 1972, ano que o disco foi lançado, ela recebeu o prêmio de melhor produção gráfica do ano. Quando foi relançado em CD, o disco ganhou uma nova capa e é uma foto de todos os membros do grupo.

O título do disco surgiu de uma conversa entre Galvão e Gilberto. Quando o cantor de bossa nova morava no México, sua filha Bebel misturava o português com o espanhol e isso gerava algumas frases engraçadas. Todas as vezes que ela se machucava e chorava, todos iam ao encontro da menina e ela dizia "acabou chorare, acabou chorare". E a frase virou uma música que está no disco.


Resenha de Acabou Chorare

A brincadeira começa com “Brasil Pandeiro”, composta por Assis Valente em 1940 para Carmem Miranda que recusou a música por acha-la fraca. Talvez seja a mais brasileira de todas as músicas, tanto na letra quanto no ritmo. A entrada da musica no disco foi sugerida por João Gilberto.

A nova roupagem que ganhou através das mentes brilhantes dos Novos Baianos só exalta a genialidade, ainda que tardia, de Valente. É a única canção do disco que não é de autoria de alguém da banda e, pelo momento que o Brasil vivia à época, foi uma bola muito bem chutada ao gol.

A segunda é um clássico que ganhou o Brasil na voz de Moraes Moreira. “Preta Pretinha” é uma letra inteiramente pessoal e fala de uma moça que o cantor conheceu em Niterói. A moça havia combinado de fugir com ele, mas voltou atrás e voltou para o antigo namorado. E o insucesso na vida pessoal virou seu grande sucesso na vida profissional. Uma balada meio samba meio moda de viola de muita qualidade.

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Em “Tinindo Trincando” aparece a doce e linda voz de Baby Consuelo, mas o grande destaque seja o solo que está na música do então jovem Pepeu Gomes. Ele deve ser o brasileiro mais influenciado por Jimi Hendrix na história e produziu grandes momentos no disco. Outra música que é impossível classificá-la. Um samba com guitarra seja mais apropriado.

A quarta faixa é "Swing de Campo Grande" e é outra música que pode entrar na categoria samba e rock. A canção seguinte é "Acabou Chorare” e é totalmente influenciada por João Gilberto, com características da bossa nova e mistura dois momentos: a história de Bebel e momentos de Luiz Galvão no Rio de Janeiro.

"Mistério do Planeta" é outra canção de Galvão com uma temática bem pessoal e representa o momento não apenas dele, mas do grupo. A guitarra de Pepeu dá o tom e deixa a música ainda melhor. O disco avança e temos o retorno de Baby em “A Menina Dança”. Escrita por Galvão especialmente para a cantora, a música é o modo de como ele via Consuelo e conta a história da entrada nela no grupo. Genial.

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O samba volta com tudo em "Besta é Tu", uma clara alusão aos ideais hippies de abandonar o velho modo de vida e entrar de cabeça nos ideais de comunidade livre. Já em "Um Bilhete Pra Didi" mostra um grupo coeso tocando uma belíssima faixa instrumental que destaca, mais uma vez, a força de Pepeu.

A entrada de uma versão mais curta, com 3:35, de “Preta Pretinha” no final do LP foi algo pensado pela gravadora que temia não ter a musica original tocada nas rádios. Mas para surpresa de todos, a música original, com mais de seis minutos, acabou sendo executada e fez um enorme sucesso.

Acabou Chorare foi um marco na música brasileira. Talvez não teríamos alguns dos grandes discos que apareceram tempos depois se não fosse a empreitada de Baby, Moraes Moreira, Pepeu, Paulinho Boca de Cantor, Dadi, Luiz Galvão e seus colegas. Um disco histórico.

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